“Por quanto tempo irá andar por aí o novo Trump?” A pergunta é colocada pela jornalista Karey Van Hall, do Politico, menos de 24 horas depois de ouvir o discurso reconciliador, estruturado e desagrilhoado do já rotineiro estilo confrontacional que o presidente dos EUA ofereceu ao Congresso na noite de terça-feira. A avaliação positiva ao desempenho de Donald Trump não só foi totalmente unânime junto da imprensa norte-americana – incluindo os meios de comunicação que, de acordo com o magnata, são “desonestos”, “inimigos dos americanos”, “incapazes de relatar a verdade” e “precursores de uma agenda própria” -, como da grande maioria dos que assistiram em casa. Vejam–se, por exemplo, os resultados da sondagem realizada pela CNN/ORC, divulgados hoje, que revelam que 57% dos participantes teve uma reação “muito positiva” ao discurso de Trump e que 7 em cada 10 pessoas que ouviram o presidente estão agora “mais otimistas” sobre o “rumo a seguir pelo país”.
O ponto de partida, diga-se, não era propriamente famoso para a administração norte-americana. Afinal, o novo inquilino da Casa Branca apresenta uma taxa de desaprovação de 48%, fruto de um primeiro mês e meio marcado por tweets raivosos, ordens executivas controversas, guerras com a justiça e com a comunicação social, conferências de imprensa provocadoras, dificuldades na aprovação dos membros do gabinete da presidência e o crescimento de um clima cada vez mais propício à fragmentação da sociedade norte-americana. De acordo com Michael Bender do “Wall Street Journal”, o jornal que, juntamente com a NBC News, realizou e apresentou, no domingo, os resultados do inquérito de apreciação dos primeiros dias do magnata no poder, de onde constam os tais 48% de desaprovação, Trump é “o primeiro presidente do pós-II Guerra Mundial a apresentar uma taxa de aprovação negativa na primeira avaliação da opinião pública”.
É precisamente com base neste atribulado passado recente que aos elogios da imprensa se somaram reflexões como a de Van Hall ou da própria Fox News que, na manhã desta quarta-feira, questionava se o “brilho” emitido e “desfrutado” por Trump “após o home run [o mais importante e valioso objetivo num jogo de basebol] no Congresso” seria para continuar.
Desta vez, Donald Trump não foi igual a si mesmo e ofereceu ao Congresso dos EUA o discurso consensual que os republicanos (principalmente eles) precisavam de ouvir – tanto que ‘interromperam’ o seu líder, vezes sem conta, com efusivos aplausos. Mesmo tendo apresentado os planos políticos da presidência de forma algo vaga, conseguiu passar uma mensagem sólida e demonstrativa das novas prioridades do Partido Republicano, em maioria nas duas câmaras da assembleia norte-americana, em matéria de criação de emprego, reestruturação militar, reforma fiscal e, acima de tudo, da revogação e substituição do Obamacare.
E se a demonstração da tal ‘postura presidencial’, que até aqui pouco se tinha visto, por parte de Trump, agradou à maioria dos republicanos – Ted Cruz, ex-adversário do presidente nas primárias do GOP, na luta pela nomeação presidencial, por exemplo, descreveu as palavras do chefe de Estado como “arrojadas” e “bastante positivas” e o speaker Paul Ryan rotulou o seu discurso como um autêntico “home run” -, no seio do Partido Democrata o sentimento, embora envolto num misto de alívio e surpresa, é o de desconfiança. Tanto porque existe a tal dúvida, levantada pela imprensa, sobre o prazo de validade do ‘novo Trump’, como devido ao próprio conteúdo do discurso, visto pela oposição como desfasado da sua forma. “O discurso do presidente interessa muito menos que os discursos de qualquer outro presidente, uma vez que está desligado da realidade”, afirmou Chuck Schumer, líder da minoria democrata no Senado, citado pela CBS News. “[Trump] não tem qualquer plano e não conseguiu chegar até nós, uma única vez. Ele fala de uma maneira e atua de outra”, acusou ainda, mostrando-se pouco convencido com a promessa presidencial de “deixar para trás as lutas triviais” e apelar à “coragem para partilhar os sonhos que preenchem os corações” dos norte-americanos.
A verdade é que os EUA estão a viver horas de aparente otimismo. E de recordes. Um dos principais índices da bolsa de Nova Iorque, o Dow Jones Industrials, superou a fasquia dos 21 mil pontos hoje de manhã e o Twitter anunciou terem sido trocados 3 milhões de tweets sobre o discurso de Trump no Congresso, um número que supera as 2,6 milhões de mensagens naquela rede social, relacionadas com as palavras de Barack Obama, por ocasião do tradicional “State of the Union address”, de 2015.
Foi precisamente no Twitter, a sua arma de arremesso favorita, que Donald Trump reagiu ao sucesso da sua palestra: “OBRIGADO!”, limitou-se a escrever o presidente, na manhã de quarta-feira mais resplandecente dos últimos tempos na Casa Branca.