“Uma cortina não é isolamento.” A frase é do bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, sobre a informação veiculada ontem pelo Hospital Garcia de Orta, que adiantou que uma cortina é suficiente para isolar doentes infetados com bactérias multirresistentes como E. coli e Klebsiella de outros não infetados. A Direção-Geral da Saúde (DGS) esteve durante o dia de ontem nas instalações do hospital de Almada para analisar a falta de isolamento de doentes com bactérias multirresistentes como a E. coli e a Klebsiella, revelada pelo i. E nas conclusões confirma que só existem cinco quartos de isolamento, estando a ser construídos outros quatro, “o que, na perspetiva da direção clínica, é manifestamente insuficiente”: “Seriam necessários mais cinco quartos de isolamento.”
A visita foi feita ontem sem aviso prévio entre as 11h e as 14h45, depois da notícia do i de que há doentes infetados com E. coli e Klebsiella em quartos ocupados por doentes não infetados.
O que se confirma. Apesar de dizer que encontrou evidências de que os doentes não infetados não possuem “informação de como se protegerem da transmissão de infeção”, a DGS diz que a notícia do i não se confirma. Ou seja, na prática, o que se diz é que as condições não são as ideais para o controlo de infeções, mas as possíveis: “Tanto quanto as condições físicas do hospital permitem, são cumpridas as regras determinadas pelo Programa de Prevenção e Controlo de Infeção e Resistência aos Antimicrobianos, em matéria de isolamento de doentes infetados.”
Mas não é o que defendem diversos especialistas, fontes daquele hospital e o bastonário da Ordem dos Médicos. José Manuel Silva explica ao i: “Podem dizer que é um remendo, mas um isolamento não é. É por causa dos défices de isolamento, de limpeza e de higiene que temos as taxas de infeções que temos.”
Segundo uma análise feita pela Ordem dos Médicos, o país conseguiria uma poupança anual de 153 milhões de euros se reduzisse a metade as infeções hospitalares. Isto porque o custo estimado com infeções por ano é de 306 milhões – 6% do orçamento dos hospitais.
O caso O i noticiou na edição de ontem que naquele hospital há doentes infetados com bactérias multirresistentes como a E. coli e a Klebsiella – a que se soma a Morganella morganii – que estão nas mesmas salas que doentes que não estão infetados. No hospital houve ainda casos de infetados que partilharam quartos, o de recobro do serviço Medicina IV (Ginecologia Oncológica), por exemplo, com pacientes que foram submetidos a cirurgias, estando, por isso, ainda mais debilitados.
Segundo diversas fontes médicas revelaram ao i, no domingo havia doentes que, de acordo com as normas internacionais, deveriam estar isolados em salas diferentes, mas que estavam em quartos de três camas apenas separados da cama do lado por uma cortina de pano. As visitas entravam e saíam sem estarem equipadas.
Confrontado no domingo com este cenário, o bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, considerou tratar-se de uma situação “inaceitável” que precisava de ser esclarecida pelo hospital.
Além disso, alguns especialistas também explicaram que o isolamento para pessoas com infeções graves como estas pode passar por haver um distanciamento dos outros doentes de pelo menos uma cama de intervalo, ou mesmo não ter mais ninguém no quarto.
No Garcia de Orta, nem uma coisa nem outra. A única barreira que separa infetados de não infetados é uma cortina.
Em reação à notícia do i, o presidente do conselho de administração do Garcia de Orta, Daniel Ferro, reiterou que se cumprem as medidas que “tecnicamente e clinicamente são adequadas”, adiantando que todos os doentes “têm medidas adequadas instituídas e que as mesmas são cumpridas”. Disse ainda que “é interesse do ministro da Saúde e do hospital” que a situação seja esclarecida.
Já Margarida Coelho, presidente da Comissão de Controlo de Infeções, admitiu que no serviço Medicina IV existem alguns doentes infetados que exigem apenas “isolamento de contacto”, defendendo que para isso uma “cortina de pano” é suficiente.