O próprio vice-presidente brasileiro, Michel Temer (presidente do PMDB), está hoje mais distante de Dilma Rousseff. A ausência na tomada de posse de Lula da Silva enquanto ministro da Casa Civil foi um dos sinais de que Temer está cada vez mais alinhado com os conservadores do seu partido, que há muito defendem a destituição da presidente.
Além de faltar à tomada de posse, chegou mesmo a confirmar uma visita a Portugal no dia em que o seu partido vai definir se continua ou não à frente de ministérios do atual governo. O clima de tensão e os diversos apelos levaram, porém, o vice-presidente a cancelar a viagem que o trazia ao seminário na Universidade de Lisboa que contará com a presença de vários apoiantes do impeachment (ver caixa).
Dilma tem desvalorizado qualquer possível clivagem e diz que conta com Temer na sua equipa.
E tem mesmo de contar. Numa altura em que o Congresso pede a destituição da presidente brasileira só a continuidade do apoio do PMDB a pode segurar a si e ao PT no governo.
Dilma não baixa os braços e diz que não se deprime
A mulher forte de Lula da Silva não se tem deixado abalar pelos milhões de pessoas que saíram às ruas nem com o virar de costas cada vez mais evidente do PMDB. Numa entrevista publicada esta sexta-feira pelo jornal francês Le Monde, Dilma volta a falar em golpe estado.
«Na América Latina, já vivemos alguns golpes militares. Hoje em dia temos um sistema democrático e os golpes têm outra natureza. Atualmente, um golpe é a violação da Constituição, que garante os direitos individuais, a independência institucional de poderes e do respeito pelos direitos humanos. A lei é clara: para haver impeachment, é preciso que se prove que houve um crime de responsabilidade», disse Dilma àquele jornal.
A presidente do Brasil fala mesmo do seu caso para dizer que o que foi invocado para o seu impeachment não é suficiente: «A motivação do processo é frágil: eles acusam-me de pedaladas fiscais [empréstimos de instituições públicas para financiar as despesas orçamentais]. Um processo que até o meu primeiro mandato, todos os presidentes usaram».
Assegurando que não é mulher para se deixar deprimir, Dilma frisa mesmo que uma destituição «sem base jurídica é um golpe de Estado» e «pode causar cicatrizes profundas na democracia brasileira».
Moro destacado mundialmente pelo combate à corrupção
O poder que tem faltado a Brasília nos últimos dias para se reerguer do mega escândalo de corrupção, sobra ao estado brasileiro do Paraná. Mais concretamente ao juiz federal de primeira instância da cidade de Curitiba Sérgio Moro, que esta semana foi considerado pela revista norte-americana Fortune o 13.º maior líder mundial capaz de transformar o mundo. O responsável pela investigação Lava Jato surge ao lado de nomes como o de Angela Merkel ou mesmo o do Papa Francisco. A publicação justifica a escolha, alegando que é graças a este magistrado que, no Brasil, já se pode falar em corrupção no passado.
Lava Jato apanha todos os partidos brasileiros
Só tinham passado 24h horas desde operação da Lava Jato em Lisboa – a primeira fora do Brasil – (ver texto ao lado) quando as autoridades brasileiras entraram nas instalações da Odebrecht para realizar diversas buscas e detenções.
Em causa estavam suspeitas de que a empreiteira tinha um esquema de contabilidade paralela através do qual pagava luvas a políticos. No mesmo dia em que foi desencadeada a 26.ª fase da Lava Jato (terça-feira), a construtora fez saber que «os [seus] acionistas e executivos fizeram uma avaliação e reflexão que levaram a Odebrecht a decidir por uma colaboração definitiva com as investigações da Operação Lava Jato».
Nas buscas, a Polícia Federal apreendeu uma lista de políticos que terão recebido dinheiro ilícito da construtora – que é uma das principais empreiteiras no esquema de corrupção investigado pela equipa da Lava Jato.
Nas listagem, entretanto publicadas, constam cerca de 200 políticos de todos os quadrantes, inclusivamente nomes como de Renan Calheiros (PMDB), Aécio Neves (PSDB), José Serra (PSDB) e ainda o do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB).
Tal como o jornal i noticiou na quinta feira, também a família de Cunha está a ser investigada no âmbito da Lava Jato por ter tido despesas superiores aos rendimentos declarados. Algumas das despesas foram em outros países, incluindo em Portugal.
A vitória relativa do ex-presidente Lula
Lula ainda está suspenso de ministro, mas conseguiu esta semana uma vitória. Também na terça-feira, o juiz Teori Zavascki do Supremo Tribunal Federal determinou que Sérgio Moro tem de enviar para o Supremo a parte da investigação que envolve o ex-presidente.
Esta decisão, motivada por um recurso apresentado pelo governo, não anulou, porém, a decisão do magistrado Gilmar Mendes – também do Supremo – que no dia anterior tinha confirmado a suspensão de Lula do cargo de ministro.
Uma boa notícia para Lula que, numa das escutas, foi apanhado a dizer a Dilma o que o assustava em todo este processo: «Eu, sinceramente, tô assustado com a República de Curitiba. Porque a partir de um juiz de 1ª instância, tudo pode acontecer nesse país».