O filme é uma obra de ficção com realização de Steven Spielberg, a realidade do ano de 2054 é um produto da sua imaginação, de argumentistas, de um autor conceituado que escreveu a obra original e seguramente de muitos outros que contribuíram para o processo criativo. No que respeita à comunicação das marcas, à sua publicidade, representam de forma extraordinária a plena integração das capacidades dos meios físicos com os digitais para chegar ao consumidor.
Esquecendo por enquanto a questão da tecnologia, sem dúvida uma barreira (que não se deve tornar numa desculpa fácil), gerir a relação com os consumidores nos universos físico e digital é um dos grandes desafios de hoje.
As pessoas estão no centro desta equação e para a resolver é necessário começar por perceber o processo ROPO, Research Online Purchase Offline, onde o online é fonte de inspiração e informação para uma compra que vai ser efetivada na loja. O contrário também verdade, pois é cada vez mais comum ir à loja sentir o produto integrado num ambiente, experimentá-lo, para depois o deixar na prateleira e procurar online o preço mais baixo, garantindo que se faz o melhor negócio possível. Será que para as pessoas, consumidores e embaixadores das marcas, ainda faz sentido pensar em físico e digital como duas realidades separadas?
Pensar um processo de compra numa lógica linear, um funil onde à medida que nos aproximamos da decisão final diminuímos o leque de escolhas, deixou de fazer sentido na maioria dos casos. Hoje entende-se que o processo é cíclico, uma jornada, que não termina com a compra, perpetuando-se na utilização, satisfação, partilha de opinião e fidelização (recompra) da marca. Diferentes meios físicos e digitais exercem influência em várias fases desta jornada, frequentemente completando-se.
50% dos consumidores afirmam ter maior probabilidade de se envolver com uma experiência digital que ofereça uma experiência equivalente no mundo físico, diz o relatório de tendências digitais da Microsoft. As marcas precisam de conseguir envolver as pessoas em experiências únicas, relevantes e consistentes, tirando o melhor partido das vantagens de cada meio. Estamos na era do Phygital, da integração dos universos físico e digital em que um complementa o outro, resultando numa maior capacidade de envolver e seduzir as pessoas, mantendo-as fiéis ao ecossistema da marca.
A componente tecnológica desempenha um papel fundamental para a concretização do Phygital, mas não é uma barreira. A experiência do Nike+, que conjuga produtos desportivos, com uma aplicação que regista os treinos e ajuda estabelecer objetivos, mas acima de tudo aproxima uma comunidade de milhões de pessoas que se movem por um interesse comum, não depende de uma tecnologia de ponta, reservada a um conjunto de utilizadores selecionados. Tal como o supermercado virtual que a Tesco Homeplus criou no metro na Coreia do Sul, que dava às pessoas a possibilidade de fazerem as suas compras enquanto esperavam pelo comboio. Em ambos os casos, a qualidade da experiência marcou muito mais do que a tecnologia, que era essencialmente a que já estava ao serviço de todos. Até porque, em idade tecnológica, estas são duas experiências antigas, a primeira versão do Nike+ é de 2006 (ainda sem aplicação) e o Tesco Homeplus aconteceu em 2010.
Em muitos aspetos ainda estamos longe, muito longe, da realidade que o John Anderton vive no Relatório Minoritário, se é que algum dia vamos lá chegar. Mas com a acessibilidade a tecnologias como a realidade aumentada, a realidade virtual e a inteligência artificial, dificilmente podemos isolar a tecnologia como a principal barreira à criação de experiências Phygital. Como muitas vezes acontece, o principal desafio é o da criatividade, de conseguir produzir boas ideias que causem impacto e cuja relevância seja percebida pelo consumidor. O mesmo desafio que a equipa do Spielberg enfrentou para imaginar o mundo em 2054. Let’s get Phygital.
*Responsável Planeamento Estratégico do GrupoHavas Media