Na Alemanha gostam de nomes grandes, compostos. Hoffenheim é uma cidade do distrito de Rhein-Neckar-Kreis no noroeste da província de Baden-Württemberg. Tem um clube de futebol que está na moda: Turn-und Sportgemeinschaft 1899 Hoffenheim. Sim, eu sei, é de provocar câimbras na língua, mas eles são assim mesmo e ninguém os irá mudar.
Facilitemos: simplesmente Hoffenheim. Quarto classificado da Bundesliga, com menos 2 pontos do que o Hertha de Berlim e a cinco do eterno campeão, Bayern de Munique. Do líder, RB Leipzig – também ele uma curiosa surpresa – falámos nestas páginas há umas semanas. Hoje é a vez do Hoffenheim.
Julien Nagelsmann é o principal obreiro desta surpresa, sendo ele próprio uma novidade, no estrito sentido do termo. Aos 29 anos pode dizer-se que é um fenómeno. E não, não é ponta-de-lança ou defesa-central: é o treinador! Como jogador acabou cedo, muito cedo, ainda como júnior, devido a uma teimosa lesão num joelho. Estudou. Primeiro Administração de Empresas, depois Ciências do Desporto. Em seguida passou pelo Augsburgo, equipa pela qual jogou nos juniores. E teve a oportunidade de trabalhar com outro dos nomes em voga no actual futebol alemão: Thomas Tucher. Na época de 2012/13 assumiu o cargo de treinador-adjunto do Hoffenheim. Tim Wiese, o técnico principal, brincava com ele chamando-lhe “Mini Mourinho”. A alcunha verdadeiramente não pegou.
No passado mês de Fevereiro, Nagelsmann Huub Stevens, de nome completo Hubertus Jozef Margaretha Stevens, técnico holandês que passou por clubes como o PSV Eindhoven, Hamburgo, Shalke 04 ou Estugarda, resolveu pôr um fim à carreira por questões de saúde. Julien foi promovido. Tornou-se o mais jovem treinador da história da Bundesliga.
Mr. 50% Para já, com 29 jogos à frente da equipa, Nagelsmann tem a boa média de 48.28% de vitórias: 14 em 29. No final da época passada o Hoffenheim terminou como 6º classificado da tabela geral. As ambições continuam a não ir muito para além disso, mas há que aproveitar a onda positiva que dá ao pequeno clube uma visibilidade fora do comum.
De facto, o Hoffenheim não faz parte daquilo que se poderia chamar o Gotha do futebol germânico. Ainda não há muitempo lutava pela vida na II Divisão. Em 2008, ano do regresso à companhia dos grandes, deu-se a reviravolta. Deixou o velho Dietmar-Hopp Stadium, que leva o nome do primeiro grande impulsionador do clube, tirando-o das competições amadoras, com capacidade para pouco mais de 5 mil espectadores e passou para o moderno Rhein-Neckar-Arena com mais de 30 mil lugares. Não foi apenas uma mudança de campo de jogos. Foi uma mudança de estatuto. A época de 2007/08 foi a primeira do Hoffenheim autenticamente profissional. O crescimento está à vista.
Nomes mais sonantes, como os de Salihovic, Demba Ba ou Obasi passaram a fazer parte de um plantel antigamente pobre. Em 2011, foram mesmo protagonistas da venda do brasileiro Luiz Gustavo para o Bayern de Munique pela verba de 17 milhões de euros. Nunca tanto dinheiro correra no pequeno clube.
Proeza A mais recente proeza do Hoffenheim foi o empate conquistado na Allienz-Arena de Munique onde os que lá passam correm sérios riscos de ser atropelados. Aguentou-se a equipa de Nagelsmann. É aliás uma das suas características: praticar um futebol sedutoramente ofensivo sem perder o equlíbrio nas acções defensivas. Mérito do jovem treinador que começa a atrair as atenções de muita gente e ao qual se augura um enorme futuro.
Do futuro para o passado. O Hoffenhiem nasceu em 1945, após o final da II Grande Guerra, pela fusão do Turneverein Hoffenheim, clube que se dedicava por inteiro à ginástica, com o Fussbalverein Hoffenheim. Na década de 90 deste novo século, ainda vegetava na 8ª Divisão da Liga da Baden-Württemberg. Nada de muito significativo, como se imagina. Foi já nos anos-2000 que o multimilionário alemão, Dietmar Hopp, um dos fundadores da SAP, empresa de “software”, resolveu apostar algum do seu dinheiro no clube. Os resultados foram quase imediatos. Em breve o Hoffenheim estava na IV Divisão da Oberliga da Baden-Württemberg e, uma época depois, na Regionaliga Sud, que corresponde à III Divisão. O meteoro estava disparado e não abrandou a velocidade perantes desafios mais duros. O objectivo Bundesliga era claro. E foi conquistado pela mão do treinador Alfred Schön. De 2011 para cá, houve uma dança estranha de responsáveis técnicos: Ralf Rangnik – que assumiu o cargo quando Schön subiu a manager – ; Marco Pezzaiuoli; Holger Stanislawski; Markus Babbel; Frank Krammer; Marko Kurz – que durou apenas três meses -; Markus Gisdol e os já falados Huub Stevens e Julien Nagelsmann. Há que aposte que este último também não durará muito. Mas por boas razões: outros vôos chamarão por ele se o trabalho continuar a dar frutos como uma nespereira no final do Inverno.
Passar os olhos pelo plantel do Hoffenheim não traz grandes surpresas. Oliver Baumann (guarda-redes), Eugen Polanski (médio polaco, capitão de equipa), Eduardo Vargas (avançado chileno), os internacionais suíços Pirmin Schwegler e Stefen Zuber, o húngaro Adam Szalai. Não se pode dizer que sejam estrelas cintilantes, mas isso não parece incomodar os poucos adeptos que têm seguido o seu clube fervorosamente.
Quando em casa, a canção mais ouvida é Engel, dos Rammstein. Anjo, em português. E o grande trabalho da administração comandada Jochen Rotthaus, passa agora por preencher o vácuo de tradição futebolistica de uma cidadezinha de pouco mais de três mil habitantes. Nada de inédito nessa Imperial Alemanha do Dr. Topsius d’”A Relíquia”. Afinal há outros clubes com sucesso e que não têm bases populares. Vejam o Wolfsburgo ou o Bayer Leverkusen, nascidos no seio de grandes multinacionais. Ou o mais recente Red Bull Leipzig – esse não só quase não tem adeptos como é odiado pelos adeptos dos outros.