Eduardo e Ana dobram uma pilha de roupa interior que vão tirando peça a peça do cesto azul. Esta é já a segunda máquina que fazem durante a tarde. “Tirámos o dia para isto.” O sotaque de Ana não esconde a origem brasileira, o que não é de estranhar quando estamos em Arroios, a freguesia mais multicultural de Lisboa.
Desta vez estão de visita, mas com olho numa estadia permanente. “Chegámos dia 8 de setembro e vamos ficar até ao fim de novembro, tem mesmo de se ir lavando roupa”, diz Eduardo, enquanto pega no casaco da Lacoste que lhe surge debaixo das meias. “Que maravilha, ainda está quentinho”, e veste-o antes de sair para enfrentar a chuva. São clientes habituais da lavandaria Cotton Club, no Intendente. A estadia num hotel já é suficientemente cara para que a isso se acrescentem os custos da lavagem da roupa. Aqui, por 12 euros, fizeram uma máquina de sete e outra de 14 quilos. “E nem precisa passar a ferro”, garante Ana, enquanto estica as camisolas com a mão de forma a aproveitar a temperatura ainda quente para que não ganhem vincos e possam ir diretamente para a gaveta.
A máquina ao lado vai ficando cheia com as tolhas brancas que António Alexandre vai enfiando ao acaso. “Imagino que trabalhe num hotel”, arriscamos. “Não, sou técnico de som”, responde, deixando-nos com ar ainda mais curioso perante aquele monte de algodão branco. “Mas tenho casas alugadas a erasmus”, explica, acabando assim com o mistério. “Compensa-me imenso, porque venho lavar e secar em grandes quantidades”, explica. “Além disso, aproveito para tomar café.” Isto porque este espaço da Rua Andrade está dividido entre máquinas de lavar e mesas em frente a um balcão de pastelaria e café. Anton Zhucov, de origem russa mas a viver em Portugal desde os 11 anos, vai servindo quem espera os habituais 30 minutos até que a roupa esteja pronta a seguir para casa.
Há três anos à frente do negócio, já consegue fazer a distinção da clientela por horas do dia e até por estações do ano. “De manhã tenho mais gente para tomar pequeno-almoço do que para lavar roupa; já ao fim do dia, as máquinas não param”, garante, contando já com uma maior afluência nos meses de inverno e primavera, habitualmente os mais chuvosos.
Essas são contas comuns a todos os donos de lavandarias self-service. Rui Cardoso sabe que esta primeira semana de chuva a dar início ao meses mais frios é a melhor altura para o negócio. Na loja que tem aberta em Sete Rios há três anos conta já com 500 clientes assíduos – os que têm cartão-cliente, uma forma de poupar dinheiro a cada lavagem. Já na mais recente, aberta em junho na Baixa de Lisboa, conta apenas com 15, mas consegue justificar a diferença. “Além de ser mais recente, aqui trabalho mais com turistas que acabam por usar a loja apenas durante uma curta estadia.” Já em Sete Rios, zona mais residencial e com vários hotéis e escritórios, a freguesia é mais constante. O suficiente até para que ao lado da Millevantagens tenha aberto também uma engomadoria. “Assim, o cliente sai de lá com o trabalho completo”, conta ao i.
Até há um mês, esta lavandaria da Rua dos Douradores ganhava o prémio de mais original da cidade, por dividir espaço com uma geladaria, muito usada para quem queria adoçar as horas de espera pelo fim da lavagem. O sócio de Rui terminou o negócio abruptamente, o que o obrigou a substituir os cones de chocolate e baunilha por produtos gourmet e tipicamente portugueses. Além de café e bolinhos, enche duas montras com compotas, vinhos, licores e enlatados, aproveitando a localização estratégica que lhe dá vista privilegiada para um vaivém de turistas.
O império das lavandarias
Foi a primeira a abrir em Lisboa e mantém-se, ainda hoje, como a cadeia com mais lojas abertas. A Lavamais está presente em 28 pontos estratégicos da capital e tem duas lojas abertas no Porto. “A escolha nunca é ao acaso”, garante João Amaral, sócio da rede de lavandarias. “Tem de ser um espaço de circulação a pé, com residentes, hotéis e turistas.” Daí que se encontrem lojas da cadeia em locais residenciais como o Lumiar ou em zonas de turismo e imigração como a Almirante Reis, que teve honras de primeira a abrir na cidade e de segunda em termos de faturação. “Campo de Ourique está em número um, aquele bairro é um fenómeno”, refere.
Para João, não há dúvida de que o serviço compensa. “Se o cliente fizer as contas ao detergente, amaciador, eletricidade e desgaste da máquina, vai ver que gasta mais dinheiro do que numa lavandaria deste género”, salienta. No entanto, acredita que mais que a poupança, o utilizador prefere este serviço pela comodidade e rapidez.
Juntando estas três motivações, enchemos o saco de roupa suja – tarefa fácil para quem vem de duas semanas de férias – e decidimos fintar a primeira chuva deste outono na lavandaria mais perto de casa. Aqui não há receção, café ou produtos gourmet, nem tão-pouco a pilha de revistas a que demos uma folheadela nas lojas vizinhas – e que, diga-se, iam desde a “Courrier Internacional” à “Nova Gente”. Mas há internet, o livro que trouxemos na mala, mesas e cadeiras, o suficiente para que a meia hora de lavagem e os 18 minutos de secagem passem num instante.
Quarenta e oito minutos e sete euros depois, saio com dúvidas sobre a poupança, mas cheia de certezas sobre o tempo de qualidade passado a ler ao som reconfortante de uma sala cheia de máquinas em movimento.