Emails desmentem versão do ministro da Educação

Tiago Brandão Rodrigues disse esta semana que “em nenhum momento” impediu a exoneração de Nuno Félix e que terá sido João Wengorovius Meneses a escolher a sua equipa.  Na prática não foi isso que aconteceu.

O ministro da Educação tinha conhecimento dos problemas que envolviam Nuno Félix – com quem mantinha relações pessoais – na gestão e funcionamento do gabinete da secretaria de Estado da Juventude e Desporto. 

Ao contrário do que afirmou, esta terça-feira em direto na SIC, Tiago Brandão Rodrigues tentou intervir ativamente na equipa do ex-secretário de Estado, João Wengorovius Meneses. Foram várias as vezes que o ministro, oralmente e na presença de várias pessoas do gabinete, terá exigido a João Meneses como sinal de confiança política que exonerasse a sua adjunta sem qualquer fundamento aparente.

Foi também o ministro que terá escolhido Nuno Félix – que João Meneses até aí não conhecia – para chefe de gabinete da secretaria de Estado da Juventude e Desporto e que travou a sua exoneração (que a dado momento passou a ser considerada essencial pelo ex-secretário de Estado). 

Além das tentativas de interferir na equipa, Tiago Brandão Rodrigues desautorizava o trabalho de João Meneses.

O ex-secretário de Estado tinha até de pedir autorização prévia ao ministro para se reunir com qualquer entidade da tutela da juventude e desporto ou para marcar presença em eventos. Estas autorizações do ministro chegavam muitas vezes, sabe o i, três semanas após o pedido de João Meneses.

A documentação que contraria o ministro Nos últimos dias houve várias versões contraditórias mas, o i sabe que são vários os emails que revelam que o ministro estava a par de tudo o que acontecia no gabinete de João Wengorovius Meneses. 

Ao longo de meses, a troca de mensagens entre João Meneses e Tiago Brandão Rodrigues relatou várias falhas do ex-chefe de gabinete, tal como as suas férias não aprovadas oficialmente e ainda a falta de confiança política em Nuno Félix. 

Primeiras queixas Antes da troca de emails, o i sabe João Meneses abordou verbalmente Tiago Brandão Rodrigues a dar conta de que queria exonerar Nuno Félix pela sua falta de preparação para o cargo, pela falta de confiança e pela falta de lealdade política. Havia problemas claros, mas isso nunca fez com que  Nuno Félix perdesse a confiança do ministro – reuniam várias vezes ao dia durante horas sozinhos. 

Enquanto isso ficavam para trás as tarefas que são da competência de um chefe de gabinete: não preparava nem informava devidamente o seu secretário de Estado para a participação em eventos, aos quais este ia em representação do Estado.

Fontes do ministério revelaram ao i que foram muitas as vezes em que João Meneses acabou por ser surpreendido já nos eventos com a sua participação em conferências de imprensa, por exemplo, sem que tivesse prévio conhecimento. 

Primeiro email da exoneração O primeiro email enviado por João Meneses a Tiago Brandão Rodrigues a pedir a exoneração de Nuno Félix foi enviado já nos últimos dias de março. O ex-secretário de Estado estava decidido e queria informar formalmente o ministro que iria proceder à exoneração de Nuno Félix tendo até indicado a sua escolha para a substituição. Do ministro não terá obtido qualquer resposta.

Meneses insiste na Saída Com a ausência de resposta por parte de Tiago Brandão Rodrigues, João Meneses insiste na exoneração de Nuno Félix e envia novo email ao ministro, no início de abril. Aqui o ex-secretário de Estado diz a Tiago Brandão Rodrigues que tinha de resolver o problema porque precisava de um chefe de gabinete em funções, para não paralisar a secretaria de Estado. Nesta altura, já João Meneses tinha preparado os despachos de exoneração e de nomeação, para a devida substituição. 

Nuno Félix toma conhecimento da situação – alegadamente por outra via que não o ex-secretário de Estado – e pediu uma última conversa com João Meneses. Na cabeça de João Meneses nada mudou e de seguida  o ex-chefe de gabinete pôs uma semana de férias – sem a devida aprovação formal, a que se seguiu uma baixa de assistência e apoio à família, durante 15 dias. O processo teve de parar, apesar da irregularidade da ausência.

Email que trava a saída de Félix Com a ausência de Nuno Félix, o ex-secretário de Estado envia novo email ao ministro a pedir para que se resolva a substituição de chefe de gabinete, havendo o risco de tornar insustentável o funcionamento da secretaria de Estado, que arriscaria ficar sem chefe de gabinete quase um mês. Nessa mensagem João Meneses mostrara-se disponível para esperar os 15 dias da baixa de Nuno Félix para proceder, posteriormente, à nomeação. E é aí que terá recebido uma resposta do ministro a impedi-lo de avançar para a exoneração. Fontes do ministério contaram ao i que Tiago Brandão Rodrigues terá argumentado que a mulher do ex-chefe de gabinete estava numa situação de saúde complicada e afirmado que não compreendia o tratamento que estava a ser dado ao seu amigo de longa data. 

Saída de João Meneses e as falsas licenciaturas Esta posição, sabe o i, foi a gota de água para a saída de João Meneses que estava descontente com todo o funcionamento do ministério e com as restrições colocadas ao seu trabalho. 

Sobre o caso das falsas licenciaturas de Nuno Félix, o ex-governante só teve conhecimento poucos dias antes de bater com a porta, não tendo sido essa a única razão da sua saída.

A saída oficial de João Meneses foi a 13 de abril mas ficou acordada dias antes. Fontes do ministério contam também que assim que João Meneses comunicou a sua saída – Nuno Félix que ainda estava no período de baixa por assistência à família – regressou de imediato ao ministério para trabalhar.           

O que diz agora o ministro Confrontado com este caso, o ministro da Educação tem dado uma versão diferente. Questionado na entrevista da terça-feira, Tiago Brandão Rodrigues garantiu: “Em nenhum momento eu pedi a João Meneses que não exonerasse o seu chefe de gabinete”. 

Mais. O ministro assegurou que “todos os governantes têm a possibilidade real de trabalhar nas suas equipas e de fazerem tudo aquilo que querem”. Brandão Rodrigues frisou que terá sido João Meneses a constituir “a sua equipa como quis” e que durante o seu mandato, o ex-secretário de Estado “teve conhecimento de factos” que alegadamente ele próprio não conhecera, atirando assim a responsabilidade de toda e qualquer inação para o ex-secretário de Estado: “Teve a oportunidade de fazer com eles aquilo que quis”.

Sobre os problemas no gabinete da Juventude e Desporto, Tiago Brandão Rodrigues garantiu que não tem “nenhum tipo de ingerências no trabalho de outros governantes, incluindo os que trabalham [consigo]”. No entanto, assume: “Sou ministro da Educação e a direção impõe as prioridades”.

No que respeita às falsas licenciaturas, o governante diz que “não sabia que havia nenhum tipo de erro” no despacho de nomeação de Nuno Félix. O ministro acrescentou ainda que separa o caso em duas dimensões: “Havia um facto real, que era um despacho conter inverdades, que é condenável por todos” e que já trouxe “consequências, que foi a demissão da pessoa que ainda trabalhava no ministério”. A segunda dimensão é a política: “Só existia pelo facto de poder conhecer essas inverdades, e a partir do momento em que digo que não conhecia o facto político deixa de existir”.

Confrontado ontem pelo i, o Ministério da Educação diz apenas que “já foram prestados esclarecimentos sobre esta matéria”.