«Feliz Natal»

Este grafito, em Telheiras, perto do estádio do Sporting, tem vários anos, pelo que perdeu já qualidade visual. Porém, aproximando-se o dia de Natal, não poderia ignorá-lo, pelo que, esta semana, ajudar-me-á a abordar este tema.

Com o autor desta pintura, desejo a todos: «Feliz Natal»! E espero, sinceramente, que o Natal seja vivido na sua plenitude, no seu verdadeiro significado.

Mesmo sabendo que, para muitas pessoas, o Natal não passa de mais uma data, igual a tantas outras, penso que não podemos esquecer que o Natal é uma celebração cristã, que comemora o nascimento de Jesus. Celebrar esta data, não sendo católico, é quase como celebrar a Páscoa só pelos ovos de chocolate, o «Hanukkah» apenas pela beleza da luz das velas, o 25 de Abril simplesmente por ser um motivo para não trabalhar, ou a passagem do ano novo chinês, somente porque os signos chineses até podem vir a trazer-nos sorte…

Como diz Carlos Queiroz Ribeiro: «Por dentro das coisas / É que as coisas são» e é por dentro que temos de festejar o Natal.

Acredito que muitas pessoas, que não são católicas, festejem o Natal como a festa da família, como uma oportunidade para juntar familiares, próximos e distantes, e, em conjunto, celebrarem a alegria do reencontro e da família. Este é também um motivo válido. No entanto, o que não faz qualquer sentido é subverter os valores do Natal, substituindo-os por outros, mais materiais e menos espirituais, trocando sentimentos e presença por bens que se podem comprar.

Como é afirmado num anúncio à lotaria: «Este Natal o melhor presente é estar presente». E, efetivamente, assim é. Só porque os Reis Magos deram presentes (simbólicos) ao Menino que nasceu, não precisamos nós, agora, de desatar numa correria desenfreada às lojas, atropelando tudo ou todos, para comprar qualquer coisa uns para os outros, pela obrigação que sentimos de não ficar mal por nada oferecermos.

Como disse Tolentino Mendonça, em crónica recente no Expresso: «nesse labirinto de excesso, euforia e solidão», «Ainda que as mãos se atulhem de embrulhos, sabemo-las no fundo vazias, atadas às suas posições invisíveis, incapazes de dar não o inútil, mas o que seria preciso».

E o que é realmente útil é «perder» uns minutos a conversar com um vizinho que mora sozinho; é dizer «bom dia» antes de pedirmos «um café, por favor»; é ir passar uma tarde com aquela tia velhinha, que repete constantemente as mesmas histórias e para quem já não temos paciência, mas que vive isolada num lar, sem ninguém com quem falar; é visitar no hospital um familiar doente, mais vezes do que costumamos, mesmo que esteja inconsciente e nós pensemos que não vamos lá fazer nada; é parar junto de um pedinte e ouvir os seus queixumes e lamentos, sem virar a cabeça para o lado quando nos diz que está desempregado e com filhos para alimentar; é contribuir, com tempo e paciência, para a recolha de alimentos para aqueles que infelizmente mais precisam… Importa, pois, relembrar a crua verdade que nos legou David Mourão-Ferreira: «E por vezes as noites duram meses / E por vezes os meses oceanos / E por vezes os braços que apertamos / nunca mais são os mesmos»…

São tantas as situações que podem fazer com que demos sentido ao Natal, que podem ajudar, como diz Clara Ferreira Alves, a propósito de outro tema, a «relembrar que não somos feitos apenas de matéria», que não vivemos apenas para discutir futebol, política ou «bisbilhotar» a vida de «amigos desconhecidos» com quem trocamos likes em fotografias, por vezes desfocadas e sem interesse para mais ninguém a não ser os próprios.

Só vivendo o Natal por dentro conseguiremos, como diz Tolentino de Mendonça num poema, «que o nosso natal alguma vez, esta vez, /
seja Natal».

Infelizmente, haverá sempre pessoas a quem nada disto interessa, pessoas que mantêm constantemente uma atitude displicente, de indiferença, a quem nada ou pouco importa.

 

Maria Eugénia Leitão

Escrito em parceria com o blogue da Letrário, Translation Services