Delas, as feministas, já se disse que queimaram soutiens, que não se depilavam, que não se preocupavam com a imagem, que odiavam os homens. E por muito que toda uma nova geração e activistas procure, de forma incansável, esclarecer que o grande problema do feminismo é ser erradamente explicado – e mesmo quando achamos que os equívocos tendem a desaparecer – eis que surge Emma Watson e as suas mamas, na longa produção que a atriz protagoniza na edição deste mês da “Vanity Fair”, assinada pelo fotógrafo Tim Walker. E logo vem o drama, a tragédia e o horror, porque afinal como é que uma atriz que tem estado na primeira linha da luta pela igualdade de género pode aparecer numa revista de moda a mostrar o contorno das mamas? Lá está, o drama, a tragédia e o horror. “Hipócrita”, vêm dizer os defensores da moral e dos bons costumes, escudados pela cobardia das redes sociais.
E mais uma vez se repete o cenário: uma grande parte das vozes que criticam são femininas, reforçando a ideia de batalha campal que tantas vezes as mulheres declaram umas às outras, transformando os homens em espectadores – que qualquer dia mais vale irem buscar as minis enquanto assistem a esta luta na lama – sendo que, no fundo, esta atitude nada mais é que uma demonstração da sociedade patriarcal ainda dominante.
De repente, Emma Watson – por causa do contorno de umas mamas – já não é a atriz inglesa de 26 anos que, com apenas nove, foi escolhida para dar vida a Hermione Granger, da saga “Harry Potter”, papel que assumiu durante dez anos, entre 2001 e 2011. Para trás ficou também a licenciatura em Literatura Inglesa pela Universidade de Brown e filmes como “As Vantagens de Ser Invisível” (2012), de Stephen Chbosky; “Bling Ring: O Gangue de Hollywood” (2013), de Sofia Coppola; “Noé” (2014), de Darren Aronofsky; “Regressão” (2015), de Alejandre Aménabar; e “A Bela e o Monstro”, uma produção da Walt Disney Pictures realizada por Bill Condon, e que chegará às salas portuguesas no próximo dia 16 de março.
E, sobretudo, Emma Watson já não é a jovem mulher que, em junho de 2014, foi nomeada Embaixadora da Boa Vontade da Agência ONU Mulheres, tomando para si a missão de divulgar a campanha He For She, que defende que a luta pela igualdade de género deve ser assumida por mulheres mas também por homens, e que, em setembro do mesmo ano, na cerimónia de lançamento da campanha, fez um dos discursos mais marcantes da história do feminismo recente. “Homens, gostaria de usar esta oportunidade para apresentar um convite formal. A igualdade de género também é um problema vosso. Até hoje vejo o papel do meu pai como pai sendo algo menos válido na sociedade. Vi jovens homens sofrendo de doenças, incapazes de pedirem ajuda por medo de que isso os torne menos homens – de facto, no Reino Unido, o suicídio é a maior causa de morte de homens entre os 20-49 anos, superando acidentes de carro, cancro e doenças do coração. Vi homens frágeis e inseguros sobre o que constitui o sucesso masculino. Os homens também não têm o benefício da igualdade. Nós não queremos falar sobre os homens como estando aprisionados pelos estereótipos de género mas eles estão. Quando eles estiverem livres, as coisas vão mudar para as mulheres como consequência natural. Se os homens não tiverem que ser agressivos, as mulheres não serão obrigadas a serem submissas. Se os homens não tiverem a necessidade de controlar, as mulheres não precisarão de ser controladas. Tanto homens como mulheres deveriam ser livres para serem sensíveis. Tanto homens como mulheres deveriam ser livres para serem fortes”, referiu, num dos momentos mais marcantes do referido discurso. No final, lançou um repto a homens e mulheres e terminou com aquela que, de certa forma, se tornou o lema da campanha He For She: “Se não eu, quem? Se não agora, quando?”
Curiosamente, já nesse discurso a atriz assumiu saber que feminismo era uma palavra pouco popular e frequentemente mal entendida. E foi justamente por aqui que Emma Watson começou a sua resposta a toda esta polémica. A atriz aproveitou uma entrevista à BBC, no âmbito da promoção do filme “A Bela e o Monstro”, para se defender daqueles que a acusam de ser uma falsa feminista. E a sua cara de surpresa e incredulidade diz tudo: “O feminismo é dar às mulheres a possibilidade de escolha. O feminismo não é um pau que se usa para bater noutras mulheres. É sobre liberdade, é sobre libertação, é sobre igualdade. Realmente não sei o que as minhas mamas têm a ver com isso”, diz, admitindo a surpresa em relação a toda a situação. Sentada ao lado do coprotagonista do clássico da Disney, Dan Steven, e perante a indignação da atriz, este ainda lhe pergunta do que está a ser acusada, ao que Watson responde sem rodeios: “Dizem que não posso ser feminista e ter mamas”. Mentira, Ema. Podes.