Quem acompanhou a campanha presidencial de Donald Trump facilmente conseguiria prever que a relação diplomática entre EUA e México iria ter pela frente alguns dos maiores desafios da sua já longa história de amizade, se o republicano fosse declarado vencedor da corrida eleitoral. É que a construção de um muro de separação entre os dois países, ao longo dos mais de 3 mil quilómetros da fronteira, totalmente financiada pelo México, foi uma das primeiras e mais badaladas promessas do magnata e, possivelmente, a mais polémica – agravada pela caracterização generalizada dos imigrantes ilegais mexicanos como “violadores” e “assassinos”, por parte de Trump.
Uma vez eleito e após a entrada em funções, o novo presidente norte-americano passou das palavras ao atos e oficializou, na quarta-feira, a intenção de avançar para a edificação do muro, esclarecendo que o mesmo será inicialmente financiado pelos norte-americanos, que depois entregarão a fatura ao México. Uma tomada de posição previsível, tendo em conta que nos dias anteriores Trump tinha vindo a assinar ordens executivas de confirmação das promessas de campanha e que abrem caminho, a uma autêntica crise diplomática sem precedentes, entre os dois vizinhos.
O presidente mexicano Peña Nieto não gostou de ouvir Trump garantir à ABC News que terá de pagar “100%” dos custos – o total da obra deverá ultrapassar os 8 mil milhões de dólares (cerca de 7,4 mil milhões de euros) previstos pela administração Trump – e gravou um vídeo onde, para além de reprovar, mais uma vez, a construção do muro, insistia que não iria assumir as despesas. De qualquer forma, o chefe de Estado mostrava-se aberto a abordar o tema na sua visita oficial aos EUA, marcada para a próxima terça-feira, destinada às negociações sobre o acordo comercial da NAFTA.
Só que Donald Trump não foi em cantigas e decidiu exteriorizar o seu posicionamento irredutível, recorrendo ao seu meio de comunicação favorito, o Twitter. “Se o México não está disposto a pagar pelo muro tão necessário, então é melhor cancelar o encontro agendado”, escreveu o presidente, na sua conta pessoal daquela rede social, na quinta-feira.
Se antes do desabafo de Trump, Penã Nieto já sentia a pressão da oposição e dos próprios membros da sua equipa, depois daquele, não havia mesmo volta a dar. Anunciou o cancelamento da visita aos EUA e escreveu o seu nome nesta página inédita de imprevisível tensão entre americanos e mexicanos.
Boston faz frente a Trump
A assinatura da ordem executiva presidencial de confirmação da construção do muro “nos próximos meses”, motivou reações várias de descontentamento, dentro e fora dos EUA. Mas nenhuma terá sido tão provocatória como a de Marty Walsh, mayor de Boston e membro do Partido Democrata.
“Quero falar diretamente para todos os que se sentem ameaçados ou vulneráveis: estão seguros em Boston!”, prometeu Walsh, na quarta-feira, citado pela NBC, numa conferência de imprensa onde marcaram presença vários imigrantes que, nas suas palavras deviam “estar orgulhosos da sua herança e de onde vieram”. “Vamos fazer tudo o que estiver ao nosso alcance, em termos legais, para vos proteger. Se for necessário, utilizaremos o próprio edifício da câmara para abrigar e proteger todos os que se sentirem injustiçados”, sugeriu o democrata.
Questionado sobre uma possível ameaça de congelamento do financiamento federal, Walsh garantiu que “não será intimidado” e que mostrou-se confiante na sua demanda, uma vez que “terá sempre a Constituição dos EUA do seu lado”.