Vamos andar de sequeite?

Patti McGee fez a capa da Life a 14 de maio de 1965. A jovem, de 20 anos, surgia a andar de skate de pernas para o ar como uma autêntica profissional. E era. Foi campeã nacional da modalidade em 1965 e por isso a revista norte-americana recorria à sua figura tipicamente californiana para dar…

Vamos andar de sequeite?

Benjamim da família, começou por andar nos ‘mini skates’ das irmãs, ainda dentro de casa. Até que aos 10 anos pediu aos pais que lhe comprassem um só para si. “Eles já tinham criado três filhos por isso não estavam minimamente preocupados que eu me partisse todo”, diz em jeito de brincadeira. No entanto, foi uma queda que o levou definitivamente do patamar de skater ao de colecionador.

Na sua casa – como num museu – explica as características do seu acervo. Em termos cronológicos, situa-o nos anos 60 e 70 do século passado, quando o skate nasceu como irmão mais novo do surf. “Os surfistas, quando não tinham ondas, iam andar de skate. Os primeiros eram simplesmente tábuas nas quais atarrachavam as rodas dos patins das irmãs. Depois andavam descalços, tal como no surf. Finalmente todos  os movimentos, todos os truques mimetizavam a própria forma como se andava nas longboards”, explica. Destas primeiras rodas metálicas, a tecnologia evolui para umas rodas de contraplacado e só mais tarde para um tipo de poliuretano. Mas o que mais encanta Miguel, para além das especificidades técnicas desta era de ouro, é como cada skate reflete a cultura americana dos anos 60 e 70. “São um espelho da cultura do surf, já que temos muita coisa associada ao mar – os tubarões, as expressões dos surfistas, nomes de marcas como ‘surf skate’ – mas também há reflexos da indústria automóvel – o Mustang e aquela lógica das riscas – como também temos reflexos da grande epopeia espacial, já para não falar de referências à música – foi nessa altura que apareceram, por exemplo, os Beach Boys. Está lá tudo”, sublinha.

Outra dimensão que Miguel também não descarta é saber exatamente a história de cada exemplar que adquire. Histórias essas que partilha no site Vintage Skateboard Collection. “Dois irmãos enviaram-me uma fotografia sua acompanhada pela história de um Nash Shark que lhes comprei. Diziam: ‘Este skate pertencia ao meu irmão, desde meados da década de 1960. Ele agora tem 63 anos e eu 57. Os meus pais tinham uma estreita calçada de cimento onde andávamos. Não tínhamos muito espaço e também com as suas rodas de metal, não tínhamos como ir muito longe. Ainda assim, divertíamo-nos imenso’”. Miguel admite que quando as pessoas percebem que o skate vai para alguém que o vai estimar acabam por partilham as suas histórias. “Esta é a dimensão que mais me interessa”, reconhece. E porque gosta não só de ouvir como de contar as suas próprias histórias está a desenvolver um projeto pessoal, de nome Sequeite. “Pus-me a pensar como seria o skate português se ele tivesse nascido cá. Se a Califórnia fosse a Linha de Cascais, como é que seria? Propus-me fazer um projeto completamente livre, sem qualquer rigor cronológico, factual ou antropológico, uma coisa para me divertir”. Dessa apropriação criou um skate conceptual feito a partir de uma tábua de lavar a roupa de madeira em que as rodas fazem referência ao sabão azul e branco nas rodas. E não é projeto único: “Vão nascer mais. Estou só a começar”.

patricia.cintra@sol.pt