O Brexit venceu, mas o Reino Unido não sai já da União Europeia

Mesmo com a  vitória do Brexit, as leis de Bruxelas continuam a reinar

Aconteceu o que muitos temiam e o que vários desejavam: o Brexit venceu o referendo desta quinta-feira. Com praticamente todas as áreas contadas, a saída da União Europeia vence com pouco mais de 51% dos votos.

Os especialistas britânicos escusaram-se a fazer sondagens à boca das urnas com o argumento de que não tinham cenário de comparação, pois o último referendo que se realizou no país foi há 42 anos. O único resultado anunciado às 22h, logo após o fecho das urnas, foi uma sondagem da YouGov que, apesar de ter sido realizada no dia da votação, foi feita como as anteriores, por telefone. O estudo dava vantagem à permanência na UE, com 52% contra 48% do Brexit, mas o método não permitia especular sobre o resultado final com a mesma exatidão da tradicional consulta aos eleitores que se dirigiram às mesas de voto.

Apesar do resultado, uma coisa podemos garantir: hoje o Reino Unido é membro da União Europeia. Mesmo com o Brexit. E continuará a ser provavelmente durante bastante tempo.

Na verdade, ninguém sabe dizer quanto. Só em 2007 – na célebre noite do “porreiro, pá” com que José Sócrates e Durão Barroso celebraram a assinatura do Tratado de Lisboa – foi criado o artigo 50 dos Tratados da União. Ou seja, apenas 56 anos depois do início do projeto comunitário houve necessidade de criar um mecanismo para um Estado-membro poder iniciar um processo de saída da União.

“A União negoceia e celebra com esse Estado [que tenha ativado o mecanismo] um acordo que estabeleça as condições da sua saída, tendo em conta o quadro das suas futuras relações com a União”, diz o ponto 2 do artigo 50. E logo a seguir, o ponto 3 explica que “os Tratados deixam de ser aplicáveis ao Estado em causa a partir da data de entrada em vigor do acordo de saída ou, na falta deste, dois anos após a notificação” do desejo de saída. E o mesmo ponto ainda prevê que o “Conselho Europeu, com o acordo do Estado-membro em causa, decida, por unanimidade, prorrogar esse prazo”.

O método e o tempo da saída fizeram, aliás, parte da campanha. Michael Gove, o ministro da Justiça que se tornou o principal representante do governo entre os defensores da saída, disse no início do mês que o país “não sairá da União Europeia até ao fim desta legislatura”, previsto para 2020. Já Gus O’Donnell, ou Sir O’Donnell desde que serviu de chefe de gabinete para os três últimos primeiros-ministros, alertava nas páginas do “Telegraph” que o processo “pode chegar a demorar dez anos”.

Por isso, o Reino Unido está para ficar. Porque para além do tradicional arrastamento a que as questões europeias mais complexas são sujeitas, há ainda a política interna britânica a prometer muita discussão antes de uma decisão final.

O artigo 50 diz que “qualquer lei nacional que tenha sido adotada na implementação ou transposição de uma lei europeia será válida até que as autoridades nacionais decidam alterá-la ou eliminá-la”. Resta saber agora qual será a reação de Bruxelas.