O aleijado Schäuble e a bruxa Manuela

O Brexit era a crise de que o PS precisava para se desculpar

Manuela Ferreira Leite era uma ‘bruxa velha’ e o ministro das Finanças alemão é um ‘aleijado numa cadeira de rodas’. 

Nas eleições legislativas de 2009, Manuela Ferreira Leite era mimosamente chamada de «bruxa» pela esquerda, porque desdenhava das propostas económicas do PS e de Sócrates. Este chamava-lhe – a ela e a todos os aqueles que discordavam das políticas que davam zero crescimento – «bota-abaixista». O PS ganhou as eleições contra os ‘bota-abaixistas’, e um escasso ano e meio depois o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, sucumbia pedindo ajuda ao estrangeiro porque não havia dinheiro para pagar salários e pensões. Recordemos que o fez com uma mão à frente e outra atrás, e contra a vontade do primeiro-ministro Sócrates. 

As hipóteses para o que aconteceu são três: ou a economia portuguesa mudou num ano e meio (entre setembro de 2009 e março de 2011); ou Manuela Ferreira Leite teve razão antes de tempo; ou o Governo socialista e Sócrates mentiram o mais que puderam para ganhar tempo e as eleições. 

Os socialistas defendem a primeira hipótese: estávamos bem em 2009 e de repente veio uma crise internacional que entrou por aqui dentro como faca quente em manteiga e desgraçou o país. A culpa foi da crise, portanto.

É claro que Manuela Ferreira Leite estava cheia de razão e o Governo socialista e Sócrates mentiram o mais que puderam para ganhar tempo e as eleições.

António Costa, tendo abandonado a Câmara de Lisboa em abril de 2015, logo nesse mês – e a fim de se legitimar como líder da oposição – foi buscar Mário Centeno, feito santo milagreiro.

Centeno é um quadro do Banco de Portugal, doutorado em Harvard, especialista em mercado de trabalho, que tinha publicado um livro na Fundação Francisco Manuel dos Santos chamado O Trabalho, Uma Visão de Mercado.
Cito-vos o soberbo início da página 20: «O crescimento económico caracteriza-se por uma incessante atividade de criação e destruição de emprego nas empresas. As empresas ajustam não só o nível de emprego, mas também a sua composição, o que acontece através de novas contratações e de separações – saídas voluntárias e despedimentos – de trabalhadores. A sua racionalidade económica assenta na perspetiva shumpeteriana de destruição criativa, substituindo-se relações económicas que se tornam obsoletas por relações mais competitivas».
Mário Centeno é um liberal. Juntar as palavras ‘trabalho’ e ‘mercado’ no mesmo título não é de esquerda. Quer dizer, Mário Centeno tem tanto de socialista como eu tenho de alta, magra e loira.  

Catorze meses depois de ter apresentado o cenário macroeconómico de António Costa, Centeno já declarou que o Brexit é uma mudança estrutural e que as previsões económicas vão ser revistas. 

O ministro das Finanças alemão, Schäuble, que já está habituado aos governos socialistas, sabe que o Brexit era a crise de que o PS precisava para se desculpar.

Há-de ser Mário Centeno, que já foi o santo do calendário de António Costa, a pedir um resgate. Isto, se não for despedido antes.