“Oi, quem és?”

Esta curiosa interrogação interrompe o caminho de quem passa, perguntando quem somos. É com um misto de surpresa e curiosidade que sou «abordada» por esta questão.

A resposta mais imediata é dizer o meu nome, mas quantas outras pessoas têm o mesmo nome? Será que é o nome que me define e distingue? Não, eu sou mais do que o nome que os meus pais escolheram dar-me; muito mais.

Interrogo-me, então, sobre como poderei, como poderá alguém responder a esta pergunta tão direta. E recordo-me do poema de Reinaldo Ferreira (dito e gravado por Vítor de Sousa) que começa exatamente com: “Perguntas-me quem sou”. E a resposta que dá, submissamente apaixonado, é: “Eu nada sou, Amor, eu nem existo / Mas querendo tu, Amor, tudo serei!” Esta é a dependência total da pessoa amada, até como garante de existência…

Habitualmente, em contextos em que temos de nos apresentar, ao nome acrescentamos a profissão, a idade (por vezes!) e, eventualmente, os hobbies ou aquilo de que gostamos. Ficamos, pois, pela superfície, pela capa que nos reveste, pela máscara que tão bem (ou tão mal) nos serve.

É óbvio que, num contexto assim, pouco ou nenhum sentido faria acrescentarmos mais informação. Mas, podemos pensar, para nós próprios, ou com aqueles que nos são mais próximos, como poderíamos completar esta definição de modo a que com ela verdadeiramente nos identificássemos.

E bastaria que nos centrássemos exatamente na primeira das perguntas fundamentais que Teódoto, em meados do século II, nos legou: “Quem sou? De onde venho? Para onde vou? A quem pertenço? Por que coisa posso ser salvo?” Bastaria que dedicássemos algum tempo a pensar sobre o que faz com que ajamos habitualmente de determinada maneira, com que experimentemos certos sentimentos, com que digamos normalmente algumas palavras em reação a outras…

Talvez até chegássemos à conclusão, sábia e acertada, de Clarice Lispector: “Eu sou uma pergunta”!

Como aconselhava um grupo de jovens atores na peça de teatro que vi recentemente encenada pel’ O Bando: “Deixa connosco o teu nome do fim”. Debruçava-se a peça sobre o que somos e o que é ou julgamos essencial para a nossa identidade: “não aceitem nada, têm de interrogar, de questionar”.

Este é um exercício talvez difícil pelo risco de constantemente estar incompleto, talvez porque sejamos sempre algo mais do que realmente somos. Talvez sejamos demasiado imperfeitos ou demasiado perfeitos para sermos apenas isto…