Orçamento: sobe pressão para medidas adicionais

Com a execução orçamental a dar sinais de alarme nos dois primeiros meses do ano e com um défice mais elevado no ano passado devido ao efeito Banif, o governo está a enfrentar pressão adicional para tomar medidas orçamentais este ano, por imposição de Bruxelas.

Já se sabia que as negociações com a Comissão Europeia para apresentação do Programa de Estabilidade em abril iriam ser delicadas, já que Bruxelas está convicta de que serão necessárias medidas de contenção adicionais.

Mas os números revelados esta semana pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) e pela Direção Geral do Orçamento (DGO)_deverão tornar a posição negocial portuguesa ainda mais complicada.

Por um lado, o INE revelou que a operação de resolução do Banif no final do ano passado determinou um agravamento do défice das administrações públicas (AP) de 2463,2 milhões de euros em 2015.

De acordo com a estimativa provisória do instituto de estatística, a operação no Banif teve um impacto de 1,4 pontos percentuais no défice orçamental. Ou seja, se o Estado não tivesse decidido intervir no Banif, o défice teria sido de apenas 3% no final do ano passado. Com a operação, o défice subiu para 4,4%.

O impacto do Banif nas contas do Estado acabou por ser superior ao previsto em 208,2 milhões de euros. A estimativa inicial apontava para um impacto de 2255 milhões (1,2% do PIB).

Quanto à execução orçamental,  a DGO revelou que, embora as contas públicas continuem a registar um excedente até feveiro, o saldo reduziu-se de forma significativamente face a Janeiro, passando de 872 para 15 milhões de euros.

Embora a generalidade das rubricas da receita tenham um desempenho positivo  e a receita esteja a aumentar mais do que a despesa (2,9% contra 0,9%), há sinais de alarme nos impostos indirectos, que caíram 2,3% devido à aceleração dos reembolsos de IVA.

Embora o governo garanta que não estão em preparação medidas adicionais de contenção orçamental para este ano, quer o défice mais alto do que o previsto quer a execução orçamental a perder força tiram força negocial ao governo, nas negociações que se avizinham com a Comissão Europeia.

Negociações à vista

Portugal terá de apresentar até final de  abril o Programa de Estabilidade, um documento com as perspetivas financeiras atualizadas, e terá de contar com a vigilância apertada de Bruxelas.

Logo no início de fevereiro, quando a Comissão aprovou o esboço de orçamento português, o aviso foi claro: «A Comissão convida as autoridades portuguesas a tomas as medidas necessárias, no âmbito do processo orçamental nacional em curso, para assegurar que o orçamento para 2016 cumpre o Pacto de Estabilidade e Crescimento», lê-se no documento, que também questionava o impacto orçamental das medidas então anunciadas pelo governo, como a redução dos consumos intermédios.

Num Eurogrupo posterior, a discussão sobre eventuais medidas adicionais foi resolvida com uma expressão que ficou célebre: o governo português tomaria medidas «quando necessário». O governo tem rejeitado essa necessidade, mas a execução e o défice aumentam a incerteza.

Esta semana, o Conselho das Finanças Públicas (CFP) publicou um relatório em que antecipa que o Portugal consiga ter um défice abaixo de 3% este  ano, o que fará com que saia do Procedimento dos Défices Excessivos (PDE) na primavera de 2017.  Contudo, o organismo liderado pela economista Teodora Cardoso alerta que será necessário tomar mais medidas se o Governo quiser cumprir o défice previsto de 2,2%. O organismo antecipa que, com as medidas do orçamento, o défice global deste ano deverá ficar em 2,7% do PIB, um valor superior ao que está subjacente ao Orçamento do Estado aprovado.

Mais medidas até 2020

E, alerta o CFP, o aperto orçamental terá de continuar nos anos seguintes para cumprir  as regras europeias no que diz respeito ao défice estrutural. Mesmo que a saída do PDE ocorra na Primavera de 2017, O Conselho projeta que até 2020 será necessário um esforço adicional no défice. «Apesar da melhoria deste indicador, trata-se de um resultado que apresenta uma margem de segurança reduzida», indica o relatório. 

A equipa de Teodora Cardoso assinala vários riscos, mas o principal é o possível agravamento das taxas de juro se houver uma alteração da política monetária do BCE ou se a perceção de risco-país não melhorar.

«Esta perceção dependerá fortemente da estratégia orçamental que for apresentada para o médio prazo, nomeadamente no que diz respeito às reformas estruturais a adotar», frisa o organismo, que acrescenta: «A estratégia prosseguida no curto prazo, fortemente assente na reposição de rendimentos às famílias, terá que ser complementada no médio prazo por reformas que assegurem o crescimento económico duradouro e garantam a sustentabilidade das despesas públicas».

Mesmo fora do PDE a partir de 2017, o relatório frisa que o país terá de cumprir as regras europeias no que diz respeito ao défice estrutural. O país deverá caminhar para um saldo estrutural de -0,5% do PIB, o que obrigará a novas medidas de austeridade.

«Face às projeções num cenário de políticas invariantes, isso obrigará a um ajustamento adicional em todos os anos do horizonte de projeção», indica o relatório.