E tudo Bruno de Carvalho levou. Sem surpresas, o empresário nascido há 45 anos em Lourenço Marques, hoje Maputo, vai continuar a ser o presidente do Sporting por mais quatro anos, depois de ter vencido Pedro Madeira Rodrigues de forma esmagadora: 86,13 por cento dos votos foram para a sua Lista B, contra os residuais 9,4 por cento conseguidos pela lista A, naquele que foi o ato eleitoral mais concorrido de sempre do clube – 18755 votantes.
O anúncio, feito por Jaime Marta Soares, presidente da Mesa da Assembleia Geral, já muito perto das três da madrugada, junto à Praça Centenário do Estádio José Alvalade, foi seguido de um discurso ao melhor estilo do sobrinho-neto de Pinheiro de Azevedo. Aliás, o ponto alto (ou baixo) do mesmo chegou perto dos dez minutos de monólogo, quando Bruno de Carvalho adaptou uma célebre frase do tio-avô, antigo primeiro-ministro, que um dia se lembrou de dirigir um “bardamerda para o fascista” a quem o conotava com o antigo regime. Do alto da sua posição como recém-reempossado presidente de uma instituição centenária, Bruno de Carvalho soltou um “bardamerda para todos aqueles que não são do Sporting Clube de Portugal”.
O “Donald Trump do futebol”, chamou-lhe assim o jornal britânico “The Independent” há poucos dias. Com alguma propriedade, diga-se: a postura de Bruno de Carvalho ao longo dos últimos quatro anos tem-se pautado pelo belicismo exacerbado, com inúmeros exemplos que ficaram para a história dos “sound-bytes” do futebol português.
Das nádegas às galinhas
Os ataques iniciais até se centravam, regra geral, em Jorge Nuno Pinto da Costa, longevo líder do FC Porto. Como este, em outubro de 2013: “Declarações de Pinto da Costa? Não estranho nem me interessa absolutamente nada. O meu pai, que eu adoro, é uma pessoa com 80 anos. Eu percebo. A certa altura temos algumas dificuldades, é normal.”
Foi sol de pouca dura, porém. A partir de uma certa altura – especificamente, quando o Benfica começou a ganhar desportivamente –, foi para as águias que o presidente do Sporting começou a canalizar toda a sua fúria. “Há uma solução simples que as pessoas ainda não descobriram. Quando quiserem começar a resolver os problemas de Portugal, é fácil: tiramos o vermelho da bandeira e isto é tudo nosso”, dizia em novembro de 2013. Em março de 2014, voltou ao líder dos dragões. “Tenho pena que Einstein não tenha conhecido Pinto da Costa e a comitiva que o acompanha. Porque em vez de falar em universo e estupidez, falaria de uma frase célebre de um treinador português: um vintém é um vintém e um labrego é um labrego.”
Em junho de 2014, a primeira referência escatológica. “Na gíria popular, porque sabemos que o futebol português está bipolarizado, isto funciona como o ânus, onde temos duas nádegas que se enfrentam uma à outra dizendo: ‘Estou aqui e sou melhor que tu’. Entre algo fisiológico como o ânus, ou sai vento mal cheiroso ou trampa. E é disto que o futebol português está cheio por dentro e por fora: trampa.”
Depressa chegaria às figuras de proa do Benfica. “Luís Filipe Vieira sofre de egocentrismo agudo e quando for grande quer ser o futuro papa do futebol português”, disse em fevereiro de 2015. Em agosto do mesmo ano, atirou-se a João Gabriel, então diretor de comunicação das águias nestes termos: “Muitas vezes ao estilo Simpsons, algumas atitudes demonstradas fazem lembrar Mr. Burns, o ‘velhinho mauzão’ que no final do dia ninguém teme nem respeita. Caro Mr. Burns, se é guerra que quer, é guerra que terá. Vá chamando o seu exército de falsas ‘virgens ofendidas’ e ‘dinossauros esquecidos’.”
Em fevereiro deste ano, outra pérola direcionada aos encarnados. “O presidente do sindicato dos jogadores do Peru está eufórico com a ida de Carrillo para o Benfica. Compreende-se, finalmente o peru pode ir às galinhas…”. O mundo animal, diga-se, parece ocupar um bom lugar no léxico metafórico do presidente do Sporting, como se pode constatar pelas declarações de novembro último, após a célebre – e triste – altercação com o seu homólogo do Arouca, Carlos Pinho, no caso do “cuspo ou cigarro eletrónico”: “Nasci em África, já fui a um safari e vi lá búfalos com atitudes mais calmas.”
“Tempestuoso, conflituoso, imprevisível e abrasivo” são os adjetivos utilizados por Jack Pitt-Brooke, jornalista do “The Independent” que assinou o tal artigo a comparar Bruno de Carvalho a Trump – com quem partilha mais uma particularidade: o gosto pelas redes sociais. Muitas das pérolas que vai disparando contra os adversários são escritas em verdadeiros testamentos na sua página oficial de Facebook – Trump prefere o Twitter, onde pode causar polémica em apenas duas ou três linhas. De resto, irmãos de armas: não há grandes dúvidas. Venham de lá mais quatro anos de ataques, humor escatológico, “sound-bytes”… e no campo logo se vê. Enquanto as massas estiverem do seu lado, tudo é permitido.