Um conflito bélico entre Portugal e Espanha parece-nos algo distante. Todos ouvimos falar na dinastia filipina, na Casa de Habsburgo, na Casa de Bourbon e na Guerra da Sucessão de Espanha. Mas sabia que o exército português chegou a ocupar Madrid nessa altura?
Para entender este episódio da história portuguesa e espanhola é necessário perceber como começou a Guerra da Sucessão, disputada entre 1701 e 1714. O príncipe das Áustrias, José Fernando da Baviera, foi o escolhido para suceder ao seu tio-avô, o rei Carlos ii de Espanha, que morreu sem deixar herdeiros. No entanto, o jovem príncipe tinha uma saúde frágil e acabou por falecer aos seis anos de idade. Este óbito levou Filipe v, neto de Luís xiv de França, a ser a figura ponderada para ocupar o trono espanhol.
Os Bourbon iriam, assim, liderar dois dos Estados mais poderosos da Europa – França e Espanha. As restantes potências receavam as consequências deste vínculo. O imperador romano-germânico Leopoldo i, parente de Carlos ii, decide tentar romper esta união dinástica e afirma ser o detentor do direito ao trono. Tem assim início a Guerra da Sucessão de Espanha.
As forças inglesas, portuguesas e germânicas unem-se contra os Bourbon. Portugal já tinha reconhecido Filipe v de Espanha mas, perante a pressão dos ingleses, com quem o nosso país mantinha relações muito próximas, D. Pedro ii de Portugal viu-se obrigado a repensar a sua posição, anulando assim, em 1702, o tratado “pelo qual Portugal se comprometia a guardar os direitos da França, com a promessa de um auxílio militar em caso de ameaça”, lê-se na “História de Portugal” de Veríssimo Serrão. Assim, o reino português une-se às forças opositoras, reconhece o arquiduque Carlos, filho de Leopoldo i, como rei de Espanha, e entra na guerra.
Entrada em Espanha A importância de Portugal neste confronto deveu-se principalmente ao seu posicionamento geográfico: o nosso país torna-se a base de operações dos aliados.
Ciudad Rodrigo foi o local escolhido para atacar, mas esta campanha ficou sem efeito e as forças militares regressaram a território português sem qualquer conquista. O início das hostilidades começou da pior maneira para Portugal e os seus aliados.
Uma das principais figuras da ofensiva portuguesa foi António Luís de Sousa, marquês das Minas. Este homem “vai reocupar diversas localidades da Beira Baixa, entre as quais Castelo Branco, que as tropas espanholas tinham ocupado pouco depois da entrada de Portugal no conflito”, lê-se na entrada sobre o marquês das Minas, redigida pelo historiador Fernando Castelo Branco, no “Dicionário de História de Portugal”.
Foi graças à liderança deste homem que, a 28 de junho de 1706, as forças aliadas acabaram por entrar em Madrid e ocupá-la durante 40 dias, fazendo ali proclamar rei o arquiduque Carlos, por quem os aliados combatiam.
Como explica João Vieira Borges no seu livro “Conquista de Madrid – 1706”, ao fim de 500 quilómetros percorridos, ao longo de três meses, por mais de 14 mil portugueses e 4200 anglo-holandeses, as tropas comandadas pelo marquês das Minas penetraram na grande cidade espanhola e fizeram mais de 8 mil prisioneiros após os confrontos com as forças franco-espanholas. O trono espanhol ficou, assim, à mercê do pretendente austríaco.
“Mas o brilhante êxito do marquês das Minas vai ser aniquilado em breve, em parte devido à reação do povo espanhol, que fez aclamar o outro pretendente, Filipe de Anjou, em Salamanca e noutras cidades, como rei de Espanha”, explica Fernando Castelo Branco. Este reconhecimento do pretendente francês veio dificultar as comunicações entre Portugal e o exército português. “Em breve o marquês das Minas se vê obrigado a abandonar a capital espanhola, sendo pouco tempo depois expulsa a pequena guarnição que aí deixara”, refere o historiador.
A verdade é que esta incursão pouco influenciou o desfecho desta guerra: Filipe de Anjou continuou a ser rei de Espanha, mas foi obrigado a ceder à Grã-Bretanha a ilha de Menorca, nas Baleares, bem como o rochedo de Gibraltar, e aos Habsburgos os Países Baixos espanhóis. Quanto a Portugal, pouco ou nada retirou deste confronto, acabando por assinar tratados de paz com França e Espanha em 1713 (1.o Tratado de Utreque) e 1715 (2.o Tratado de Utreque), respetivamente.