E se noutros anos o concurso terá levantado polémicas e suscitado desconfiança, os problemas parecem ter-se agravado este ano: “Houve ilegalidades, ameaças e opacidade no primeiro dia do concurso”, denuncia Nuno Leal, médico interno formado na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.
Internos de Beja fora da lista
Os problemas começaram logo na sexta-feira, quando a ACSS emitiu o mapa de vagas e as listas de candidatos e fixou a abertura das candidaturas para as 14h30 da segunda-feira seguinte. Para esse dia ficou ainda definido que os primeiros a escolher a especialidade seriam os 93 jovens médicos que tiraram uma média entre 89 e 100% no exame de acesso. “Mas o mapa de vagas não era definitivo e faltavam candidatos na lista ordenada”, explicou Nuno Leal ao SOL. No domingo, após as 23 horas, saiu um novo mapa de vagas, onde continuavam a faltar candidatos e foi divulgado um outro calendário, alterando o número de médicos que escolheriam a especialidade no primeiro dia do concurso: em vez dos 93 previstos, apenas 58 efetuariam a escolha, isto é, os médicos com uma média entre 91 e 100%.
Mas o corrupio de mudanças não pararia por aqui: na segunda-feira de manhã, ou seja, no próprio dia de início do concurso, a ACSS publicou um novo horário (atrasando o início da seleção para as 16 horas) e um novo mapa (ainda sem todos os candidatos). “Por exemplo, todos os médicos internos de Beja chegaram a ficar de fora de uma das primeiras listas publicadas, além das vagas de Medicina Geral e Familiar terem ficado por discriminar”, exemplifica Nuno.
O cenário não melhorou nas instalações da Administração Regional de Saúde (ARS) de Lisboa e do Porto quando, à hora marcada, os primeiros médicos internos tentaram inscrever-se nas vagas pretendidas: “O sistema informático não funcionava, pelo que os médicos foram obrigados a inscrever-se em papel. De seguida, a vaga em que se tinham inscrito era comunicada por telefone pelos funcionários. Ora, é uma forma arcaica de trabalhar e passível de bastantes erros”, denuncia Nuno.
No Porto, chegou mesmo a haver candidatos que recusaram inscrever-se neste cenário. “Foram coagidos por funcionários da ACSS a fazê-lo, sob ameaça de perderem a vaga”. Todos acabaram por se inscrever.
‘A ACSS foi de uma teimosia prepotente’
Segundo José Manuel Silva, bastonário da Ordem dos Médicos, não há razões para o início do concurso não ter sido adiado, visto que não estavam reunidas as condições para que decorresse sem incidentes: “A Ordem propôs o adiamento do processo para que quando começasse tudo decorresse com normalidade, porque havia alguns erros nas listas, quer de vagas quer de candidatos, ainda no fim da semana anterior. E deve haver flexibilidade intelectual para reconhecer quando as coisas não estão convenientemente preparadas”.
O bastonário acusa a ACSS de ter sido “uma teimosia prepotente manter o início da seleção para segunda-feira à tarde, até porque só depois do processo ter começado é que foram publicadas as listas definitivas de vagas e a discriminação das mesmas por unidades dos agrupamentos de saúde”.
José Manuel Silva ressalva que a altura da escolha da especialidade é “a mais determinante na vida de um médico”, e que, por isso, “as pessoas precisam de tranquilidade e tempo para refletir numa opção complexa que é para a vida”.
Em resposta ao SOL, Nuno Simões, da ACSS, assegurou que “os constrangimentos verificados no processo de escolhas para ingresso na especialização do internato médico 2016 foram solucionados” e que “o concurso está a decorrer normalmente”. O “atraso verificado ficou apenas e exclusivamente a dever-se à preocupação da ACSS em encontrar o maior número de vagas possível”, concluiu.