A uma semana das eleições norte-americanas, o mais próximo que no mundo das sondagens se chega de adivinhar um vencedor é dizer que Hillary Clinton tem muitas mais chances de vencer a presidência do que Donald Trump mas que a probabilidade de uma vitória republicana não é de todo remota. Dizê-lo desta maneira não é apenas cautela. É verdade que Clinton tem ainda mais de três pontos percentuais de vantagem sobre Donald Trump e um mapa eleitoral muito mais fácil. Se esta fosse uma corrida tradicional, como a de Barack Obama e Mitt Romney, por exemplo, em que por esta altura o presidente ganhava por dois pontos, muitos estariam dispostos a apostar numa vitória certa de Clinton. Mas esta não é uma eleição como as outras.
Poucas eleições foram tão voláteis como as deste ano. Há um mês, por exemplo, os principais agregadores de sondagens norte-americanos davam a Clinton cerca de 90% de probabilidades de vencer. Trump parecia por esses dias ferido de morte pelo vídeo em que aparecia dizendo que agarrava as mulheres pelos genitais e as beijava sem o seu consentimento. A média de sondagens a nível nacional – historicamente muito mais correta do que contagens individuais – dava uma vantagem de cerca de sete pontos à candidata democrata, que decidiu por esses dias começar a fazer campanha pelos candidatos do seu partido ao Senado e à Casa dos Representantes, tentando acabar com maioria republicana nas duas câmaras.
Mas Clinton deslizou dramaticamente nas sondagens pela terceira vez desde que os dois grandes candidatos foram escolhidos. A queda começou ainda antes de o FBI ter anunciado com um estrondo que tinha encontrado algumas dezenas de milhares de emails do tempo em que Clinton era secretária de Estado. E ontem ainda não tinha parado. Os emails podem não dizer nada de novo sobre se a candidata democrata lidou com informação confidencial no seu servidor privado, mas jogam no sentido da narrativa dos republicanos, segundo quem Clinton tem muito a esconder e não é de confiança. De uma vantagem de sete pontos na média do portal fivethirtyeight, Clinton caiu para uma vantagem de 3,2 pontos, segundo os dados disponíveis à hora de fecho.
Fórmula trump Razões para alarme na campanha de Hillary Clinton? Depende, segundo argumenta Nate Silver, o fundador do portal fivethirtyeight – e o mais próximo que o mundo tem de um druida das sondagens. “Trump continua a ser o elo mais fraco, mas deixou de ser uma hipótese remota”, escreve Silver, argumentando que basta uma soma de certos erros e azares de Clinton para que a presidência caia para o ululante magnata nova-iorquino. Tudo depende da vantagem que a democrata levar para o dia das eleições e se é suficientemente grande para suportar um erro modesto nas sondagens, ao estilo do que aconteceu no Reino Unido com o Brexit. “Na verdade, tudo depende do quanto é que as sondagens se vão aproximar. Mais um pouco e deixamos de estar no campo do ‘ela só pode perder se houver um erro catastrófico nas sondagens.’”
E a hipótese de um erro ligeiro está em cima da mesa, dado o número de eleitores ainda indecisos e o facto de que tanto Trump como Clinton desafiam os modelos tradicionais de democratas e republicanos. Se Clinton levar uma vantagem de três ou mais pontos para o dia das eleições, o mais provável é vencê-las. Se estiver dois ou menos à frente, então o jogo fica ao alcance de Trump. A ele basta-lhe vencer Florida, Colorado e New Hampshire, onde os dois estão praticamente empatados e somá-los a apenas um dos três estados em que Clinton é uma frágil favorita – a saber: Wisconsin, Michigan e Pensilvânia. Isto, claro, não cedendo nenhum dos estados em que ele próprio é um frágil favorito – here’s looking at you, North Carolina.
De novo à base Da campanha de Hillary Clinton, porém, não surgem sinais de pânico. Alguns observadores sugerem que os seus números internos são simplesmente mais otimistas do que os que são publicados a nível nacional – é normal os dois grandes candidatos terem melhores sondagens do que os jornais e televisões, apertados de finanças; algo que é especialmente verdade no campo democrata, que este ano investiu dezenas de milhões de dólares numa máquina bem oleada de estatística. Para além disso, nos aliados de Clinton parece dominar a ideia de que a narrativa já se afastou dos seus emails e está agora centrada nas críticas ao diretor do FBI, James Comey, que ignorou as indicações do Departamento de Justiça ao anunciar vagamente a descoberta de novo material que pode ser inofensivo. E o campo dos críticos só se tornou mais forte com a voz do presidente.
“Não operamos com informação incompleta. Não operamos com fugas de informação. Operamos com base em decisões concretas que tomamos ”, lançou ontem Barack Obama, numa entrevista em que não chegou a dizer o nome do diretor do FBI, mas em que também não deixou muita margem de interpretação. “Quando este caso foi antes investigado rigorosamente, as conclusões do FBI, do Departamento de Estado e de uma série de investigações no Congresso foram as de que ela cometeu alguns erros mas não havia nada que servisse como base de uma acusação”, acrescentou, deixando a ideia de que estará mais presente em campanha à medida que a corrida se aproxima do fim. “Não estaria a apoiá-la se não tivesse a confiança absoluta na sua integridade.”