Francisco Lopes: ‘Quando vi o carro na minha direção àquela velocidade, vi a morte’

Francisco estava no caminho de Masood. Está ferido nas mãos e pernas. Mas a salvo.

O jovem português de 26 anos colhido na quarta-feira por Khalid Masood vive há 15 anos em Londres, para onde se mudou com a sua mãe. Saiu do supermercado em que trabalha, no hospital de Saint Thomas, pelas 14h30. Também por essa hora, o atacante dirigia-se para a Ponte de Westminster, onde atropelaria Francisco e mais de uma dezena de pessoas.

Estava de costas para o carro?

Eu estava a passar a ponte, quase no fim, quando ouvi pessoas a gritar. Olhei para trás e vi um carro, a toda a velocidade, a atropelar as pessoas. E, logo no segundo a seguir, vi o carro a vir contra mim. Entrei em pânico. A única coisa que consegui pensar quando vi o carro na minha direção foi pôr as mãos à frente. O carro levou-me em cima, dei uma volta e depois caí no chão. Fui das últimas pessoas a serem atropeladas. Nas imagens aéreas existem três corpos no chão antes de o carro embater nas grades do Parlamento. Um deles sou eu. Não tinha como fugir. Estava junto à berma da ponte para melhor ver o rio, do lado esquerdo, e quando o carro veio fiquei entre esse muro e o carro, completamente encurralado. Não deu tempo sequer para pensar em nada. Não quero dramatizar, mas quando vi o carro na minha direção, àquela velocidade, vi a morte. É algo terrível. O meu coração acelerou e não sabia o que pensar e pensei que ia morrer.

Viu pessoas projetadas pelo ar?

Vi. A senhora logo antes de mim. Ela não se apercebeu de nada, estava a tirar uma selfie com um outro senhor e o carro atingiu-a de costas e ela não ficou nada bem. Era italiana e não falava nada de inglês, nem a pessoa que a acompanhava, e foi muito difícil tentarem explicar aos paramédicos onde é que tinha dores. Os médicos tentavam falar com ela, mas sem efeito. Ela só apontava para as partes do corpo que lhe doíam e foi de seguida para o hospital.

Apercebeu-se logo que se tratava de um ataque terrorista?

Não tinha ideia nenhuma. Em momento nenhum pensei que fosse um ataque terrorista – algo assim com essa magnitude. Não sabia quantas pessoas aquele homem tinha matado. Não sabia nada. A única coisa em que eu pensava era na minha família. Só pensava que não queria dar o desgosto da minha morte à minha família. Só me apercebi da real dimensão daquilo que tinha vivido na primeira pessoa quando cheguei ao hospital e, na sala de espera, olho para a televisão.

Com que ferimentos ficou?

Fiquei com um corte na coxa esquerda até ao joelho. Tenho cortes pequenos na perna direita e a mão completamente cortada.

Quem é que o assistiu?

Com a adrenalina, assim que caí no chão quis levantar-me, ver o que se tinha passado, perceber se estava tudo bem com o meu corpo. Mas logo de seguida vieram pessoas ter comigo que me disseram para não me levantar nem me mexer até as ambulâncias chegarem. O primeiro homem que veio ter comigo foi um senhor que se chama Emanuel – espanhol. Gostava muito de encontrar esse tal Emanuel para lhe agradecer tudo o que fez por mim. Como a minha namorada é da América do Sul, falo muito bem espanhol e comecei a falar em espanhol e o senhor começou a chorar, a dizer que o acabou de ver era terrível, mas que tudo ia ficar bem. Quando disse que estava a ficar com frio ele deu-me o seu casaco e abraçou-me. Esteve abraçado a mim até as ambulâncias chegarem. Tentou também estancar o sangue que corria da minha mão com uma t-shirt, mas era muito sangue. As ambulâncias demoraram cerca de 20 minutos e, quando chegaram, curaram-me as feridas, viram se eu tinha algo partido e depois levaram-me para o hospital. Assim que caí no chão e percebi que estava vivo, comecei a rezar: ‘Deus, se estás aí, não me deixes ir’.

Quem foi a primeira pessoa a quem ligou? O que é que disse?

Foi ao meu tio porque foi a única pessoa que pude contactar nesse momento.
Quando lhe liguei ele estava a trabalhar e disse-me: “Francisco agora estou numa classe” – Ele é instrutor de condução. Eu disse: “Tio, não sei se ouviste o que se passou em Westminster mas estou a ir agora para o hospital” e ele aí disse que vinha logo ao meu encontro, perguntou-me em que hospital é que eu ia e foi lá ter comigo.

Como se sente a imaginar voltar a passar naquela ponte, que tanto gosta de passear?

Acho que as primeiras vezes vão ser um pouco assustadoras… Vou estar cheio de medo, não sei como é que vou encarar aquele local… Pondero mesmo ir para o trabalho utilizando alternativas.

Como se sente neste momento?

Sinto-me dorido e com medo. No fundo, sinto-me grato por estar vivo, por conseguir andar e estar junto da minha família. Isso é o mais importante. Ontem, quando estava a sair do hospital, atravessar a rua foi difícil. Atravessar tem sido algo difícil porque vejo e ouço os carros e parece que me vão atropelar.

Que imagem não o abandona?

A imagem que tenho é o carro que veio contra mim, eu no chão, a olhar para cima e ver o Big Ben, ver as horas e aperceber-me que a minha mãe ainda estava a trabalhar e que não podia atender o telemóvel. Não sabia se ia sobreviver e o que eu mais queria naquele momento era falar com alguém da minha família.