Quando a confusão se instalou na política espanhola após se conhecerem os resultados de 20 de dezembro, a Catalunha estava na mesma situação e parecia caminhar irreversivelmente para a repetição da votação. Com a hipótese de ver a maioria independentista desfeita pouco depois de ser formada, em Madrid os partidos podiam manter as suas distâncias sem dar gás aos nacionalistas do nordeste.
Mas, a poucas horas de chegar ao prazo que levaria os catalães de novo às urnas, Artur Mas cedeu à chantagem da CUP – também ele teve de lidar com as novas forças de protesto – e abdicou da presidência da Generalitat para garantir que os 10 deputados do partido anticapitalista votavam a favor do novo governo.
Carles Puigdemont, que era autarca de Girona desde 2011, foi o escolhido para a sucessão de Mas. Aos 53 anos, chegou à presidência da Generalitat depois de uma campanha onde prometeu “expulsar os invasores”. Na hora de tomar posse, quebrou a tradição cumprida por todos os antecessores de referir a Constituição e o rei de Espanha no seu juramento. Uma atitude que valeu ameaças de investigação judicial, com a EFE a avançar que os “serviços jurídicos do Estado” iriam estudar se a atitude de Puigdemont teria “consequências penais”. Ontem, porém, vários constitucionalistas espanhóis desvalorizavam a ameaça no “El País”, defendendo que o catalão não fez nada de ilegal, pois não há nenhuma lei que torne obrigatórias as referências falhadas por Puigdemont.
Já empossado, o ex-jornalista disse que “não são tempos para cobardes nem para os que tremem das pernas. É hora de assumir responsabilidades”. Referia-se à resolução aprovada entre a sua Convergência Democrática da Catalunha (CDC) e a CUP logo após as eleições, que prevê que a nova maioria “irá adotar todas as medidas necessárias para iniciar o processo democrático de separação do Estado espanhol”.
O novo governo da Generalitat garante que esse processo estará concluído num prazo de 18 meses, mas em Madrid Mariano Rajoy continua a lembrar que “não há maioria que possa amparar ou justificar atos ilegais e ainda menos com a pretensão de romper com a soberania nacional expressa na Constituição”.
O ainda primeiro-ministro poderá mesmo ser um dos grandes beneficiados do volte-face catalão, pois há poucas razões mais fortes para apelar a uma grande coligação de unidade nacional do que a defesa da integridade territorial do país. “Sem desculpas: um governo amplo para enfrentar o separatismo” e “a chantagem separatista da Catalunha exige um governo com PP, PSOE e Ciudadanos” eram duas das frases de um comunicado distribuído a dirigentes do PP pela direção de Rajoy, que tinha como objetivo afinar a nova narrativa do partido.