São beneficiários os trabalhadores, atuais e reformados, respetivos cônjuges e filhos até aos 25 anos. A empresa justificou oficialmente a regalia e o seu regresso como consequência de negociações com os sindicatos e no «cumprimento das promessas que tinham sido feitas de que o direito seria reposto quando o momento social e político permitisse». Ficamos esclarecidos: a CP não saiu da situação deficitária crónica (o Estado teve de injetar-lhe 600 milhões de euros só em 2015), nem passou a ter gestão e resultados espetaculares, os ventos políticos é que mudaram.
No Parlamento, a argumentação foi mais longe: é um benefício «muito antigo» (ou seja, é tradição, ao que parece um argumento decisivo em termos de gestão de uma empresa pública…) e «constitui um importante suplemento remuneratório de trabalhadores e suas famílias». E é capaz de constituir também um custo para a empresa, supomos nós, utentes, apesar de nunca nos ser dada qualquer informação sobre isso.
Mas alguém compreenderia que os funcionários judiciais, juízes e respetivos descendentes tivessem isenção de custas judiciais? Ou se nos hospitais os filhos e cônjuges de enfermeiros, médicos e auxiliares não pagassem taxas moderadoras? E se as propinas nas universidades fossem grátis para os familiares dos professores ou se os dos funcionários do Fisco tivessem descontos no IRS? Se a CP fosse de privados, ninguém tinha que ver com as regalias dadas aos seus trabalhadores. Ou se os preços pagos pelos utilizadores dos seus serviços não fossem tão elevados e se o Estado não tivesse todos os anos de cobrir os défices de exploração.
Nessa mesma noite de Ano Novo em que na CP se festejava a recuperação da regalia, no Metro de Lisboa algumas ligações ficaram paradas porque 50 maquinistas faltaram ao trabalho, segundo a própria empresa. E nesta quinta-feira o Conselho de Ministros aprovou a anulação dos concursos de concessão a privados da gestão das empresas Carris/Metro/Transtejo de Lisboa e Metropolitano do Porto/STCP, invocando uma mudança de estratégia política. «Queremos valorizar os utentes, os trabalhadores e as empresas», disse o ministro da tutela, José Matos Fernandes. Por este andar, ainda vai haver quem lhe proponha atribuir aos trabalhadores destas empresas um subsídio para a valorização do utente. Ou seja: para aturarem o utente, que parece cada vez menos valioso.