Para Penelope, não vem de agora a lição de que na política tudo muda num ápice. “Quando François estava no ministério da Educação, disseram-lhe que ficara sem emprego à uma da tarde e pelas cinco já tínhamos saído de lá”, conta numa entrevista de 2007 ao “Telegraph”, na semana em que o seu marido, François Fillon, é designado primeiro-ministro do então presidente Nicolas Sarkozy, um cargo que desempenha em segundo plano, apagado pela liderança dominante do antigo líder, que o menospreza anos mais tarde, em público, tratando-o como antigo lacaio. Nessa entrevista de há dez anos, Penelope diz que não se sente confortável no olhar público, que troca de passeio quando o marido é reconhecido e que não se consegue dar com a estonteante – “mas muito parisiense” – Cécilia, na altura a primeira dama. Penelope revela que, por si, trocaria a capital francesa pelo châteaux do sec. XII da família de François, em Sarthe, no noroeste interior, onde por aqueles dias tinha cinco cavalos e o à vontade de caminhar pelas ruas como a galesa de província que diz ser. Como escrevia Kim Willsher: “Filha de um solicitador, olhos azuis perscrutantes, ela repudia o título de segunda dama.”
Até há poucas semanas, porém, Penelope vinha-se habituando ao título de primeira dama. Tudo corria pelo melhor ao marido, que, saído praticamente do desconhecido, bateu o antigo patrão Sarkozy e o grande favorito, Alain Juppé, nas primárias do centro-direita, o que de imediato fez dele o mais plausível candidato a vencer Marine Le Pen nas presidenciais deste ano. Ao que tudo parecia indicar, a austera e discreta Penelope tinha de voltar a habituar a sua sensibilidade de província às cerimónias de Estado que aguentou a contragosto quando o seu marido era primeiro-ministro: “Não me recuso a ir, mas não é particularmente isso que gosto de fazer. Não sou uma animal de festa de Paris, sou o tipo de pessoa que prefere ficar nas traseiras da sala a observar e a ouvir os outros.”
O desconforto de cerimónias futuras pode agora nunca se materializar. Na última semana de janeiro, o jornal satírico “Le Canard Enchainé” revelou que a galesa de 61 anos recebeu qualquer coisa como 800 mil euros ao longo de mais de uma década pelas funções desempenhadas como assistente parlamentar do marido, embora nenhum funcionário guarde memória dela, apesar de não existirem provas determinantes do seu trabalho e de ela própria, nesta mesma entrevista de 2007, ter afirmado, gravada em vídeo, que nunca trabalhou para François Fillon: “Nunca fui a sua assistente, ou qualquer coisa desse género.”
A sua entrevista ao “Telegraph” surge por estes dias como a indicação mais cabal de que Penelope recebeu centenas de milhares de euros por um emprego que nunca desempenhou. A Justiça francesa abriu uma investigação preliminar e François Fillon recusa as alegações, admitindo que contratar a sua mulher – e, descobriu-se mais tarde, dois dos seus cinco filhos – não foi a decisão mais acertada. Mas insiste também em dizer que o trabalho de Penelope foi real e importante. O candidato do centro-direita resiste à pressão do partido e promete que só se retira da corrida se a investigação preliminar produzir uma acusação.
À medida que não o faz, cai nas sondagens. As últimas consultas, aliás, colocam-no decididamente atrás do independente Emmanuel Macron, agora em segundo lugar com mais três pontos que Fillon e em trajetória ascendente. Outra sondagem indica que 70% dos franceses querem que o candidato conservador se retire de cena. Penelope, por sua vez, preserva conspicuosamente o silêncio, falando apenas pelo seu advogado ou em depoimentos aos investigadores. Se é verdade que Penelope diz que nunca sentiu saudades de casa, também o é que nem sempre soube lidar com França. Como disse ao “Telegraph há dez anos: “Muitas vezes senti-me um pouco exasperada com os franceses, como é natural, porque eles tendem a pensar que são superior aos outros”.