«Pode escolher o que quiser, a sério». Rodrigo garante que a impressora 3D que temos à frente pode tornar real qualquer imagem que o sistema tenha disponível na base de dados. O nosso olhar virgem perante esta tecnologia de ponta, torna difícil a escolha. «E que tal um Snoopy?». Proposta aceite. Entres cliques e dados inseridos no teclado, Rodrigo já é capaz de fazer uma previsão: 39 minutos até que o boneco nos chegue às mãos.
O aluno de 16 anos do curso profissional de técnico de multimédia do Agrupamento de Escolas de Alcanena é o grande especialista na área gráfica desta sala de aula do futuro, a sétima a ser inaugurada em Portugal e a funcionar desde quinta feira.
A aposta da criação de uma sala especial veio depois de a diretora da escola, Ana Cláudia Cohen, se ter deparado com duas realidades que tinha urgência em ver alteradas. «Como somos um grande agrupamento, temos escolas com material altamente tecnológico, mas outras ainda bastante obsoletas», explica. Além disso, e apontado como fator principal, Ana Cláudia lembra que, apesar de ocuparem lugar de topo no ranking das escolas, há um hiato face aos alunos mais novos, cujos resultados não têm sido tão satisfatórios. «É essa nova geração que temos que agarrar e isso já não se consegue com uma hora fechados numa sala a olhar para um professor», garante.
É por isso que ainda não passamos a entrada da porta e já se sente a diferença face ao que habitual. Nesta sala, o professor não tem cadeira e as dos alunos estão feitas para criarem mobilidade. «Como são redondas e com rodinhas, podem formar grupos mais rapidamente e movimentarem-se pela sala, se necessário», continua a diretora.
A escola está pensada para ser usada por todos os alunos e em todas as disciplinas. Rodrigo volta a tomar as rédeas da conversa e explica que, ainda há dias, a turma de História de Arte estava a estudar o capítulo sobre monumentos gregos e pediram-lhe ajuda para que a matéria não ficasse tão densa. «Para não ficarem só a olhar para os livros, imprimimos uma coluna jónica em 3D», conta orgulhoso.
É nesta altura que se aproxima Bernardo, com pressa de mostrar a parte da sala que domina como ninguém: a robótica. Feitos em Lego pelos alunos com necessidades especiais, há um carro comandado para fazer duas viagens à frente e atrás, um crocodilo que ‘morde’ ao toque e um – «o mais completo», explica – que é capaz de seguir um percurso específico e contornar obstáculos.
Novas formas de ensinar
Se o facto de não haver secretária para o professor já era fator diferenciador, há outra lacuna para quem está habituado ao tradicional. O antigo quadro de giz ou os mais recentes quadros magnéticos foram substituídos por «uma parede mágica», explica Ana Cláudia Cohen, onde os alunos podem escrever e apagar vezes (quase) infinitas.
Mas como para muitos, já nem este tipo de quadro conta como tecnologia, há sempre a opção de uma mesa interativa, que dispensa canetas e apagador, funcionando apenas com o toque. A equipa do Ministério da Educação, presente na inauguração da sala, foi convidada a testar o sistema: às fases da lua, em inglês, devem fazer chegar a imagem respetiva. Tiago Brandão Rodrigues e os restantes professores da escola fazem movimentos rápidos e o resultado é um retrato dessa rapidez. De oito, três saíram ao lado. «A diferença é que aqui não é dada a solução», explica a diretora, «tudo é feito por tentativa e erro». Nova ronda e, agora sim, um resultado de dar direito a nota máxima.
Mais 24 salas em Portugal
Apesar de esta sala, que vai estar disponível para mais de 1.600 alunos, ter sido construída sem apoio financeiro do Governo, Tiago Brandão Rodrigues é o primeiro a mostrar disponibilidade para apoiar projetos futuros. Sem avançar com datas, indica apenas que já outras 24 escolas apresentaram projetos de criação de uma ‘sala de aula do futuro’, como é oficialmente designada, e às quais o Governo prestará apoio através de consultoria técnica e científica, bem como na formação de docentes.
Ao cortar a fita que inaugura a sétima sala, o ministro da Educação pôs Portugal no top da União Europeia, como um dos países com mais espaços do género. Ao SOL, o Ministério aponta esta nova metodologia de ensino como uma «estratégia de combate ao abandono e de promoção do sucesso escolar».
De Bruxelas para Alcanena
A ideia inicial do projeto nasceu em Bruxelas, fonte de inspiração para o resto da Europa. Apesar do protótipo ter sido já várias vezes replicado, a verdade é que cada estabelecimento pode adaptar a sala àquilo que vê como prioridade. «No nosso caso, por exemplo», refere a diretora do agrupamento, «temos visto crescer o número de alunos com capacidades educativas especiais». Atualmente são mais 150 e, tal como todos os outros, precisavam do seu espaço numa sala que é de futuro.
Sem mais demoras, Ana Cláudia apaga as luzes, o que leva a que os olhares se virem para a única fonte luminosa da sala. No ‘espaço snoezelen’, tudo é feito para um relaxamento dos sentidos. Uma coluna de bolhas de água vai mudando de cor, ao mesmo tempo que são projetadas pequenas estrelas no teto. A música zen ajuda a criar um espaço que serve de oásis numa escola em que, à semelhança de todas as outras, são raros os momentos de silêncio. Dois professores saltam da cadeira, recostam-se nos puffs e entrelaçam-se nos fios de fibra ótica que, ao toque, dão uma sensação de relaxamento. «Isto é bom é para relaxar professores», ouve-se. A gargalhada de uma plateia cheia de quem ensina parece vir em sinal de concordância.