Os elementos do PNR chegaram antes da hora prevista, o dispositivo policial ainda não estava montado. As autoridades tinham combinado em reunião com o diretor da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas que os ativistas de extrema-direita ficariam do outro lado da Avenida de Berna. Nada isso aconteceu. A polícia só chegou em força quando estudantes e antigos alunos da FCSH e menos de duas dezenas de elementos do PNR estavam frente a frente e quase a pegar–se. No início da concentração, o líder do PNR, José Pinto Coelho, justificou ao i a convocação desta concentração convocada para “desparasitar a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas do marxismo cultural”, como um imperativo “para salvaguardar as faculdades portuguesas de um marxismo que impede a livre expressão de outras ideias”.
Sobre a opinião generalizada de que a extrema–direita usa muitas vezes a violência contra elementos de esquerda e negros, e de não permitir, caso fosse poder, a existência de liberdade de expressão, o líder do PNR afirmou que isso “necessita de prova”. Sobre o facto de o organizador do colóquio da Nova Portugalidade, com Jaime Nogueira Pinto, Rafael Pinto Borges, se ter demarcado, em declarações ao “Observador”, da manifestação do PNR, considerando-a um ato de oportunismo político e partidário, José Pinto Coelho não esteve com meias-palavras: “Essa pessoa é um imbecil. É certamente bipolar ou não sabe do que gosta e o que quer, ou não tem coragem de estar aqui para lutar pela liberdade de expressão. Nós, nacionalistas, não somos cobardes”, garantiu, ufano.
Enquanto os elementos do PNR simulavam desinfestar os muros da FCSH, à porta e à frente da faculdade juntavam-se algumas centenas de estudantes. Dois dos ativistas de extrema-direita envergavam um suposto traje de desinfestação. Os outros eram um grupo de gente com bandeiras, alguns de cabeça rapada, já com uma certa idade, e que pareciam ter visto melhores dias, e até um mais velho que ostentava um boné de paraquedista. Perante a mobilização de estudantes, um dos manifestantes do PNR comentou para outro: “Isto é gente sem tomates, é só pitas comunas.” Ao mesmo tempo que escurecia, os ânimos iam-se acicatando, altura em que a polícia chegou e fez uma espécie de cordão entre os dois lados. Nesse momento, o homem do PNR de serviço no megafone grita: “Escondam a droga que a polícia está a chegar.”
Começam a trocar-se as primeiras ameaças. Um dos homens que acompanhavam o líder do PNR apontou repetidamente para alguns dos estudantes, como a dizer que os estava a ver e que depois ajustaria contas. Apesar do clima, o único ferido do protesto foi um estudante que teve uma baixa de tensão e caiu no chão, ferindo-se. Do lado do PNR, gritava-se “abaixo o fascismo de esquerda”; do outro lado, os estudantes respondiam: “25 de Abril sempre, fascismo nunca mais”. Um dos indivíduos do PNR, alto, de boné e de megafone, aproximava-se do grupo de estudantes e ia-os provocando: “Agora já podem berrar contra nós, já chegou a polícia. Nós somos tão poucos e vocês não fazem nada”. Do outro lado, os estudantes respondiam ironicamente: “Somos mais que dez.”
Um dos antigos estudantes falava para as câmaras da televisão: “Quando soube desta manifestação, tirei o dia no meu emprego e vim para cá. Esta faculdade sempre foi um lugar de liberdade e não pode ser ameaçada por fascistas”. Os elementos do PNR mais próximos começaram com bocas: “É o representante do Bloco de Esquerda”, “Morte ao Bloco de Esquerda”. Os estudantes que se opunham ao PNR gritaram para os 20 elementos de extrema-direita: “O passado são vocês.”
As centenas de estudantes não arredaram pé até às 20h08, altura em que desmobilizou a concentração do PNR. Na entrada da faculdade estava o prof. Fernando Rosas, que sublinhou a importância da mobilização estudantil e das pessoas da faculdade “contra meia dúzia de energúmenos que tinham vindo apenas provocar”. Acerca da polémica sobre o cancelamento do debate da Nova Portugalidade com Jaime Nogueira Pinto, Rosas afirmou que o “diretor fez o que tinha de fazer perante a atitude dos organizadores do debate de pretenderem trazer um corpo de segurança para dentro da escola. As universidades são espaços de liberdade e não podem ser palco de exibição de milícias privadas”. Rosas, que esteve presente em conversas entre a faculdade e Jaime Nogueira Pinto durante este processo, garantiu que será sempre possível, em condições de normalidade académica, ouvir qualquer conferência de Jaime Nogueira Pinto.
No final do dia, as duas porta-vozes da associação de estudantes, que não se identificam por motivos de segurança, afirmaram-se felizes pela mobilização dos estudantes e pelo facto de centenas deles terem participado em dois debates, um sobre a discriminação racial e outro sobre a comunicação social e a liberdade de expressão. Do seu ponto de vista, a associação não proibiu um debate nem coagiu a liberdade de expressão, mas limitou-se a não se associar, depois de decisão de uma reunião geral de alunos nesse sentido, a um debate cujos termos os estudantes consideravam xenófobos e racistas. A tempestade criada, segundo as duas dirigentes associativas, “deve-se em grande parte ao mau trabalho da comunicação social, que não procurou esclarecer os factos e que publicou uma série de coisas sem sequer nos ouvir”.
A noite estava a acabar. Enquanto conversávamos no bar da FCSH, surgiu um sms que dizia que “foram vistos skins nas redondezas e um deles tinha entrado para a garagem e a polícia estava a averiguar”. Pelo sim pelo não, a dirigente associativa voltou a casa de transportes públicos. “Não quero que saibam a minha matrícula”, afirmou, relembrando que no dia em que 40 pessoas de fora da escola e alguns skins foram para a porta da associação, vários dirigentes estudantis teriam sido ameaçados.