O Ministério Público espanhol não parece estar disposto em tolerar, durante muito mais tempo, as pretensões independentistas catalães e formalizou o pedido de julgamento de Francesc Homs, deputado e porta-voz do Partido Democrata Catalão (PdeCAT), sob as acusações de “prevaricação administrativa” e “desobediência grave”. Em causa está o papel desempenhado por Homs em novembro de 2014 – na altura ocupando o cargo de conselheiro da presidência da Generalitat da Catalunha – no âmbito da realização da consulta popular sobre a independência daquela comunidade autónoma espanhola, prontamente invalidada e pelo Tribunal Constitucional.
Entendeu o procurador do Tribunal Supremo, através do anúncio das conclusões provisórias sobre o caso, esta quarta-feira, que o deputado desobedeceu ao Constitucional de forma “aberta, obstinada e persistente”, nomeadamente por ter “legitimado e impulsionado ativamente os trabalhos preparatórios” para a consulta. Pede, então, o Ministério Público, que Homs seja inibido de exercer cargos públicos, durante nove anos, para além do pagamento de 30 mil euros.
Na referida consulta, realizada no dia 9 de novembro de 2014, cerca de 80% dos mais de 2 milhões de participantes, disse “sim” à independência da Catalunha, num claro sinal – direcionado para Madrid – de que o processo não iria acabar com a declaração constitucional que invalidava os resultados.
De acordo com a nota do Tribunal Supremo, Francesc Homs “não decidiu pela suspensão de nenhuma das ações que se foram desenrolando para a celebração da dita consulta [e] que dependiam diretamente do departamento da Presidência, de que era titular”. Bem pelo contrário. O tribunal acusa Homs de “colocar os serviços jurídicos do seu departamento à disposição da CTTI”, a empresa de telecomunicações que forneceu apoio informático à consulta. Para além disso, refere a nota, o ex-conselheiro tinha “perfeita consciência” de que, em virtude do cargo que ocupava, “estava obrigado a acatar as decisões do Tribunal Constitucional”. Neste sentido, a sua atuação, defende o Ministério Público, foi “essencial” e “crucial” para a realização da referida “desobediência”.
Segundo o “El Mundo”, Homs não estava, num primeiro momento, debaixo da mira do Tribunal Supremo, mas as investigações a Artur Mas – ex-presidente da Generalitat – redundaram na participação do deputado na preparação da consulta. Por aquele ocupar um cargo político a nível nacional, os processos seguiram caminhos distintos.
Democracia via Twitter
Pouco depois de conhecidas as conclusões do procurador do Tribunal Supremo, o porta-voz do PdeCAT publicou uma mensagem no Twitter, criticando fortemente a decisão da procuradoria. “É um exemplo de como o Estado espanhol está num beco sem saída e cada vez com menos cultura democrática”, escreveu Homs naquela rede social, adiantando que voltaria a fazer tudo da mesma forma.
Carles Puigdemont, presidente da Generalitat da Catalunha e Carme Forcadell, líder do parlamento catalão, também recorrer ao Twitter para expressar o seu desagrado para com as acusações. O primeiro concluiu que “com esta petição é o Estado que fica inibido democraticamente”, ao passo que a segunda defendeu que “ir às urnas nunca poderá ser um delito” e garantiu que “futuro da Catalunha” não será decidido por um tribunal, mas pelos catalães, como a própria.
Tanto um como o outro estão sob a mira do Tribunal Constitucional. Em dezembro do ano passado, após bloquear as resoluções do parlamento catalão que visavam um novo referendo em 2017, aquele tribunal deixou uma advertência aos principais líderes catalães, que tinham o “dever” de “impedir ou paralisar” todas as iniciativas contrárias à suspensão decretada.
Cronologia de um finca-pé
Um ano após a realização da consulta informal, o Parlament votou a favor de uma declaração independentista, que decretava o pontapé de saída no processo de secessão da Catalunha do país vizinho. Em menos de dois dias, o Constitucional decidiu, por unanimidade, bloquear as pretensões do órgão legislativo catalão e decidiu constituir como “atos de desobediência” todas as iniciativas contrárias à resolução constitucional.
A “desobediência” acabou mesmo por acontecer e após algumas iniciativas parlamentares, durante 2016, a assembleia catalã aprovou, em outubro, duas resoluções que apontavam à realização de um referendo constitucional e vinculativo, prevista para o final deste ano. Uma pretensão que foi novamente proibida pelo Tribunal Constitucional, em dezembro do ano passado.