Numa mesa situada bem no centro de uma das salas do Capitólio de Roma, onde, em 1957, os representantes d’Os Seis – França, República Federal da Alemanha, Luxemburgo, Holanda, Bélgica e Itália – haviam acordado dar luz verde aos três tratados que deram início à grande aventura europeia, repousava a Declaração de Roma, datada de 25 de março de 2017. Nela estavam contidas as quatro grandes prioridades da União Europeia para os próximos dez anos e, para as ratificar, foram chamados, um a um e entre aplausos, os 27 representantes dos governos eleitos dos Estados-membros da organização comunitária – o 28.o e desistente Reino Unido, que deverá acionar o artigo 50.o do Tratado de Lisboa e formalizar o pedido de saída na próxima quarta-feira, já não marcou presença na festa da celebração da unidade europeia.
A assinatura do documento foi apenas um dos momentos solenes programados para uma cerimónia sóbria e, aparentemente, vivida sob um clima de harmonia e comunhão, mas os atritos que a declaração havia espoletado nas semanas que antecederam o reencontro de Roma, particularmente tendo como protagonistas a Polónia, a Grécia e a Hungria, fizeram de uma simples rubrica um dos pontos altos das comemorações.
A atravessar um dos períodos mais conturbados da sua existência, desafiada pela crise económico-financeira, pelo desemprego, pelo aumento dos fluxos migratórios, pela ameaça terrorista, pelo Brexit e pelo crescimento da extrema-direita e do populismo, a União Europeia (UE) dificilmente poderia apresentar uma declaração revolucionária ou precursora de uma rutura com o passado recente. Nesse sentido, as prioridades definidas no documento são o resultado possível de uma Europa que quer mostrar união, mas evita dar um passo maior do que a perna.
A Declaração de Roma assume os desafios “sem precedentes” que se colocam perante a UE e apela à “união”, “enquanto necessidade e escolha livre”, como o único caminho para a “defesa dos interesses e valores comuns” de todos. Para tal compromete-se então a trabalhar para lograr quatro principais facetas para a Europa do futuro: mais “segura” através do reforço das suas fronteiras externas e do combate ao terrorismo e ao crime organizado; mais “próspera e sustentável” por meio da criação de crescimento e de emprego, da conclusão da União Económica e Monetária e do desenvolvimento do Mercado Único; mais “social” através da promoção da igualdade de género, da diversidade cultural e da luta contra o desemprego, a exclusão social, a pobreza e a discriminação; e, por fim, mais forte na arena internacional, com vista ao reforço da cooperação em matéria de defesa, à promoção de estabilidade na sua vizinhança e à colaboração eficaz com a NATO e a ONU.
Entre os vários testemunhos de apelo à unidade, as palavras mais marcantes da cerimónia de sábado vieram da boca do presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, que recordou a sua infância no meio dos destroços de Gdansk, uma das cidades que mais sofreram com as bombas da ii Guerra Mundial, e lembrou como era viver à sombra da Cortina de Ferro. “Nessa altura existia mesmo uma Europa a duas velocidades. E, por isso, hoje gozo do direito de poder repetir, em voz alta (…) que construir um mundo livre requer tempo, esforço e sacrifício. Já destruí-lo é muito fácil e rápido. Como aconteceu com a minha Gdansk”, contou, citado pelo Politico, perante uma Angela Merkel visivelmente emocionada.
Também no sábado, várias cidades europeias foram palco de manifestações pacíficas pró-UE, e em Londres, por exemplo, teve lugar uma grande concentração contra a saída iminente do Reino Unido do clube europeu, a nuvem negra que pairou sobre a cidade de Roma, mas a que nenhum líder ousou dar importância.