“A parte mais triste foram as pessoas a gritarem «vão para a vossa casa! e a aplaudirem a polícia”, revela uma francesa que testemunhou quatro polícias a multarem uma muçulmana por “não estar vestida de acordo com o secularismo e a boa moral”. A muçulmana, de acordo com fotografias divulgadas, estaria vestida com uma túnica, leggings e um lenço de cabeça. Nenhuma destas peças de vestuário vai contra a legislação nacional francesa, que proíbe a burca por cobrir todo o corpo, ou contra a crescente legislação local que proíbe os burquínis.
O episódio passou-se em Nice, a última cidade do Sul de França que proibiu as mulheres muçulmanas de utilizarem burquínis em áreas balneares. O ataque terrorista de 14 de julho, em que um terrorista islâmico varreu a baixa da cidade com um camião e assassinou oitenta e seis pessoas, é explicitamente referido na legislação emitida acerca dos burquínis.
O governo socialista, embora apoie o banimento do fato-de-banho alternativo, já havia feito saber pela sua ministra dos direitos da mulher que nega totalmente a associação direta entre a roupagem religiosa e o terrorismo.
Em Cannes, também emergiram fotografias de polícias a confrontarem uma mulher tapada com uma túnica na praia. A mulher despiu a vestimenta e sofreu uma coima. A multa para o uso do burquíni pode chegar aos 38 euros. Não se sabe sob que acusação terá esta mulher muçulmana sofrido a coima.
Hoje, o mais alto tribunal administrativo da França receberá um recurso da Liga dos Diretos Humanos (uma organização não-governamental gaulesa) acerca do banimento do burquíni. A decisão do tribunal servirá de precedente para o resto da França quando o primeiro-ministro, Manuel Valls, afirmara há dias que “um precedente não é necessário”. O recurso é um desafio a um tribunal local de Nice, que havia considerado a medida “proporcional às circunstâncias” e necessária para impedir desordens públicas. De acordo com o tribunal, o burquíni ofende convicções religiosas ou a ausência de convicções religiosas e poderá ser interpretado como uma provocação”. O Corpo de Intervenção já fora obrigado a intervir em confrontos entre populações locais e comunidades muçulmanas.
A comunidade internacional reagiu com alguma surpresa à proibição taxativa sobre o vestuário feminino nas localidades do Sul de França, especialmente pela reação do governo socialista, que apoiou os decretos dos autarcas de direita. A aprovação do executivo levou a um alargar do banimento a outras regiões, sendo o burquíni neste momento proibido em quinze autarquias. As redes sociais foram inundadas com fotografias de freiras vestidas na praia com hábitos. O “Telegraph”, o jornal conservador mais lido em Inglaterra, argumentou que os “verdadeiros inimigos da liberdade eram os polícias”, acusando as leis de revelarem “fanatismo”. Na Catalunha, a assembleia local não tardou em afirmar que “as mulheres vestem o que quiserem”. A ministra da justiça canadiana disse precisamente o mesmo. Em Itália, o governo de Renzi descartou medidas similares ao banimento do burquíni. “O modelo em França não parece estar a resultar,“ concluem os italianos.
Um milionário muçulmano nascido em França já pagou três multas a mulheres que usavam um burquíni. Rachid Nekkaz, que em 2010 renunciou à cidadania francesa, disse à imprensa britânica: “Sempre que a França não respeita as liberdades fundamentais, tiro o meu livro-de-cheques do bolso”.