Sonia Rykiel: uma pioneira nas malhas

A designer francesa que devolveu às mulheres a liberdade de movimentos morreu ontem, aos 86 anos

O cabelo ruivo, vibrante, espalhafatoso, saltava à vista na cabeça desta mulher que vestia sempre de preto. O preto, aliás, foi sempre a imagem de marca de Sonia Rykiel, tal como as malhas às riscas, essas sim coloridas, a rasgar o mar de preto de lhes servia sempre de fundo. A designer francesa morreu ontem, durante a noite, devido a complicações na sequência da doença de Parkinson – a “p de P”, como lhe chamava -, que lhe havia sido diagnosticada há 15 anos. Tinha 86 anos. A notícia foi confirmada pela própria filha, Nathalie, e lamentada pelos mais variados quadrantes. O presidente francês, François Hollande, sublinhou a forma como a designer devolveu às mulheres liberdade de movimentos. “Foi uma pioneira”, disse. O reconhecimento do Estado francês, no entanto, tinha chegado em 2009, quando recebeu a Ordem da Legião de Honra em reconhecimentos dos seus 40 anos ao serviço da indústria da moda francesa.

Filha de um relojoeiro romeno e de uma mãe russa, a moda não estava nos seus planos.

Sonia Rykiel fez sempre da mulher o centro das suas criações. Até porque foi a mulher, e as suas necessidades, que a levaram a começar a desenhar roupa. A francesa estava grávida do primeiro filho e não encontrava nada que lhe agradasse. Começou a tricotar algumas peças que pudessem albergar a sua barriga, mas que fossem visualmente interessantes, e, como o seu marido tinha uma loja de pronto-a-vestir, decidiu pôr ali à venda algumas das suas criações. “Queria usar roupas que me fizessem destacar das restantes mulheres”, disse a propósito do seu início de carreira. Foi ainda ali, sem nome, loja ou ateliê, que Sonia Rykiel conheceu o sucesso pela primeira vez, através de uma peça tão simples como uma camisola de malha, a poor boy sweater, uma camisola com corte cingido e curto e mangas longas, que se podia comprar em todas as cores. De repente, era esse o símbolo de uma Paris chique, mas boémia e despreocupada. A Paris, como deve ser. E o je ne sais quois parisiense que as suas criações pareciam simbolizar depressa conquistaram personalidades como Brigitte Bardot, Catherine Deneuve e Audrey Hepburn, que estiveram entre as primeiras clientes.

Em 1968 inaugurou a primeira loja, na Rive Gauche, local de referência para a moda em Paris. Foi, com Coco Chanel, sempre um símbolo de libertação para as mulheres. E a liberdade, para Sonia Rykiel, chegou quase sempre às riscas coloridas, padrão que mais apreciava.

Há 15 anos recebeu o pior dos diagnósticos: tinha Parkinson. “No início não me afetou muito. Não era possível perceber que eu estava doente só de olharem para mim, por isso tentei continuar durante algum tempo, sem contar a ninguém o que se passava”, disse ao jornal inglês, “The Guardian”. “Não disse a ninguém, nem mesmo à minha filha que já estava nos 40s. Mantive segredo porque foi o que o meu médico me aconselhou a fazer. Era uma forma suave da doença, por isso não valia pena contar, foi o que ele me disse. Mas quando estava sozinha sentia-me muito assustada porque a minha mãe contraiu a mesma doença quando tinha 70 anos e eu lembrava-me perfeitamente de a ver sofrer”, acrescentou, na mesma entrevista.

Em 2007, acabou por se afastar da liderança ativa da sua marca – entretanto nas mãos de Julie de Libran e da sua filha Nathalie – mas manteve-se sempre envolvida, como presidente honorária. Por essa altura lançou o livro “N’oubliez Pas Que Je Joue” no qual falava da doença, demonstrando porém que era possível encará-la com humor  – até morrer terá chamado à sua condição “a puta da Parkinson” ou a “p de P”.