«Apesar de existirem dívidas de montante materialmente relevante com antiguidade superior a 180 dias, algumas das quais com antiguidade superior a 20 anos, a ADSE não tem refletido nas Demonstrações Financeiras o seu risco de incobrabilidade através do registo de provisões, não dando cumprimento ao princípio contabilístico da prudência», lê-se no relatório.
As dívidas são de câmaras municipais e das regiões autónomas. O próprio diretor-geral deste organismo informou, no âmbito do processo de acompanhamento das recomendações, que «a ADSE tem feito, desde o relatório preliminar, um conjunto de iniciativas e contactos com a ESPAP [Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública] e com a DGO [Direção-Geral do Orçamento] no sentido de se criar uma provisão para dívidas de cobrança duvidosa, superiores a 20 anos, tendo tentado que essa provisão fosse incluída nas contas de 2014, o que não foi possível».
Dívidas ascendiam a 50 milhões em 2014
E não foi possível porque a ESPAP diz «não ser possível registar na atual aplicação do GeRFiP provisão de cobranças duvidosas para entidades do Estado, nem uma eventual adoção seria de resolução rápida, pois careceria de validação da DGO, o que levou a abandonar a criação dessa provisão para a Conta de Gerência de 2014», justificou ainda o responsável da ADSE.
De acordo com o Tribunal de Contas, a dívida total da ADSE no final de 2014 era de cerca de 50 milhões de euros, o que representa, ainda assim, um decréscimo de 12 milhões face ao final de 2013.
«O ativo circulante é composto maioritariamente (mais de 90%) pelas dívidas de terceiros à ADSE, as quais respeitam aos reembolsos faturados aos organismos com autonomia administrativa e financeira (até 2010) e às entidades das Administrações Regionais e Local», revela o relatório.
A não provisão das dívidas de cobrança duvidosa é apenas um dos pontos que levaram os juízes do Tribunal a não homologar as contas da gerência de 2014, por não refletirem «de forma verdadeira e apropriada a situação económica, financeira e patrimonial» da ADSE.
Autarquias invocam prescrição das dívidas
O Tribunal de Contas realizou um questionário a 61 autarquias com dívidas de reembolso/capitação de montante igual ou superior a 90 mil euros com o objetivo de conciliar os saldos em dívida registados pela ADSE com os contabilizados por cada uma das câmaras. «Das 57 entidades que responderam apenas seis indicaram valores de dívida coincidentes», começam por referir os juízes do TdC, salientando que «27 indicaram um montante inferior ao registado pela ADSE, num total de cerca de três milhões de euros, e 23 indicaram um montante superior (cerca de 400 mil euros».
O Tribunal destaca ainda o facto de duas autarquias terem invocado a prescrição da dívida no valor global de 1,4 milhões de euros. Esta situação, segundo o TdC «exige da parte da ADSE a implementação de um processo de conciliação de dívida que acautele também a eventual oposição da entidade devedora no âmbito do processo de execução fiscal».
Regiões autónomas reclamam…
No caso das regiões autónomas, o relatório começa por lembrar que, desde 2010, a ADSE deixou de ter dotação orçamental para os encargos com os serviços prestados pelas instituições do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e dos serviços regionais de saúde das regiões autónomas. Questionados os serviços regionais sobre os valores registados nas suas contas como estando em dívida por parte da ADSE, estes reportaram 78,6 milhões de euros no final de maio de 2014, mais 4,4 milhões do que em 31 de dezembro de 2013.
A regularização destas dívidas «é responsabilidade da República e/ou dos governos regionais», lê-se no relatório do Tribunal, que considera que o diretor geral da ADSE «agiu corretamente não reconhecendo aquela dívida, dada a inexistência de dotação orçamental para a ADSE assumir tal responsabilidade».
…e retêm descontos no valor de 24,8 milhões
Em face desta situação, as entidades empregadoras das administrações regionais da Madeira (na sua maioria) e dos Açores (a totalidade) decidiram não entregar os descontos dos quotizados/trabalhadores à ADSE. No âmbito da resposta aos questionários da auditoria, as entidades regionais argumentaram que «os descontos retidos são receita das regiões», na medida em que «são estas que suportam os encargos com a prestação de cuidados de saúde aos quotizados da ADSE».
O valor dos descontos retidos e entregues à Secretaria Regional do Plano e Finanças da Madeira ascende a pelo menos 8,5 milhões de euros entre 2011 e 2013. A este valor acrescem ainda 2,2 milhões relativos às entidades que ainda não têm os descontos completamente regularizados perante a ADSE. No caso dos Açores, o valor dos descontos retidos ascende a 14,1 milhões no período em análise.
Os juízes do Tribunal concluíram por isso que «continua a não existir reflexo contabilístico das quotizações em dívida, embora sejam feitas estimativas do seu valor».
«O montante dos descontos não entregues à ADSE, incluindo o montante não entregue por entidades empregadoras que também não remetem os ficheiros com o detalhe dos descontos, passou a ser estimado com base num montante de desconto médio calculado com base no número de quotizados e no valor pagos entidades empregadoras nesse mês», lê-se ainda no relatório.