Efetivamente, como afirma Pedro Bidarra nesta frase, com que participou na semana do Clube de Criativos de Portugal, em 2014, e que encontrei na zona do Campo das Cebolas, «há imensos atalhos para o lugar-comum».
O lugar-comum é, tal como o nome indica, um lugar partilhado por muitos, comum a muitos, ou seja, é algo comummente aceite, sem ser questionado, sendo por isso trivial, sem profundidade. Como dizia ironicamente O’Neill referindo-se ao supremo lugar-comum: «a morte, esse lugar-comum»…
E este lugar que é comum é também um local fértil para as palavras vazias, as que são despojadas de sentido. É lugar-comum dizer-se que todos os políticos são iguais ou que o sal faz mal ao coração ou que a laranja à noite mata. Ouvimos ou pronunciamos muitas vezes estas afirmações, mas quantas vezes nos questionamos por que motivo é assim ou se, na realidade, será mesmo assim? Porque mata a laranja à noite? Será que pega num revólver e dispara um tiro? Ou “simplesmente” provoca uma congestão? – Poucas serão as pessoas conscientes de que esta frase, herdada da sabedoria popular, se deve ao facto real de a quantidade de absorção de vitamina C pelo nosso organismo diminuir ao longo do dia. E os políticos? Serão mesmo todos iguais? Não serão eles pessoas e, como tal, todos diferentes? Não estaremos, como frequentemente fazemos, a tomar a parte pelo todo?
E se já é tão fácil tropeçar nas palavras e cair no lugar-comum, muito mais simples será quando há atalhos, quando lá chegamos diretamente, sem necessidade de grandes raciocínios, amparados por muletas vocabulares ou ideológicas.
Se nos sentarmos num autocarro durante meia hora e atentarmos nas conversas dos ocupantes, veremos que, quando as pessoas não se conhecem, têm tendência para começar a falar sobre aspetos comuns do que veem – um jovem cheio de piercings, um transeunte que atravessa a passadeira sem olhar, uma viatura que ultrapassa vertiginosamente o autocarro, um jovem que não se levanta para um idoso se sentar («Parece impossível o estado a que isto chegou! Já ninguém se levanta por uma pessoa de idade. É que vê-se mesmo que não lhes dão educação, nem em casa nem na escola…» – e todo um chorrilho de lugares comuns atrás de lugares comuns…). São estes os atalhos que ligam as pessoas e as seduzem, como armadilhas com um pedaço de queijo, e nos atraem, gulosos e obedientes, para o lugar-comum. Como refere Mário de Carvalho, em Fantasia para Dois Coronéis e uma Piscina, vivemos uma cultura da superficialidade, em que a logorreia está associada à verborreia: “O país fala, fala, desunha-se a falar, e pouco do que diz tem o menor interesse”…
Mas não é forçoso que assim seja, não é obrigatório seguir, como carneirinhos, a fila, ou acompanhar o rebanho, como uma ovelha…
Escrito em parceria com o blogue da Letrário, Translation Services