Sei disto porque o feminismo continua a lutar pela igualdade de género e pela libertação da mulher.
É 2015.
Não serei o melhor exemplo de feminista porque nunca me senti oprimida nem reprimida, porque nunca senti o peso do género em nenhuma das coisas que faço, fiz e farei, e acima de tudo, porque não me educaram com espaço para isso. Muito pelo contrário. Os teus avós educaram-me como um ser humano, livre de dependências ou complexos de género, para ser, ganhar, pensar ou escrever aquilo que quisesse. Os teus avós são geniais, e espero que lá para 2045, possas dizer a mesma coisa de nós.
Escrever este texto parece muito estranho, tendo em linha de conta que sou uma jovem precária (porque em 2015 aos quarenta ainda se é jovem e porque o capitalismo global falhou, mas ainda está tudo muito ocupado a contar tostões, a fazer testes de stress e a calcular dívidas para perceber isso). A esta altura, de acordo com a convenção invisível (optei por ‘convenção’ para não dizer ‘ditadura’), devia estar a viver num quarto de um apartamento de uma qualquer cidade europeia, em busca de um sonho profissional, porque essa é hoje a tendência para o género feminino.
Para o feminismo, axantrei.
A única coisa que ainda me vai safando é que tenho cabelo curto.
O tempo da mãe fomenta que se protele tudo o que está explícito e implícito neste texto (que por agora são valores cristãos e de direita e do mais out que pode haver) até que não possa mais acontecer de forma espontânea e com alguma réstia de naïveté (o galicismo porque ainda estamos de luto).
O tempo da mãe fomenta que se protele a maternidade, que se abdique de um relacionamento duradouro ou de qualquer uma dessas coisas relacionadas com os arquétipos antigos, em prol de uma ideia paradisíaca de carreira e felicidade niilista que, vai-se a ver, também não tem trazido assim muita gente satisfeita ao conhecimento da mãe.
Por causa da carreira.
Curioso passar-se a vida a passar certidões de óbito – quais operadores de um simplex encravado – ao capitalismo global, porém continua a busca do pelouro encantado.
Consta que casar e ter filhos, para além de aniquilar a carreira, também é pactuar com o sistema de valores que oprime a mulher; vai daí, como é que uma mulher pode ser livre pactuando com o sistema? Não pode não é? – exacto.
Este texto, tal como tudo o que faço desde há precisamente um ano, é para ti. É para que saibas que podes ser o que quiseres, quando quiseres, onde quiseres. É para que saibas que nesta coisa da alteração de pensamentos e mudanças radicais do paradigma, não é o plano educativo da escola mais new age que te irá salvar a ti e à tua geração. Nesta coisa da mudança do paradigma, não há melhor que começar em casa, pelos marretas que afinal são os progressistas dos teus pais. Não há nada melhor que entender a família e os pais como os que te vão segurar nas alças das jardineiras quando quiseres fazer mais que um tem-tem pela vida fora.
Espero que sejamos tão maravilhosos contigo como foram os teus avós, que entre tantas outras coisas, me permitiram este texto hoje, mas acima de tudo, me permitiram o teu pai, o homem de quem estou ao lado. Nem atrás, nem à frente. Ao lado.