Ana Magalhães, 36 anos
Quando Ana Magalhães engravidou, zika ainda não fazia parte do vocabulário, a não ser no da gíria. “Ironicamente, zika é um azar. Costuma dizer-se ‘nossa, que zika’”, conta a gestora, que vive em São Paulo desde 2011. Hoje, com a gravidez já nos quatro meses, Ana admite que o vírus já passou a tema do quotidiano, mas garante que muito do que lhe chega é por pesquisa em sites internacionais. “Fiquei a saber pelo “El País” que houve um aumento de 50% dos casos de microcefalia no Brasil, por exemplo”. Além disso, apoia-se nos relatos da família e amigos que estão em Portugal para completar o pouco espaço de antena que a doença continua a ter nos noticiários. “Aqui são dois ou três minutos, quando sei que em Portugal ocupa quase um terço do telejornal”.
Vir passar os nove meses de gestação a Portugal ainda foi ponderado, mas para Ana não fazia sentido estar longe do marido e da médica que a acompanha. Para evitar as picadas dos mosquitos, está sempre a pôr repelente – “ponho mais do que perfume” – e não viaja para zonas de risco, como o nordeste ou a Baía. “Basicamente sou uma refém em São Paulo”, lamenta.
Lúcia Guedes, 33 anos
“Sou muito medrosa”, avisa Lúcia Guedes antes de começar a relatar tudo o que mudou no seu quotidiano. Não sai à rua entre as 17h30 e as 19h30 – altura em que os mosquitos atacam mais –, não abre as janelas com a luz acesa, deixou de ter água parada nos vasos que tinha a enfeitar a casa e põe repelente em si e no seu filho pelo menos duas vezes por dia. “O Rodrigo diz sempre: ‘Oh mãe, este repelente cheira tão mal que o bicho não pica’”.
Vive com o marido naquilo que é considerado um “bairro bom”, mas sabe que basta andar uns quarteirões para chegar a zonas com muito lixo no chão e águas paradas. “O Brasil é um país lindíssimo, mas os brasileiros não o sabem aproveitar”, lamenta.
Depois de se informar sobre os perigos, os planos para engravidar num futuro próximo ficaram suspensos. “Pode ser ignorância minha, mas não quero mesmo arriscar”, conta ao SOL.
Luís Freitas Branco, 27 anos
Em pleno Rio de Janeiro, não há água parada, só Carnaval. É irónico, mas Luís não arranja outra forma de descrever a falta de destaque que o zika tem na cidade carioca. “Neste momento, vejo mais informação sobre o zika na CNN do que na televisão brasileira”, e acrescenta, “conheço até quem esteja a tentar engravidar”.
Apesar de não ser dito de forma oficial, Luís acredita que a pouca informação passada faz parte de uma estratégia para manter uma agenda positiva até aos Jogos Olímpicos. “Consta até que a Dilma está furiosa com o ministro da Saúde, por todo o alarme feito à volta do tema”, conta ao SOL. A trabalhar como jornalista no Brasil desde 2014, Luís ajuda a criar o podium de temas que abrem os telejornais: Lava Jato, impeachment e, só em terceiro lugar, o zika.