Lisboa e os candidatos

Vamos ter eleições em 2017 e não vale a pena encher programas eleitorais com promessas que não são para cumprir, como pontes ou aeroportos. Nem omitir as reais necessidades das pessoas, como seja pagar uma casa. 

A Baixa era um túmulo, um sarcófago, um deserto. Fui para lá trabalhar em 2009, para a Rua Nova do Almada, ao pé da Praça do Município. No Inverno, a chover, era fácil imaginar que alguma daquelas pessoas que subiam a Rua Garrett era a alma penada do Fernando Pessoa. Não tenho como dizer isto de outra maneira: trabalhar na Baixa em 2009 era uma seca. 

Em 2009, António Costa ganhou as eleições autárquicas, e Pedro Santana Lopes, perdendo-as, ficou como líder da oposição. Desde o início desse mandato autárquico 2009-13 discutiu-se várias vezes o projeto da videovigilância. Havia a ideia de instalar câmaras, justamente por causa da desertificação da zona e para ajudar a combater a criminalidade. Na freguesia da Sé viviam então 100 pessoas. 

António Costa, nessa campanha que veio a vencer, prometia aos lisboetas uma terceira ponte sobre o Tejo e um aeroporto em Alcochete, com a reconversão do aeroporto de Lisboa. Nada disso veio a suceder, como sabemos (o que não impediu Costa de ser reeleito).

De 2009 aos dias de hoje passaram 7 anos. Na Baixa parece que se deu outro terramoto. Parece outro 1 de Novembro de 1755. Da rotunda do Marquês para baixo é outra cidade. É outro país. A Baixa é a zona mais movimentada, mais jovem, mais apinhada, mais gira, mais dinâmica da cidade. É simplesmente a maior concentração de gente nova e bonita por metro quadrado que já vi em Lisboa. 

Se sem 2009 trabalhar na Baixa era uma seca, agora deve ser impossível — tais os motivos de distração que lá existem. 

Há dias fui fazer de turista, começando pelos cafés da Rua do Ouro, onde os empregados mal-encarados de antes são agora risonhos e poliglotas. Fui dar uma volta de tuk-tuk, começando no Terreiro do Paço, passando pela Sé, Portas do Sol, Miradouro da Senhora do Monte e Graça, acabando em Alfama (declinei a ginjinha). Não faltou nada.

O polícia que nos mandou parar, as explicações históricas macarrónicas do recente condutor, a hesitação na hora de me passar o recibo. 

É contudo impossível não sorrir perante a beleza da cidade e alegria dos turistas e dos portugueses que assim governam a vida. 

Obviamente que há o reverso da medalha. A oferta de habitação escasseia, apesar da quantidade de prédios abandonados a ameaçar ruína. Com a necessidade de alojar turistas, o metro quadrado subiu em flecha. A falta de habitação é agora o maior problema das pessoas, e por isso o maior problema político da cidade. 

Vamos ter eleições em 2017 e não vale a pena encher programas eleitorais com promessas que não são para cumprir, como pontes ou aeroportos. Nem omitir as reais necessidades das pessoas, como seja pagar uma casa. 

A transformação da Baixa veio sem ser anunciada, não foi prevista pelo executivo nem pela oposição. As consequências dramáticas na habitação também não foram antecipadas. 

A política não é um fenómeno da natureza. A Baixa, desta vez, não foi um terramoto seguido de maremoto. Podiam e deviam ter avisado, para o mal e para o bem.