É que, a partir do momento em que se divulgou tal possibilidade, das duas uma: ou ela aconteceria mesmo e Passos ficaria ligado irremediavelmente a um passado que o condena ou, perversa alternativa, a direção do partido rejeitaria a homenagem depois de a anunciar.
Foi o que sucedeu. O país concluiu que o líder do PSD, tendo o pânico do rótulo (porque o considera verosímil) negou a possibilidade de tal homenagem. Tudo mau.
2. No Congresso deste fim de semana não se aguardam novidades inesperadas. Passos Coelho será confrontado com críticas e, como sempre acontece em partidos, clubes e empresas, surgirão cães de fila prontos a desfazer os que se atreverem.
José Eduardo Martins tentará a sua carta de alforria, Rui Rio mandatará alguém para dizer umas coisas e perceber o tremor da sala, não fugirá muito disto.
Perante o olhar atento de Marcelo Rebelo de Sousa, desejoso de um novo líder (mas ainda não suficientemente desejoso), o futuro laranja dependerá muito do que fizerem e não fizerem Paulo Rangel e Luís Montenegro.
Rangel assumiu com inteligência uma oposição agressiva a António Costa, é um franco-atirador sem tropas mas com vontade de criar uma vaga de fundo. E Montenegro terá de começar a fazer-se à vida se quer ter vida própria no PSD e cumprir o que vários lhe juram ser possível. Para ser líder do PSD, Montenegro terá de começar a descolar-se de Passos – ao contrário de Rangel tem exército próprio, mas precisa de provar se tem a coragem dos que sobrevivem na selva.
3.Angola não é uma democracia. Todos o sabemos, nisto não existe qualquer novidade. Como a China e a Rússia não são países democráticos.
O que está a acontecer em Luanda é preocupante, subscrevo. Porém, o último país que pode discutir o tema no Parlamento é Portugal. Não porque o assunto não seja grave, mas por Angola ter sido uma colónia portuguesa – é terrível poder existir o mero pressentimento de que, no fundo, continuamos a ver Angola como uma terra que nos pertence.
E, se quiserem que não seja tão psicanalítico, não podemos ser acusados de ter um comportamento quando Luanda era uma árvore das patacas e agora, com a queda do petróleo e do investimento, termos uma forma de os ver completamente diferente.
Quero poder criticar Angola ou qualquer outro tema que me indigne. Mas não quero que Portugal se envolva num assunto que não lhe pertence. Ou então que se envolva em todos os assuntos, a começar pela falta de liberdade na China. Mas aí vamos reinventar o PIB e prepararmo-nos para uma economia de guerra. Uma formiga preparada para travar a iniquidade do mundo. Com Cristiano Ronaldo à frente dos exércitos.
4. Bonita a homenagem dos portugueses ao povo belga. Um jogo de futebol que serviu para nos unirmos contra o terrorismo e a barbárie. A política e a diplomacia também funcionam pelo exemplo, pela perceção, por uma imagem que tantas vezes vale mais do que uma palavra.
Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa e Ferro Rodrigues fizeram o que tinham de fazer, marcaram presença no Portugal-Bélgica em Leiria. A única nota dissonante foi o lugar vazio deixado pelo cardeal patriarca D. Manuel Clemente. Justificação: tinha um compromisso inadiável. Que compromisso seria, meu Deus?
Crónica originalmente publicada na edição em papel do SOL de 02/04/2016