Ainda recentemente, a propósito da sua canonização, o B.I. publicou um longo artigo acerca de Madre Teresa de Calcutá, para uma larga maioria considerada uma mulher bondosa que dedicou toda a sua vida a ajudar os mais necessitados, mas que foi para outros uma impostora. A morte de Fidel Castro provocou uma discussão, de alguma forma, semelhante. Pode o mesmo homem ser o carrasco de uma nação, cuja morte milhares festejam, e o salvador dessa mesma nação, que outros tantos milhares choram?
Pode um país liderado por um ditador promover a escolaridade – contrariando todas as teorias de que povos iletrados
e menos cultos são mais facilmente manipuláveis? Pode um ditador promover as artes plásticas, a música, o cinema e a dança, fazendo do seu país uma espécie
de paraíso para a arte e para a cultura? E reconhecer a influência de Fidel Castro nestes aspetos implica ignorar os milhares de mortos e presos políticos que resultaram da sua liderança, uma liderança que obrigou outros tantos milhares a fugirem
do seu próprio país, muitas vezes perdendo a vida na travessia? Ou é ignorar o facto
de que Fidel Castro se prolongou no poder como se dele fosse único e total proprietário ou que o seu regime enviou milhares de homossexuais para campos
de reeducação?
Não, não é. Pelo menos não para mim. Como o ex-presidente da República Jorge Sampaio comentou a propósito da sua morte: “Fidel Castro era isto. As pessoas não podiam ignorar a ditadura, mas aquela figura era de uma grande simpatia.” Não entendo aqueles que procuram branquear o facto de Fidel Castro ter sido um ditador
– e se restam dúvidas basta recorrer à definição no dicionário. Mas também não consigo ignorar o que de bom deixa como sua herança – como o facto de, de acordo com as Nações Unidas, ter eliminado o analfabetismo em 1961.