Pelo menos desde 2012 que não eram detidas tão poucas pessoas em Portugal por suspeitas de fogo posto até ao final do mês de julho. Este ano, a Polícia Judiciária conseguiu detetar e deter 17 pessoas suspeitas de atear fogos florestais em vários pontos do país, mas, sobretudo, na região norte. O registo anda a par da calmaria que se tem registado no número de incêndios e área ardida, os mais baixos dos últimos dez anos, segundo o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).
O caso mais recente aconteceu esta terça-feira. Quando a PSP chegou perto de José (nome fictício), o operário de uma fábrica na zona de Vila Nova de Famalicão estava concentrado na tarefa que se tinha proposto cumprir: na penumbra da madrugada, o homem, de meia idade, ainda estava a lançar para os terrenos à sua volta pedaços de madeira incandescentes.
Ao apontar ao mato baixo que por ali se encontrava, José tentava fazer com que o fogo se alastrasse às casas ali ao lado e aos carros estacionados à volta. Foi apanhado em flagrante delito a tentar provocar estragos nos bens dos vizinhos e valeu a intervenção rápida dos bombeiros para impedir que o incêndio tomasse maiores proporções.
Essa é uma das motivações dos incendiários: vingança.
Por causa de um assunto mal resolvido com um vizinho ou com um (ex-)amigo, porque o resultado de uma disputa familiar não lhe foi favorável ou por simples diversão – mas sempre por razões «fúteis», como a PJ resume muitos dos casos que vão sendo resolvidos. Noutra situação, também este mês, Ricardo (nome fictício), de 22 anos, só pegou no isqueiro porque estava desavindo com a mãe da namorada. Acabou por ser obrigado por um juiz a comparecer, de duas em duas semanas, na esquadra perto de sua casa para cumprir as apresentações periódicas. Depois disso virá o julgamento.
Crime para todas as idades
Este ano, o leque de idades dos alegados incendiários de fogos florestais oscila entre os 17 e os 70 anos. Quando foi detido, ‘Joaquim’ já tinha deixado os moradores da zona, nos arredores de Braga, em sobressalto. Fogo após fogo, sempre com recurso a um isqueiro, o septuagenário foi lançando pequenas sementes incendiárias pela região, obrigando, uma e outra vez, à intervenção dos bombeiros para evitar males maiores.
Mas mesmo com os vários episódios com que se foram deparando, os inspetores registaram, até ao final da semana, o mais baixo número de detenções: 17, um universo que obriga a recuar aos primeiros sete meses de 2011 em busca de um valor ainda mais baixo. Nesse ano, até aos últimos dias de julho, tinham sido detidos sete pessoas suspeitas de atear fogos em meio florestal. E no ano anterior tinham sido ainda menos: apenas dois. No entanto, de 2012 para 2014 houve um aumento bastante significativo de casos detetados pela PJ (mais 50% de detidos).
Até esta quinta-feira tinham sido instaurados 260 inquéritos por suspeitas da prática deste crime. A região norte é aquela em que, a nível nacional, mais casos são registados. E este ano não é exceção.
Mas 2016 está a ser um ano de calmaria. Na verdade, até 15 de julho, foram registadas 2880 ocorrências (das quais 403 foram incêndios em zona florestal). Uma realidade que representa uma redução de 64,5% em comparação com o mesmo período do ano passado e o valor mais baixo desde 2006. Algo que a Instituto de Conservação da Natureza atribui a uma primavera particularmente chuvosa.
E o mesmo se verifica em relação à área ardida total. «Comparando os valores do ano de 2016 com o histórico dos últimos 10 anos, no período de 1 de janeiro a 15 de julho, destaca-se que se registaram menos 58% de ocorrências relativamente à média verificada no decénio 2006-2015 e que ardeu menos 86% área do que o valor médio de área ardida nesse período», refere um documento do ICNF divulgado esta semana.