Floresta aberta para ser. A fogueira, ainda que morna, ao fundo, deixa antever a necessidade de vegetação. Que sejam eucaliptos, que seja a lavanda dobrada a seus pés, a pedir recolha. Para Kevin Morby não é a espécie que importa – até porque esses nomes em latim são indecifráveis –, antes os ecos de estar de caderno pronto entre a natureza, a reclusão que na melhor das hipóteses admite aplausos de ursos melómanos. Daqueles que gostam de folk com cheiro a chuva, quase rock de cantautor. No fundo, estar sozinho.
A sonoridade do norte-americano, natural de Kansas City mas que cedo se mudou para Brooklyn e mais tarde para Los Angeles, tem tudo que ver com a solidão. A mesma que o fez largar os Woods, onde tocava baixo, ou os Babies, onde era líder. “Cheguei a um ponto em que estava a escrever bastante, coisas minhas, foi aí que percebi que queria cantá-las como sendo só minhas. Quando estás com outras pessoas perde-se alguma coisa no caminho, não representas tudo o que queres”, esclarece antes de garantir que precisa de intimidade para trabalhar e então, “depois disso, ir ter com amigos e falar”.
A conversa, por telefone, é curta o suficiente para entendermos que gosta mais de fazer música do que de falar, mania de pseudo-guarda-florestal que preferirá sempre as árvores, em detrimento das pessoas. E como o entendemos: “Adoro estar na natureza e foi algo que descobri recentemente. Durante alguns anos não tive essa oportunidade, estive longe da natureza, envolto em prédios. Quando me mudei para a Califórnia comecei a sentir essa necessidade, esse desejo de ir”.
Ânsia que incutimos a todos os que já se encontram pela Praia Fluvial do Taboão. Kevin Morby sobe ao Palco Vodafone na próxima sexta-feira, pelas 18h30. Se é para celebrar a envolvência do Vodafone Paredes de Coura, que seja com ele.
Antes deste “Singing Saw”, disco editado em abril pela Dead Oceans e motivo de estar por estas bandas europeias, já havia editado “Harlem River” (2013) e “Still Life” (2014). Morby é um workaholic dos saudáveis, dos que fazem bem a si próprios. E ainda que as pessoas não sejam a sua parte preferida do mundo, teve a coragem de chamar a um disco “Still Life”, como se nela acreditasse. Nada disso, Kevin Morby não é só boa música frontal, também é sarcasmo. “O nome desse disco até é bastante irónico. Foi um tempo de mudança para mim, estive sempre em movimento, dois ou três anos em digressão, e foi aí que escrevi a maior parte do disco… ou seja, não parei, e ainda assim ‘Still Life’”.
Só que neste “Singing Saw” o artista mergulha mais fundo, que a prancha estava demasiado à vista para o chapão ser completamente ao seu gosto. “A maior diferença é essa componente de ambiente. Enquanto o ‘Still Life’ foi todo escrito em estrada, este ‘Singing Saw’ foi todo escrito num lugar, estava ali para fazer aquilo e isso escuta-se nas canções. O primeiro emerge do barulho, do movimento, enquanto este último é mais calmo, íntimo, lá está”, confessa.
Basta googlar o seu nome, clicar em dois ou três links para nos apercebermos que nem com chapéu de chuva escapamos à molha das comparações com Bob Dylan e Leonard Cohen. Conclua-se, antes de mais, que se entende: o enquadramento, a guitarra e o piano de Morby, o cuidado com a composição, refletem a sua nostalgia folk de existir e viver para cantar. Mais: Morby, não é, por certo, pessoa de negar ou detestar comparações. “São duas pessoas que me influenciaram bastante, não me importa nada com isso, aliás, até fico contente que me comparem a duas pessoas que fizeram tanto pela música”, admite.
Admitamos nós também que este concerto se revela obrigatório.