O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) não autorizou que Helder Bataglia viesse a Portugal para prestar declarações na Operação Marquês ao abrigo da convenção da Comunidade de Países de Língua Oficial Portuguesa (CPLP). A defesa pretendia que o fundador da Escom e acionista de Vale do Lobo viajasse até Lisboa com a garantia de que não seria detido e que poderia voltar a Luanda, onde reside – uma imunidade que é conferida por aquela convenção.
Ao que o SOL apurou, inicialmente o procurador da República Rosário Teixeira estava até disponível para aceitar as condições de Bataglia. Mas, caso a imunidade fosse aceite, seria válida para outros inquéritos em curso – ou seja, Bataglia poderia vir livremente a Portugal sem que pudesse ser privado da sua liberdade quer no caso que envolve o ex-primeiro-ministro quer no âmbito de outros inquéritos em curso e em que é visado, como os do Monte Branco, Escom e BES.
Chegou a ser explicado ao advogado que representa Bataglia que, caso fosse aceite, a referida convenção não o protegia de ser constituído arguido, nem de medidas de coação leves (como Termo de Identidade e Residência ou outra medida não restritiva da liberdade) – um entendimento que a defesa aceitou.
Condicionamento para outros inquéritos em curso
O problema surgiu quando o DCIAP cruzou informação e concluiu que a imunidade, ao ser concedida no âmbito da Operação Marquês, seria válida também para todos os inquéritos em curso envolvendo Bataglia – e não apenas para este caso em concreto, o que poderia prejudicar essas investigações.
O SOL sabe que numa informação do procurador Rosário Teixeira que constará no processo, refere-se que tal entendimento foi exposto superiormente e que a viagem ao abrigo da convenção da CPLP mostrou-se, por esse motivo, inadequada. O Ministério Público (MP) considera que esse condicionamento pode traduzir-se em dificuldades acrescidas na recolha da prova ou no impedimento de se aplicar medidas de coação mais gravosas nesses processos.
O procurador titular do inquérito em que se investiga José Sócrates terá, no entanto, deixado claro no processo que tem interesse numa apresentação voluntária de Bataglia para que possa ser constituído arguido e ouvido nessa qualidade.
Intermediário nas ‘luvas’ da corrupção
Tal como o SOL revelou na edição passada, Helder Bataglia assume um papel central na Operação Marquês. Os investigadores acreditam que o acionista do empreendimento de luxo Vale do Lobo – que também teve uma relação com uma prima de Sócrates – terá sido o intermediário que fez chegar 17,5 milhões de euros às contas de Carlos Santos Silva na Suíça, dinheiro que na verdade seria do ex-primeiro-ministro.
Segundo o DCIAP, desse montante, 5,5 milhões ainda passaram pelas contas de José Paulo Pinto de Sousa, primo de Sócrates, antes de chegarem às referidas contas na Suíça tituladas pelo amigo de Sócrates. Além de beneficiar o Grupo Lena, o MPsuspeita também que o ex-primeiro-ministro terá concedido benefícios a Vale do Lobo. Neste ‘capítulo’ da Operação Marquês, são já arguidos Diogo Gaspar Ferreira, diretor executivo do Vale do Lobo, e a sociedade Oceano Clube Empreendimentos Turísticos do Algarve.