Multa à Apple. O início de um conflito (com muitos zeros)

Bruxelas pediu 13 mil milhões à gigante norte-americana por benefícios ilegais dados pela Irlanda. Agora somam-se milhões em sanções tanto na Europa como nos EUA.

Uma multa histórica à Apple e uma onda de retaliações e ameaças quanto ao investimento. Este é o resumo da guerra entre EUA e UE que tem vindo a intensificar-se nas últimas semanas por causa dos esquemas de lucros não tributados das multinacionais.

 A verdade é que Bruxelas decidiu aplicar uma multa de 13 mil milhões de euros à Apple por impostos não cobrados entre 2003 e 2014 e, em resposta, recebeu por parte dos principais grupos empresariais americanos o aviso de que poderá haver represálias, nomeadamente no que respeita ao investimento. Já o Departamento do Tesouro norte-americano tinha alertado para os riscos que a decisão podia ter, uma vez que ameaça “o espírito de parceria económica” entre EUA e União Europeia.

“As ações da Comissão podem prejudicar os investimentos estrangeiros, o clima de negócios na Europa e o importante espírito de parceria entre os Estados Unidos e a União Europeia”, afirmou ainda o porta-voz do Departamento do Tesouro. O Departamento do Tesouro chamou também a atenção para o facto de os impostos retroativos por parte da Comissão serem, acima de tudo, “injustos, contrários aos princípios legais estabelecidos, [colocando] em causa as regras fiscais dos Estados–membros”.

Mas problemas ao nível do investimento não são a única consequência da posição de Bruxelas em relação à Apple. Além da pressão exercida por presidentes executivos de 185 empresas norte-americanas, há também uma verdadeira guerra de sanções entre EUA e UE. Enquanto Bruxelas prepara sanções também contra a McDonald’s, a Google e a Amazon, os EUA apontam a mira ao Deutsche Bank e à Volkswagen.

Ainda que a guerra de sanções entre EUA e UE não seja de agora, a verdade é que tem vindo a recrudescer desde que a multa da Apple foi anunciada e, acima de tudo, mal recebida do outro lado do Atlântico.

Se, por um lado, Bruxelas optou por aplicar ao gigante tecnológico uma multa que é considerada, desde o início, a mais alta alguma vez aplicada a um processo deste género na Europa, por outro, os EUA preparam-se para retaliar. A resposta dos EUA visa exigir o pagamento de 14 mil milhões de dólares (cerca de 12,5 mil milhões de euros) ao Deutsche Bank, e esta é, por sua vez, a mais alta multa aplicada a um banco estrangeiro nos EUA.

 

“Disparate” de Bruxelas A Apple e os EUA fizeram saber desde cedo que não concordam com a penalização que Bruxelas aplicou à empresa. De acordo com Tim Cook, presidente da Apple, a decisão de pedir à gigante norte-americana o pagamento à Irlanda de 13 mil milhões de euros serve, acima de tudo, “interesses políticos” e não passa de um “disparate”.

Até porque, para o CEO da Apple, é importante que as pessoas saibam que os dados relativos ao pagamento de impostos por parte da empresa nos diferentes territórios estão acessíveis a todos. “É muito fácil saber que impostos pagamos e quando os pagamos. Damos a conhecê-lo publicamente em todo o mundo e qualquer pessoa pode ter acesso a esses dados”, esclareceu, voltando a insistir na transparência da empresa e de todas as filiais. “Estamos na Irlanda há 37 anos, temos uma história de amor longa e estou confiante que o governo vai tomar a decisão certa, mantendo-se firme e ripostando”, adiantou ainda durante uma entrevista.

Em causa está o dinheiro que os países perderam por causa do esquema que a empresa usava e que passava por todas as vendas de equipamentos da marca na Europa serem registadas na Irlanda. Ou seja, as vendas que foram efetuadas nos diferentes Estados europeus não eram taxadas nesses mesmos países.

 

450 milhões da McDonald’s Com a multa aplicada à Apple a gerar polémica e discórdia, há mais uma empresa na mira. A empresa é a McDonald’s, que poderá vir a ser chamada brevemente a pagar cerca de 450 milhões de euros em impostos atrasados ao Luxemburgo.

As contas foram feitas pelo “Financial Times” depois de a União Europeia ter afirmado que a multinacional era suspeita de também ter beneficiado de um regime fiscal irregular neste país.

O valor que está a ser posto em cima da mesa é o que a empresa não pagou por ter benefícios fiscais que Bruxelas considera serem ilegais – isto porque, em vez de serem aplicadas taxas de 27% sobre os lucros, o Luxemburgo cobrava taxas de apenas 1,5%.

A situação é em tudo semelhante à da Apple, que se viu obrigada por Bruxelas a pagar uma soma milionária à Irlanda por impostos em atraso. Apenas muda a empresa e o país. No entanto, tal como a Apple, a cadeia de fast- -food nega ter tido um tratamento diferente.

A situação da McDonald’s está a ser investigada pela Comissão Europeia desde o final do ano passado, por suspeita de não pagar impostos nem na União Europeia nem nos Estados Unidos desde 2009.