Figuras que seria natural que avançassem, não o fizeram: Durão Barroso, António Guterres, Jaime Gama ou até António Vitorino preferiram ficar onde estão a ter de mudar de vida. Sem juízos de valor, com exceção de Marcelo Rebelo de Sousa, nenhum dos candidatos é uma figura de primeiro plano político.
Não deixa de ser uma constatação bizarra. Se, para os políticos mais relevantes, as presidenciais estão tão em crise como o Festival Eurovisão da Canção (uma dor de alma lembrarmo-nos dos grandes cantores que por lá passaram), para os portugueses, as presidenciais têm o mesmo impacto do jogo entre o Benfica e o Arouca este fim-de-semana – os benfiquistas não estão livres de poder perder o jogo no Estádio da Luz, mas é mais do que improvável que tal aconteça.
Com Marcelo é o mesmo. Expetativa zero e um entusiasmo semelhante ao que se tem na leitura do Diário da República.
Marcelo Rebelo de Sousa ganhará as eleições à primeira ou segunda volta. Tal significará uma expressiva mudança política: depois de Cavaco Silva ter conseguido esvaziar a função, Marcelo criará a perceção de que o cargo de primeiro magistrado é relevante.
Também para António Costa será uma boa notícia ver Marcelo no Palácio de Belém. Partindo do princípio de que o novo Presidente desempenhará o cargo como diz que o vai fazer, será um triunfo importante para o primeiro-ministro – o derradeiro passo de uma legitimação política de que poucos continuam a falar. Costa permanece confortável, cada vez mais confortável.
Acampanha eleitoral de Marcelo foi fraca. Nos debates, percebeu-se que perde a calma e a compostura quando se vê confrontado.
E o país está tão habituado a vê-lo na pele de cordeiro que a figura de lobo o torna assustador. Felizmente para Marcelo, não teve de mostrar os dentes muitas vezes. Limitou-se, na maior parte do tempo, a deixar correr os acontecimentos, não arriscou um milímetro por não ter de o fazer.
Será um bom Presidente da República se escolher ser apenas um dos seus heterónimos, o de homem de Estado.
À esquerda, a melhor campanha foi a de Marisa Matias. Coerente, afirmativa, simpática, genuinamente próxima das pessoas, com um discurso que se entende, apoiada por um Bloco de Esquerda em estado de graça e de poder. Prepara-se para ter um excelente resultado.
Sampaio da Nóvoa, amparado sem paixão pela máquina do PS, melhorou e fez uma campanha acima das minhas expetativas.
Ficará à frente de Maria de Belém e continua a perseguir a pequena hipótese de obrigar Marcelo a uma segunda volta.
Tem um problema de base: fala de um «novo tempo», mas as pessoas que caminham consigo e o aplaudem são do tempo da Carochinha e do João Ratão, não me lembro de ver um único jovem, o que torna o discurso messiânico um bocadinho patético.
Quanto a Maria de Belém, é uma candidata simpática. Tive sempre a impressão de ser afável e competente, embora não a conhecesse na retórica politica. Nunca a ouvira falar ou escrever sobre nada que não fosse setorial ou generalista. Ouvi-a agora.
Não se devia ter candidatado, quem a convenceu de que poderia ser uma boa candidata enganou-a. Acontece muito. E lamenta-se. Por ela.