Editorial bi: mulheres com m pequeno

Tem lugar hoje a Women’s March, em Washington, uma marcha convocada para o dia seguinte à tomada de posse de Donald Trump, que começou timidamente, com uma avó havaiana a desafiar 40 amigas para que marchassem com ela, protestando contra a eleição de um homem que tem dado inúmeras provas da sua misoginia e machismo…

Depois, já se sabe, o poder da internet muda tudo e em poucas semanas uma combinação entre amigas passou a ser uma marcha com cerca de 200 mil participantes previstos, só em Washington. Espera-se que esta possa vir a ser a maior manifestação que a América já viu como reação à tomada de posse de um presidente – ultrapassando os protestos em torno de Richard Nixon e George W. Bush. À medida que esta marcha foi crescendo nos EUA, um pouco por todo o mundo começaram a ser organizadas iniciativas semelhantes. 

E Portugal não foi exceção: a Marcha de Mulheres #NãoSejasTrump, terá hoje, a partir das 15h, pontos de encontro em Lisboa, Porto, Braga, Coimbra, Faro e Angra do Heroísmo, entre outras cidades. E, tal como nos EUA, ainda que promovida por mulheres, esta marcha não pretende ser nem apenas para mulheres nem apenas acerca da luta pela igualdade de género, reunindo movimentos feministas mas também antirracistas, anticapitalistas, LGBTQ+, ambientalistas e contra a precariedade no trabalho, entre outros. Ora, a propósito desta marcha, na página do evento nacional, surgiu um comentário que incendiou as discussões. “Marcha das mal fodidas”, podia ler-se, com todas as letras, num post assinado por um perfil feminino de uma jovem mãe, que não identificarei.

Esta ‘mulher’ deu-se ao trabalho de entrar na página de um evento – que pelos vistos não lhe interessa nem ao qual reconhece razão de ser – para escrever esta frase. E eu não consigo parar de pensar o que será que a incomoda tanto nesta marcha. Ninguém a obriga a ir, ninguém a obriga a concordar com a sua existência. Ninguém a obriga a nada. Aquilo a que estaria obrigada, por ela e pelas mulheres que a rodeiam, é a respeitar a sua condição feminina. Uma condição feminina que nada tem a ver com ser bem ou mal fodida, muitas ou poucas vezes. Infelizmente, a luta pela igualdade de género faz-se, antes de mais, dentro do próprio género feminino.