Fernando Lima, antigo assessor do Presidente Cavaco Silva, queixa-se de ter sido mandado para o sótão, de castigo. O sótão onde esteve – e de que se queixa – foi exatamente o mesmo sítio onde trabalharam outros assessores do Presidente, homens que eram, ou se tornaram, professores universitários, médicos, advogados, ministros ou secretários de Estado. É por isso uma queixa sem razão, movida pelo despeito e pela vontade de vingança.
Este é o mote para o sempre polémico tema dos gabinetes do poder. Nenhum outro tema desperta tanta inveja. Não sei porquê, mas fala-se em ‘gabinetes’ e as pessoas pensam em Sodoma e Gomorra.
Ora, como se formam os gabinetes? E como funcionam?
O Presidente da República, o presidente da Assembleia da República, os ministros, os presidentes de Câmara, só para citar os mais óbvios e influentes, têm direito a constituir o seu Gabinete de apoio. Estes gabinetes estão previstos e regulados na lei. Cada qual tem a sua espécie de lei orgânica, que diz quantas pessoas lá podem trabalhar, que habilitações devem ter e qual a sua remuneração.
Dentro dos limites definidos pela respetiva lei, os altos responsáveis políticos escolhem a sua equipa. Vamos supor que a lei diz que uma equipa pode ter cinco pessoas licenciadas. Então, serão escolhidas cinco pessoas. E como?
Habitualmente, é um mix: os responsáveis políticos escolhem gente que já conhecem bem, procurando as características da confiança e da lealdade, em simultâneo com reputados especialistas nas respetivas áreas.
E como funcionam? O Gabinete de um político é uma coisa muito parecida com uma equipa de futebol. Pode funcionar bem, mal, pessimamente ou nem sequer funcionar… Constitui-se por um período de tempo limitado (um mandato, uma época), há egos em choque, há estrelas, divas, habilidosos e trabalhadores sem jeito, há os reis das fintas, os que dão cacetada, os queixinhas, e há ainda quem tenha padrinhos famosos, como no futebol há quem tenha empresários poderosos. Até há os que mandam recados para os jornais.
A razão de ser da semelhança entre um balneário e um Gabinete é simples de explicar: são pequenos grupos de pessoas, num ambiente bastante competitivo, sob intenso escrutínio mediático. Todos querem aparecer, todos querem marcar pontos.
Do ponto de vista do chefe, ele quer ter uma boa equipa, que funcione bem e que seja ganhadora. Do ponto de vista dos membros da equipa, todos querem brilhar. E nem sempre corre bem.
Voltando ao Fernando Lima, tinha duas possibilidades: ou virava costas (se se sentiu despeitado e desautorizado, mostrando ser corajoso e fiel aos seus princípios) ou ficava. Ficou. Vir agora queixar-se, tantos anos depois, fá-lo parecer oportunista e cobarde.
Tinha ainda uma terceira possibilidade: agarrava em tudo o que aprendeu em tantos anos de poder, e fazia como Nicolau Maquiavel quando escreveu O Príncipe. Mas lá está: não é Maquiavel quem quer, só quem pode.