Salazar e o 10 de junho

Eu estive lá e só  lamento não ter visto políticos do PCP e do Bloco de Esquerda

Este 10 de junho foi o mais bonito, sentido, emotivo e o mais português que podia ser. Marcelo Rebelo de Sousa teve o rasgo de impor umas comemorações no Terreiro do Paço de manhã e outras em Paris à tarde.

As comemorações na Praça do Comércio foram idênticas às da ditadura – e, por estarem mal afamadas, há 43 anos que não eram feitas ali. Eu estive lá, nas bancadas do município, e só posso lamentar não ter visto políticos do PCP e do Bloco de Esquerda. A falta de comparência destes partidos é uma atitude primária e radical já reincidente: também não tinham batido palmas quando o Presidente da República tomou posse na Assembleia da República. Os tempos até podem ser novos, mas hábitos antigos custam a morrer.

 Ir a Paris celebrar o Dia de Portugal e das Comunidades Portuguesas é genial. Para além do justíssimo tributo aos nossos milhões de compatriotas, poupa-nos a visão horripilante de ver demasiada medalha mal empregue, em cerimónias pacóvias, longas e chatas, ostensivamente desdenhadas pelo povo.

A história repetiu-se, mas para melhor. A cerimónia do 10 de Junho no Terreiro do Paço foi igual às do tempo de Salazar, mas vivemos agora tempos de liberdade. Somos governados por um Governo de extrema-esquerda, mas não há bombas e ninguém vai preso.

De uma penada, fizemos as pazes com a ditadura e com o PREC. Há vinte anos ainda não teríamos esta maturidade democrática.

Estava tudo nesta santa paz quando António Costa, embalado pelo Presidente François Hollande, se lembrou de dizer, sobre o ensino do Português, que era uma oportunidade para muitos professores.

Logo as redes sociais explodiram, comparando essas palavras com as do ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho quando sugeriu a emigração para países de língua portuguesa como uma opção para os professores que não conseguissem colocação em Portugal. António Costa, usando uma rede social, rejeitou a comparação, dizendo que «a estrada da Beira e a beira da estrada não são a mesma coisa». Mas é óbvio que Passos Coelho e António Costa disseram exatamente o mesmo.

Quem pelas redes sociais mata, pelas redes sociais morre. Ontem foi o Pedro, hoje é o António.

Mas fora das redes sociais – e das suas explosões que saltaram para os fóruns das televisões e das rádios – há um país inteiro que não se encanitou com as palavras de Passos Coelho e não levou a sério a conversa do mandar emigrar. Porque nunca precisámos, fomos sozinhos. Aliás, se o país tivesse levado a sério essa conversa, não teria dado à direita uma vitória nas legislativas.

Quando Marcelo resolveu levar o primeiro-ministro a ver a pátria fora de portas, fora da metrópole, também foi mostrar-lhe o que somos. Foi como se lhe dissesse: ‘António, este é o nosso destino’. Com Pedros ou com Antónios.

sofiarocha@sol.pt