O processo de recapitalização da Caixa Geral de Depósitos (CGD) está ainda no início, mas há uma certeza no horizonte. Para que Bruxelas aprove a injeção de dinheiros públicos no banco, terá de haver um plano de reestruturação com medidas de contenção que a nova administração terá de concretizar. O fecho adicional de balcões em Portugal e a redução da exposição a mercados não estratégicos no estrangeiro são quase certos.
O ministro das Finanças admitiu esta semana que terá de haver um novo um plano de reestruturação para a CGD, que analisará o «posicionamento no mercado nacional e internacional» e analisará a «dimensão internacional da CGD». Segundo explicou Mário Centeno numa deslocação a Nova Iorque, a injeção de capital na CGD implica cumprir determinadas condições para que Bruxelas aprove a operação. «Uma delas é focar o banco estatal no mercado nacional», explicou, acrescentando que isso passa pela definição de um novo “plano industrial” para colocar a CGD «ao serviço da economia portuguesa, das pequenas e médias empresas [tendo] de trabalhar essencialmente para a economia doméstica em Portugal».
A Comissão Europeia deverá olhar com particular atenção para Espanha – o mercado onde a Caixa tem mais balcões na Europa, depois de Portugal, e que já foi alvo de uma recomendação de desinvestimento no passado.
O Brasil, onde o banco está a acumular prejuízos num mercado em recessão, é outro ativo delicado da Caixa.
Em Espanha, a conturbada aquisição do banco Siméon, ainda nos anos 90, marcou a atividade da CGD durante anos. Foi um passo de gigante para crescer no mercado ibérico, mas o grupo penou longamente com um negócio deficitário.
Reestruturação em Espanha
Há dez anos o banco a designação mudou para Banco Caixa Geral, mas as perdas em Espanha teimaram em continuar, num mercado que viveu uma intensa bolha imobiliária. E, quando o Estado injetou dinheiro na Caixa em 2012, a Comissão Europeia olhou com particular atenção para esse mercado.
Para aprovar a ajuda pública, Bruxelas impôs, entre outras, uma condição específica: «Reestruturação da atividade e otimização da dimensão da rede da CGD em Espanha». Desde então, a gestão de José de Matos promoveu a reestruturação desse negócio,. Onde chegou a haver mais de 200 balcões passou a haver poucos mais de 100, e o pessoal ao serviço do banco também foi reduzido. O presidente cessante da CGD chegou a afirmar no início deste ano que «a situação em Espanha está resolvida» mas, com o novo plano de capitalização do Estado, Bruxelas vai averiguar o grau de solidez desse negócio e se é necessário fazer ajustamentos adicionais.
A lupa de Bruxelas irá focar-se também noutros mercados. O banco público terá de emagrecer e repensar as áreas de prejuízos crónicos. A nova administração vai definir um novo plano de negócios e avaliar as necessidades de pessoal, o que poderá levar à dispensa de pessoal.
A rede da CGD foi construída não apenas em função do interesse comercial das operações, mas também devido ao papel político e diplomático que o braço financeiro do Estado português. Presente em mais de 20 mercados, a Caixa tem balcões ou representações em todos os países da lusofonia e nos principais destinos de emigração nacional, como França, Suíça ou Venezuela.
Segundo o relatório de 2015, a área internacional da Caixa teve um contributo positivo para os resultados do grupo, mas há operações específicas que estão a dar dores de cabeça à equipa de gestão. Um dos casos mais bicudos neste momento é o do Brasil, um país a braços com elevada incerteza política e uma recessão económica profunda. No ano passado, o banco da CGD neste mercado teve um prejuízo de 31 milhões de reais – cerca de oito milhões de euros, a que se somam perdas desde 2013.
Bruxelas analisa
Para já, não há ainda planos de reestruturação finalizados. Foi entregue um documento à Comissão com os planos para o banco, mas terá ainda de ser designada a nova administração – cujos nomes têm de ser aprovados pelos reguladores. De resto, a Comissão Europeia clarificou esta semana que ainda não tomou qualquer decisão sobre o plano geral de recapitalização da CGD Depósito, apresentado na última sexta-feira pelo Governo. «Só muito recentemente recebemos informação das autoridades portuguesas sobre este assunto, e estamos a analisar. As notícias sobre quaisquer decisões da Comissão sobre este assunto não são corretas», afirmou o porta-voz da Direção Geral da Concorrência europeia, Ricardo Cardoso.
Para haver luz verde de Bruxelas e não considerar a recapitalização uma ajuda pública, a CGD tem de fazer mudanças. A primeira é na organização. A administração tem de funcionar como num banco privado e isso implica receber mais dinheiro e ter mais administradores. Haverá 19 administradores, um número próximo do BPI (23) e do BCP(20). E, com a mudança de estatutos do gestor público aprovada esta semana, acabam os limites aos vencimentos dos gestores.
Segundo Mário Centeno, a medida visa alinhar o funcionamento do banco público com as práticas do setor bancário, um dos passos necessários para que a Comissão aceite a recapitalização – a medida vai ao encontro de uma recomendação do BCE, para que os bancos sejam competitivos na captação de gestores. «O Estado terá de agir como um acionista privado. A CGD atua em a concorrência e todas as atuações têm de ser equivalentes às que que outro agente adotaria», explicou o ministro das Finanças.
O ministro garantiu que os salários da CGD «estarão alinhados aos salários do setor» e que os trabalhadores também serão beneficiados com esta orientação, uma vez que terão as condições salariais e de progressão de carreira do restante sistema bancário.