Golge-Rio2016. Portugueses desiludidos regressam orgulhosos com experiência única

Jogadores portugueses queriam melhor

Filipe Lima (FL) e Ricardo Melo Gouveia (RMG) ficarão para sempre ligados à história do golfe nacional como os primeiros portugueses a participarem num torneio olímpico de golfe e logo numa edição de 2016, no Rio de Janeiro, marcada por ser a primeira vez em que os Jogos Olímpicos tiveram o português como uma das suas línguas oficiais.

O golfe levou 112 anos a regressar aos Jogos Olímpicos, a sua presença está confirmada na edição de 2020, em Tóquio, mas só para o ano se saberá se o Comité Olímpico Internacional fixa o golfe como modalidade olímpica a partir de 2024.

Esperemos que se a decisão seja positiva e que muitos mais golfistas portugueses possam seguir os passos dos pioneiros RMG e FL, mas, independentemente do que vier a ser o futuro, para a história ficará esta primeira participação.

Uma participação alargada ao árbitro João Paulo Pinto, um português agora residente em Inglaterra, que irá atuar no torneio olímpico feminino, e ainda ao engenheiro António Carlos Miranda, o menos conhecido dos quatro portugueses diretamente envolvidos neste torneio olímpico.

O Campo Olímpico de Golfe, situado na Reserva de Marapendi, na Barra da Tijuca, é um percurso desenhado pelo norte-americano Gil Hanse e construído pela empresa ProGolf, cuja equipa foi liderada por António Carlos Miranda, um português residente no Brasil, que disse ao Gabinete de Imprensa da FPG: «Só (falei) com o Filipe Lima e com o Tomás Melo Gouveia. Com o Ricardo Melo Gouveia não falei, mas os comentários dos jogadores foram muito positivos, agora vamos ver o que dizem as senhoras».

Jogadores portugueses queriam melhor

Voltando à prestação desportiva, FL irá deter, pelo menos durante os próximos quatro anos, o recorde olímpico nacional de ter terminado no 48º lugar, empatado com o malaio Danny Chia, com 288 pancadas, 4 acima do Par.

O profissional português, nascido e residente em França, agregou voltas de 70, 70, 77 e 71. Aos 18 buracos era 17º, aos 36 surgia em 18º, aos 54 desceu para 44º, e aos 72 fechou em 48º.

Quanto a RMG, nascido em Portugal e residente em Inglaterra, foi 59º classificado, entre 60 participantes, com 297 (+13), após voltas de 73, 68, 76 e 80. A sua classificação variou de 42º para 22º, 44º e 59º. O seu cartão de 68 (-3) foi um dos melhores do torneio na segunda volta e passa a ser um recorde olímpico nacional para 18 buracos.

É óbvio que nenhum dos golfistas portugueses gostou da sua classificação e não o esconderam nas declarações que prestaram à agência Lusa, presente no Rio de Janeiro.

«Claro que quer-se sempre um melhor resultado, quer-se sempre mais, mas no Sábado tive um dia fraco», reconheceu FL.

«Não correu bem, principalmente nos últimos dois dias. Estive muito aquém do meu jogo. Perdi um pouco a confiança no jogo curto no Sábado e isso custou-me muitas pancadas até ao final», sublinhou RMG.

Qual a explicação que os dois jogadores encontraram? Uma coisa é certa, não culparam o campo, elogiado por ambos, com FL até a frisar o orgulho que sente em proclamar que foi construído por um português.

RMG falou do jogo curto que o traiu e na sua conta profissional no Facebook acrescentou mais detalhes. «Esta, infelizmente, não foi a minha semana. Estive outra vez muito mal no jogo curto, o que me custou muitas pancadas», escreveu no final do torneio. «Foi um dia não, em que, logo no buraco 1, as coisas começaram mal. Perdi um pouco a confiança e foi difícil recuperá-la, o vento também foi aumentando de velocidade o que não ajudou», comentou ao terminar o penúltimo dia.

Também FL, na sua conta oficial no Facebook, especificou no final do terceiro dia: «Fui péssimo na gestão do stress. Observei demasiado os outros jogadores e não joguei o meu jogo habitual no início. Depois as coisas já estavam a correr melhor mas o mal já estava feito. É pena». Em conversa com a Lusa, FL acrescentou que «era um bocadinho como uma criança a jogar com o norte-americano Patrick Reed. Aprendi muita coisa».

A questão emocional foi, naturalmente importante e, logo no primeiro dia os dois jogadores admitiram senti-la, quando foram entrevistados pela Lusa.

«Um pouco a tremer no princípio. Estive a falar com os outros atletas e sabemos o que é, porque é a primeira vez que estamos a jogar os Jogos Olímpicos, pelo que é um pouco difícil. Estamos um pouco perdidos nas sensações, mas depois de batermos os primeiros 'shots' as sensações dos torneios voltam e é o mesmo jogo», declarou FL, de 34 anos, que só se qualificou para o Rio2016 poucos dias antes do início dos Jogos Olímpicos.

«Há um pouco mais de pressão. O facto de estarmos a representar o nosso país é digno dessa pressão extra. Senti um pouco no início, mas depois o jogo foi melhorando, consegui acalmar-me e as coisas começaram a correr melhor. Foi só pena o 'putt' não ter entrado», afirmou RMG, de 25 anos recém-celebrados, que sabia do seu apuramento para os Jogos há muito mais tempo.

Sendo ainda dois jovens para uma modalidade como o golfe, em que se pode competir ao mais alto nível para lá dos 40 anos, esta primeira experiência poderá ser-lhes vital se voltarem a deter o estatuto de atletas olímpicos. Vontade não lhes falta.

«Agora, já estou a pensar em daqui a quatro anos, em Tóquio. Quero ver como vai ser», disparou FL. «Gostaria de estar no Japão e de poder voltar a representar as cores nacionais», assegurou RMG.

Memórias para a vida

Se a classificação desportiva não foi a melhor, houve, apesar de tudo, aspetos positivos que transformaram esta experiência em algo de único, com memórias para a vida.

FL não pode estar presente na cerimónia de abertura do Rio2016 por competir ainda nessa data num torneio do Challenge Tour, mas RMG nunca esquecerá, até por um motivo muito especial.

«Obrigado a todas as pessoas que fizeram o dia de ontem muito especial para mim. Como sabem é semana de Jogos Olímpicos e o dia dos meus anos não podia ter calhado numa semana melhor», escreveu no Facebook. Pois é, festejar o 25º aniversário (6 de agosto) num Maracanã em festa, a desfilar, integrado na comitiva portuguesa, não é para todos!

Para além desse evento, como reportou a Lusa, «RMG gostou da experiência extrajogo, sobretudo de "estar com outros atletas, na Aldeia Olímpica, um sítio onde fica toda a gente", pois, de resto, tudo é "muito parecido" com um torneio do circuito europeu».

RMG publicou algumas fotografias ao lado de outros atletas nacionais, nas quais se percebeu que incorporou-se perfeitamente no espírito olímpico da missão portuguesa chefiada por José Garcia.

E o convívio não foi só com portugueses, já para não referir o privilégio de jogar ao lado de algumas das maiores figuras do golfe mundial.

Na penúltima volta, apelidada pelo site especializado “Golftatto” de «Sábado gourmet para o golfe português», RMG integrou o grupo de jogadores da Ryder Cup, o espanhol Sergio Garcia e o norte-americano Patrick Reed, respetivamente nº11 e nº14 no ranking mundial, enquanto FL foi parceiro do nº6, o norte-americano, Bubba Watson, campeão do Masters em 2012 e 2014. FL também jogou com Reed.

«Que balanço faço desta experiência?», indagava FL. «Só pode ser positivo – respondeu – porque é positivo ser um atleta olímpico e representar Portugal, o que sempre foi um sonho. Ser dos primeiros atletas olímpicos a representar Portugal no golfe é fantástico. Foi uma semana extraordinária».

Tomás Melo Gouveia, pai de RMG e um dos gestores do Team Portugal (em golfe), resumiu bem a experiência: «Não foi o que esperávamos, ou queríamos mas, (foi) sem dúvida um tempo inesquecível. Festejar os 25 anos no Maracanã, com milhares de pessoas, na (cerimónia de) abertura dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, no ano em que o golfe volta a ser desporto olímpico, num campo maravilhoso, com Portugal representado por dois jogadores é mais um momento muito especial que, a mim me deixa muito orgulhoso. (Estou) certo que nos trará muitas mais alegrias. Resta continuar a trabalhar duro para levar o nome de Portugal mais longe e mais alto»

Quanto a RMG, também no Facebook, depois de alguns agradecimentos, prometeu: «Vou voltar mais forte!».

Justin Rose campeão olímpico, jogador de Manuel Agrellos

O torneio olímpico de golfe masculino tão criticado antes de começar pela ausência do top-4 do ranking mundial, acabou em apoteose, lembrando aos mais céticos que no golfe não é como as coisas começam, mas como terminam.

E só se decidiu tudo no último buraco, diante de uma lotação esgotada de 15 mil espectadores na última jornada, com um duelo empolgante entre campeões de Majors, tendo o britânico Justin Rose (-16) batido o sueco Henrik Stenson (-14) por 2 pancadas.

Refira-se que a medalha de bronze teve 16 candidatos na última volta e foi parar para as mãos do norte-americano Matt Kuchar (-13).

Rose (12º do ranking mundial na semana passada e 9º esta semana) e Stenson (4º mundial esta semana e 5º durante a prova olímpica) formaram uma dupla terrível na última Ryder Cup (2014), na qual emparceiraram para dar 3 dos pontos da vitória da Europa sobre os Estados Unidos.

São grandes amigos e isso viu-se no cumprimento final, com Rose, campeão do US Open em 2013, a juntar voltas de 67, 69, 65 e 67, e Stenson, o recente vencedor do British Open, a somar cartões de 66, 68, 68 e 68.

O recorde olímpico para 18 buracos e do campo olímpico de golfe foi fixado logo no primeiro dia pelo australiano Marcus Fraser, com 63 (-8) no primeiro dia e igualado na última volta por Matt Kuchar.

Ao contrário do que aconteceu, por exemplo, no ténis, o torneio olímpico de golfe distribuiu pontos para o ranking mundial. Como vimos, tanto Rose como Stenson subiram nessa hierarquia e Kuchar também melhorou de 20º para 15º.

Entre os portugueses, RMG não ganhou qualquer ponto e esta semana até perdeu 3 posições para 134º, mas FL angariou 1,22 pontos e ascendeu ao 382º posto, ganhando 23 lugares.

Contudo, nenhum golfista competiu no Rio2016 a pensar nos pontos e nenhum chorou os prémios monetários inexistentes. O sentimento geral foi o da descoberta da honra única que é jogar pela bandeira do seu país no mais importante evento desportivo do planeta.

Rose deu o ouro à Grã-Bretanha, Stenson a prata à Suécia e Kuchar o bronze aos Estados Unidos.

O campeão olímpico, Justin Rose, foi, nos seus tempos de amador, capitaneado pelo português Manuel Agrellos e talvez a melhor declaração neste torneio olímpico de golfe tenha vindo de outra estrela mundial que em tempos também foi dirigido pelo atual presidente da Federação Portuguesa de Golfe.

Falamos de Sergio Garcia, um dos rivais históricos de Tiger Woods, que foi 8º empatado com 7 pancadas abaixo do Par, não levou nenhuma medalha para Espanha, mas deixou a seguinte mensagem nas redes sociais: «Whoever said Olympic Golf didn't mean anything must've been on drugs cause this is absolutely amazing!!Coming to Rio, my best decision ever!».

É preciso tradução? «Quem disse que o Golfe Olímpico não significa nada deveria estar sob efeito de drogas, porque isto é simplesmente espantoso!! Ter vindo ao Rio, a minha melhor decisão de sempre».