Há dez dias atrás Hillary Clinton certamente não imaginaria outra pessoa, que não ela própria ou Barack Obama, a receber a visita de Shinzo Abe, líder do executivo do Japão, aos EUA. Mas a dura realidade da derrota eleitoral decretou que será o seu adversário de campanha, Donald Trump, a fazer o papel de anfitrião do primeiro-ministro japonês, esta quinta-feira, em Nova Iorque, em escala antes de uma viagem para o Perú.
Naquela que foi a sua primeira aparição pública desde que proferiu o discurso de reconhecimento da vitória do candidato republicano, no dia 9 de novembro, Hillary confessou que houve momentos, durante a semana que passou, em que só queria “enroscar-se com um bom livro ou com os (…) cães e nunca mais voltar a sair de casa”.
A ex-secretária de Estado marcou presença num evento de caridade, na quarta-feira à noite (madrugada de quinta em Portugal), em Washington, e fez questão de se mostrar disposta a continuar o trabalho desenvolvido, na luta pelos “valores” americanos, mesmo considerando as divisões “trazidas” e “aprofundadas” pela eleição.
“Sei que durante a última semana muitas pessoas se questionaram sobre se a América ainda é o país que pensavam conhecer. Ainda que possa parecer improvável, existe um terreno de comunhão, no qual se pode construir. Acreditem no nosso país, lutem pelos nossos valores e nunca desistam”, foi a principal mensagem deixada pelo Hillary, citada pelo “Washington Post”, num discurso emotivo, sem fazer qualquer referência ao nome de Trump.
Ora o presidente eleito irá receber, na Trump Tower, o chefe do governo japonês, inaugurando o seu reportório diplomático, aproveitando a ocasião para sacudir a onda de críticas, levantada nos últimos dias, sobre as aparentes dificuldades em definir a equipa de transição e distribuir as principais pastas da sua nova administração.
A marcação do encontro entre Trump e Abe causou estranheza junto do departamento de Estado norte-americano, uma vez que, nestes casos, é prática habitual a realização de reuniões preparatórias, entre os responsáveis pela política externa da equipa de transição e os funcionários ainda em funções, algo que não aconteceu. A diretora de campanha de Trump, Kellyanne Conway, justificou a ausência dos habituais procedimentos com o caráter “informal” da reunião e referiu que o magnata respeita a administração ainda em funções e não fará qualquer “acordo diplomático”.
Durante a campanha, Trump sugeriu que os EUA estavam a gastar demasiado dinheiro na defesa do Japão e da Coreia do Sul, declarações que não deixaram os responsáveis japoneses nada descansados e que, certamente, serão discutidas em Nova Iorque.