om um orçamento de 9 milhões de dólares e já com uma faturação superior a 100 milhões nas bilheteiras à volta do mundo, “Fragmentado”, que chegou às salas portuguesas esta quinta-feira, tornou-se na primeira grande história de sucesso cinematográfico de 2017. O novo thriller de M. Night Shyamalan está a dar que falar, não só pelos twists a que o realizador já nos habituou, mas sobretudo pela interpretação de James McAvoy como protagonista desta longa-metragem que explora o tema da esquizofrenia como mecanismo de defesa face a traumas resultantes de uma infância abusiva.
Depois de filmes como “As Crónicas de Narnia: O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa”, “Expiação” e “O Último Rei Da Escócia”, aos 37 anos, o ator escocês já tem garantido um legado artístico de invejável variedade. No entanto, é neste “Fragmentado” que McAvoy tem finalmente a oportunidade de mostrar uma versatilidade técnica típica de atores com um calibre bem acima da média. Não é por acaso o espanto de muitos face a uma não nomeação do ator para um Óscar este ano.
Com apenas um mês de preparação, McAvoy vestiu a pele de Kevin, uma vítima de transtorno dissociativo de personalidade com 24 identidades distintas a residirem dentro do seu corpo. Apesar de o enredo nos apresentar apenas nove dessas facetas, é possível perceber que McAvoy refletiu sobre todas elas com o rigor de quem se prepara para o papel de uma vida. Muitos outros atores bem-sucedidos recusaram assumir esta personagem complexa, devido ao risco associado à interpretação de vários papéis num só. “Apesar de ser um ator bem estabelecido em Hollywood, por todos os filmes em que participei, nomeadamente o franchise do X-Men, a verdade é que estou sempre à procura de algo novo. O que a representação tem de bom é que, se por acaso algo não corresponder às expectativas iniciais de um ator, tudo acaba rápido, porque, na nossa profissão, poucos são os projetos que duram mais de três meses. Como tal, a única coisa que tenho a arriscar é a minha reputação e isso não é nada face ao entusiasmo de um desafio”, disse ao B.I.
McAvoy acrescentou ainda que, enquanto estava a preparar-se para este papel, teve vontade de conversar com alguém que sofresse do distúrbio mental em causa, para melhor perceber a índole da personagem. Mas apesar das várias tentativas, tal não foi possível. Em vez disso, o ator teve acesso a vídeo-diários de vários pacientes que usam a plataforma Youtube como forma de documentar os seus vários alter egos para posteriormente serem analisados em sessões de terapia.
Mas apesar de confessar um genuíno interesse pelo tema em questão, McAvoy afirma que o que mais o fascinou neste projeto foi a colaboração com o realizador M. Night Shyamalan, que começou numa festa em 2015, durante o festival Comic Con, em San Diego. O ator estava então a promover o filme “X-Men -The Apocalypse”, em que participou, e Shyamalan, um dos convidados do evento, abordou-o. Após alguns minutos de conversa propôs-lhe o papel de Kevin. Passados apenas dias, e cativado logo após ler as primeiras dez páginas do guião, James McAvoy aceitou integrar o elenco. Depois de oito semanas de filmagens, confessa que nunca tinha trabalhado com um realizador tão meticuloso: “Shyamalan tem como prioridade cumprir com a visão artística que tem planeada. Não encoraja a improvisação, o que é invulgar em cinema. A maior parte dos realizadores permitem variações aos diálogos escritos nos guiões. Em ‘Fragmentado’ não foi o caso. À partida, isto pode parecer de certa forma constrangedor, mas não. Pelo contrário, senti-me mais livre a representar. Não estava preocupado em tornar o texto melhor, mas apenas em tirar do texto a melhor interpretação possível. Foi quase como voltar ao regime do teatro. Identifiquei-me muito com este método de trabalho.”
Com um sucesso para lá de todas as expectativas, por Hollywood já se fala de uma sequela de “Fragmentado” e James McAvoy já se mostrou pronto e interessado em embarcar na continuação de um projeto que, segundo o próprio, muito o “enalteceu” como ator. Enquanto tal não acontece, o escocês, intrigado com as lides atrás das câmaras, começa a ponderar, quem sabe se influenciado pela experiência ao lado de Shyamalan, realizar filmes em torno de histórias que lhe são relevantes. Para já, contudo, quer concentrar-se nos vários papéis que já tem agendados e na educação do filho de sete anos, fruto do casamento com Anne-Marie Duff.