Enquanto se espera que as equipas de investigação analisem as caixas negras do avião RJ85 e apresentem as suas conclusões sobre as causas do acidente que matou 71 pessoas – a maioria futebolistas da equipa brasileira da Chapecoense -, na noite de terça-feira, na região colombiana de Rionegro, as autoridades dos países envolvidos na tragédia vão revelando alguns pormenores que podem ser decisivos na resolução do enigma. Da Colômbia confirma-se que a aeronave ficou sem combustível e da Bolívia revela-se que o piloto foi advertido, antes da descolagem, para a inadequação da capacidade de autonomia do aparelho, mas que optou por prosseguir com o plano de voo.
O avião da empresa venezuelana Lamia, com matrícula LMI2933, abriu as portas à comitiva da equipa de futebol profissional, no aeroporto internacional de Viru Viru, em Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia e tinha como destino a cidade colombiana de Medellín, onde estava tudo a postos para a primeira mão da final da Taça Sul-Americana de futebol, disputada entre o Atlético Nacional e Chapecoense. Como é prática obrigatória, foi apresentado pela companhia aérea um plano pormenorizado do voo à agência de aviação competente, neste caso a boliviana. Um plano que causou preocupação imediata.
Segundo o jornal local “El Deber”, Celia Castedo Monasterio, responsável pela revisão do documento, apontou cinco falhas no plano e comunicou-as prontamente a Miguel Quiroga, o piloto do aparelho, ainda em solo boliviano. A principal preocupação da funcionária da aviação civil tinha que ver com o facto de aquele modelo de avião ter uma autonomia máxima de 3 mil quilómetros. Tendo em conta que a distância até ao aeroporto José María Córdova, em Rionegro, era de 2985 km, era óbvio para Monasterio que o LMI2933 precisava de abastecer algures a meio da viagem. “Não, senhora Celia, esta autonomia parece-nos bem. Faremos o voo em menos tempo, não se preocupe”, terá respondido Quiroga.
A verdade é que o avião despenhou-se a escassos 30 km do seu destino e sabe-se que ficou mesmo sem combustível. Poucas horas depois de divulgada uma gravação com o último diálogo entre a torre de controlo do aeroporto de Rionegro e o piloto do avião – na qual se ouve aquele solicitar permissão para aterrar de emergência – a Aviação Civil da Colômbia confirmou as principais suspeitas e revelou a abertura de um inquérito para determinar o motivo da falta de combustível
Do lado da companhia aérea, os sinais são contraditórios. Não sobre a questão da autonomia, mas sobre o plano de voo. Citado pelo jornal colombiano “El Espectador”, Gustavo Vargas, representante da Lamia, revelou que tinha ficado acordado que o aparelho iria fazer escala em Bogotá, na capital da Colômbia, para que pudesse abastecer. “O piloto é que tomou a decisão de não descer [para abastecer o depósito], porque pensou que o combustível chegava”, explicou Vargas, negando responsabilidade da empresa na decisão.
Como consequência do desastre, foram abertas investigações no Brasil, Colômbia e Bolívia, para apurar as responsabilidades. Neste último, foram mesmo suspensos dois funcionários de topo do organismo responsável pela administração dos aeroportos e da Direção Geral de Aviação Civil. Uma medida que foi justificada pelo ministério das Obras Públicas de La Paz, para “não contaminar a recolha das provas”.
Das 77 pessoas a bordo do avião, apenas seis sobreviveram.