“Sou o oposto de [Geert] Wilders, essa é a realidade. Acredito numa sociedade onde as pessoas não são julgadas pela sua cultura, religião ou cor.” É com estas palavras que Jesse Klaver, o novo menino-prodígio da esquerda holandesa, resume ao “El País” a mensagem principal da sua candidatura às eleições legislativas, marcadas para amanhã. E se o líder do xenófobo e anti-imigração Partido da Liberdade (PVV) alicerçou a sua campanha sobre o “medo e o ódio”, acusa o cabeça-de-lista pelo GroenLinks, os verdes holandeses construíram a sua com base na “esperança e na empatia”.
A Holanda vai às urnas na quarta-feira para decidir a composição da câmara baixa do seu parlamento, naquele que é um dos atos eleitorais mais relevantes das últimas décadas no país. Em primeiro lugar, porque é ali que se lançará a primeira pedra do grande confronto europeu, que colocará frente-a-frente o nacionalismo populista eurocético e o establishment dos partidos moderados, com novos episódios eleitorais marcados para finais de abril (primeira ronda) e inícios de maio (segunda ronda) em França, e para setembro, na Alemanha.
E em segundo lugar porque a já tradicional política holandesa fragmentada – há mais de 100 anos que não se verifica, naquela monarquia constitucional, um governo composto por um só partido – se encontra, por estes dias, mais fragmentada do que nunca. Este ano concorrem 28 partidos e pelo menos 14 poderão conseguir eleger deputados, segundo as sondagens atualizadas regularmente pelo Peilingwijzer. O sistema político do país das túlipas não garante ao partido mais votado um lugar no governo e nem sequer a competência para liderar o processo de procura da maioria de 76 deputados, obrigatória para o efeito. Esse papel caberá a um “negociador” escolhido pelos deputados que forem eleitos. Com base na lei eleitoral, e tendo em conta os dados mais recentes sobre as intenções de voto dos holandeses, o partido que surge mais bem colocado é o VVD, do primeiro-ministro Mark Rutte, mas com apenas 16% de votos estimados, equivalentes a cerca de 25 deputados – números que, a confirmarem-se, obrigam a uma coligação governamental que poderá agregar até seis partidos.
Fazer parte dessa maioria que governará o país está, precisamente, no horizonte de Klaver. Numa altura em que a política holandesa virou nitidamente à direita e que temas como a imigração e a islamofobia tomaram conta do debate público – o posicionamento do partido de Wilders, cujo conteúdo programático assenta quase exclusivamente na “desislamização da Holanda”, no segundo lugar das sondagens testemunha isso mesmo –, o GroenLinks aposta forte em chegar ao ouvido do eleitorado da esquerda. E tem-no feito com mestria. Que o diga o Partido Trabalhista (PvdA), a segunda maior força partidária no atual executivo e a representante tradicional do centro-esquerda holandês, que conta com apenas 7% da intenções de voto, contra 11% do partido que, em 1989, juntou comunistas, evangélicos e pacifistas numa única plataforma ecologista.
Jovens e descontentes na mira
Filho de pai marroquino – “escumalha” aos olhos de Wilders, portanto – e de mãe holandesa de ascendência indonésia, Jesse Klaver, de apenas 30 anos, encarna na perfeição a multiculturalidade existente na Holanda. O seu programa eleitoral, amplamente divulgado e aberto à discussão através das redes sociais, aponta à igualdade económica, à inclusão social e à proteção ambiental, temas bastante atrativos juntos dos eleitores mais jovens, que se apinham nos comícios da Esquerda Verde para o ouvir e aplaudir. Para além disso, Klaver é um confesso adepto da União Europeia e dos programas de acolhimento de refugiados, posições que chocam de frente com aquilo que defende o PVV, em queda nas sondagens, mas que os Verdes acreditam ainda terem o apoio de muita gente dos dois lados do espetro político. “Existe uma grande probabilidade de conseguirmos ir buscar votos ao PvdA, mas também esperamos que as pessoas que vão votar pela primeira vez escolham o GroenLinks, (…) um partido direcionado para o futuro”, prevê Carolijn Hofte, uma militante do partido, ao britânico “The Guardian”.
Fã assumido de Pablo Iglesias, líder do Podemos espanhol, e de Jeremy Corbyn, do Partido Trabalhista britânico – há até quem o compare ao primeiro-ministro canadiano Justin Trudeau –, o candidato a deputado tem a perfeita consciência de que, se se confirmar que o GroenLinks vai quadruplicar os resultados alcançados nas últimas eleições, o seu nome ganhará força para entrar no próximo governo, principalmente se aquele necessitar de cinco ou seis partidos para conseguir a maioria dos 150 deputados parlamentares. Como tal, está disposto a negociar. “Acredito que a cooperação é necessária para alcançarmos os nossos objetivos de mudança. Quero garantir que temos uma sociedade mais igualitária [e até] consigo pensar em 50 formas de o fazer (…) que são negociáveis”, disse Klaver num comício, esclarecendo, no entanto, aquilo de que não abdicará seguramente: “A única coisa que não vou comprometer são os meus princípios.”
Para já, os verdes encontram-se na quinta posição do Peilingwijzer, cujos dados foram atualizados pela última vez no domingo, e apontam à eleição de 15 a 17 deputados. Para além do VVD e do PVV, o GroenLinks ainda tem pela frente os cristãos democratas do CDA (12%) e os liberais progressistas do D66 (12%), e está numa posição de empate técnico com os socialistas do SP. O tira–teimas é já amanhã.